A Estrela

A Estrela – Diário de uma Sombra #1

Este conto, dividido em quatro partes, traz algumas páginas do Diário de uma Sombra, escrito por Maitê Santos. Em “A Estrela” acompanhamos o início dos relatos da jovem que estava terminando o Ensino Médio, pronta para viver sua vida acadêmica, quando de repente, em uma noite que deveria ser apenas diversão, ela se vê rodeada de criaturas paranormais.

Aparentemente, mesmo após a Ordo Realitas lutar contra o Outro Lado, parte da Membrana cedeu, e sua cidade foi o palco para o caos inicial conhecido como A Queda.

Essa é uma história não oficial sobre o universo de Ordem Paranormal.

Veja a primeira parte do conto a seguir:

A Estrela

16 de outubro de 2023

Antes d’A Queda, eu era a doce e gentil Maitê… inocente e boa. Tímida e inteligente demais. Tirava as melhores notas da classe… passava tanto tempo estudando… E para quê? Depois que o apocalipse aconteceu… Bem, isso ajuda um pouco, mas se não souber alguns rituais ou como segurar uma arma e desviar de algumas mordidas, de que adianta de fato?

Eu tive sorte de saber algo realmente útil, mas e se eu tivesse estudado outra coisa? Seguido meu real sonho? Seria útil agora? Provavelmente não…

Eu era feliz, mas só consigo dar real valor agora que a dor da saudade e da culpa me corroem…

Vivia com meus pais, antes disso tudo: minha mãe, Lilian Santos, era diarista, e meu pai, Sebastian Santos, trabalhava o dia todo como vendedor em uma loja no centro da cidade. Eles não ganhavam tão bem mesmo trabalhando direto, mas o que conseguiam era o suficiente para sobrevivermos.

Mas eu via o sofrimento e o cansaço deles… E eu, fazia o que podia para manter a casa organizada para minha mãe não precisar trabalhar em dobro, e me esforçava muito na escola.

Tinha o “sonho” de ser médica…

Isso porquê descobri que esses profissionais ganhavam bem depois que meu antigo amigo e vizinho, Leonardo, se machucou. Íamos juntos de bicicleta para a escola e ele sempre se mostrava aventureiro e corajoso, me incentivando nas brincadeiras.

Um dia, ele estava jogando bola com outros meninos enquanto eu assistia, mas um dos garotos acabou chutando a bola e ela ficou presa em uma árvore próxima. Então, para pegar o brinquedo, Leo subiu na árvore, mas um acidente aconteceu…  ele caiu e se machucou. Muito.

Depois, acabamos nos separando, pois sua mãe ficou estressada, reclamou das influências que o filho tinha na rua… disse que aquilo sairia caro… Pesquisei depois, e olha, não é que os médicos ganhavam bem?

Essa foi minha motivação: ganhar dinheiro. Apenas.

Antes disso, com uns 10/11 anos, eu havia conhecido Lucca e eu sabia que ele também tinha esse sonho de se tornar médico, mas ele era mais altruísta do que eu. Bem mais… Como sua mãe era enfermeira, ele queria seguir seus passos para ajudar os outros… algo mais bonitinho.

Eu o entendia, mas honestamente? Queria a minha família bem, financeiramente eu digo. Isso já seria mais que o suficiente para mim…

Na época, eu tinha o Lucca e a gente vivia junto, estudando anatomia, conversando sobre o céu, sobre nossos medos e fobias, nossas diferenças culturais… crescemos como irmãos e tudo era mágico. Mas chegando em casa, eu ficava sozinha. Muito sozinha…

Papai e mamãe chegavam tarde e muito cansados, trocávamos poucas palavras e eles tomavam banho para dormir. Nós raramente jantávamos juntos e eles não sabiam dos meus problemas. Deitavam enquanto eu ficava olhando as constelações e dizendo o nome das estrelas até cair de sono. Era meu jeito de “contar ovelhinhas” após terminar meus estudos e deitar na cama.

Essa solidão me assustava… Irônico. Hoje eu a busco.

Hoje todos a buscam.

Lucca não sai mais do quarto desde que chegamos à Ordem e com o tempo diminuí minha procura por ele. Todos nós ficamos mal e cada um aprendeu a lidar com nossa situação de um modo diferente. Ele não parecia confortável com algo… sua voz mudou por trás da porta.

Inevitável isso, mas sei que ele ainda me vê como confidente. Talvez a única pessoa que ele ainda confie depois que tudo aconteceu… Nós nunca mais conversamos a sós, mas de vez em quando me vejo perdida em pensamentos sobre como éramos antes…

De qualquer maneira, em uma noite eu sabia que teria chuva de meteoros e criei uma expectativa absurda. Sei que estrelas cadentes não são mágicas… Ou pelo menos, eu tinha essa certeza. Hoje não sei e talvez poderia perguntar ao sr. Veríssimo… Nah, acho que ele riria de minha ideia.

Mas o que é real ou não depois que se descobre que o paranormal existe?

Enfim… naquela noite eu me debrucei sobre a janela e pedi aos céus… para àquela linda estrela cadente, a qualquer uma delas, uma irmãzinha. Eu não me sentiria sozinha se tivesse uma irmã para me fazer companhia, acreditava nisso.

Eu já era adolescente, por volta dos 14 anos. Mas acreditei naquilo como nunca havia acreditado em superstições antes. Eu era muito cética e acreditava na ciência acima de tudo, mas A Queda me mostrou que as coisas não eram “preto e branco”, mas havia uma grande área cinza a ser explorada que naquela época eu nem poderia imaginar.

Algum tempo depois, a surpresa: eu iria ter uma irmã! Eu nunca fiquei tão feliz na vida. A superstição funcionou, afinal. Será que foi meu pedido? Não importa! Eu teria uma irmã!

Conversei com meus pais sobre o nome que ela teria e quis dar minha ideia. Eles queriam Valentina, Alice ou Ana, nomes comuns e genéricos, mas expliquei sobre meu pedido e quando disse o nome Astra em voz alta, eles ficaram em silêncio.

Disse a eles que significava “das estrelas”, e de certa forma, pra mim, ela tinha vindo delas. Ela seria minha pequena estrela. Eles riram, mas gostaram da ideia, e a partir daí, eu queria conhecê-la o quanto antes.

Como seriam seus olhos? Seus cabelos? Ela usaria óculos também?

No meu aniversário de 15 anos meus pais não tiveram condições de fazer uma festa, até me pediram desculpas, mas despreocupei eles, eu não queria uma, para ser sincera. Não é muito meu estilo. Já naquela fase não era e agora muito menos.

Mas eles se esforçaram, e sem eu pedir e sabendo um pouco dos meus gostos particulares, eles compraram uma coisinha pra mim: um anel com o planeta Júpiter. Por que Júpiter? Meu planeta preferido. Eles achavam que era apenas um hobby minha paixão por astronomia, mas a questão de Astra realmente os animou e eles acreditaram que eu merecia aquilo.

O anel era tão lindo… Sabia que minha irmã iria nascer e prometi a mim mesma que iria dar para ela quando fosse seu décimo quinto aniversário, assim como eu havia recebido.

Eu… queria ter colocado aquele anel para ir naquela festa estúpida… fiquei com medo de perdê-lo… Eu ainda o teria se tivesse ido com ele? Será que conseguirei ir à minha casa recuperá-lo? Será que conseguirei entregar ele a Astra algum dia?

Não sei nem se irei vê-la novamente…

De qualquer jeito, chegou o dia de seu nascimento: 27 de setembro de 2015. Era domingo à noite e eu estava em casa, pois não tínhamos dinheiro para eu ir junto com meus pais para o hospital e arcarmos com os gastos lá, sem saber quanto tempo tudo iria durar. Então eu fiquei em casa. Sozinha… Ansiosa…

A previsão do tempo naquele dia era de chuva, mas o que caiu foi uma tempestade. Eu nunca senti tanto medo. Estava nervosa e sem ninguém. A casa ficou sem energia e eu não sabia o que fazer. Só conseguia pensar nas coisas que poderiam dar errado no hospital, e os trovões e relâmpagos forçavam minha imaginação ao extremo.

Corri para o quarto que futuramente eu iria dividir com Astra e sentei em um canto, segurando meu ursinho de pelúcia com formato de estrela, e apenas chorei. Aquilo parecia um pesadelo.

O barulho de tudo aquilo era terrível. Parecia que o mundo cairia sobre minha cabeça a qualquer instante… Tenho certeza que foi ali que consegui astrafobia… Irônico o nome, né? No dia do nascimento de minha irmã Astra…

Enfim, seria o destino?

Quando meus pais chegaram em casa, eu estava encolhida em nosso quarto, a luz já havia voltado, mas eu apenas continuei de cabeça baixa. Meu pai lentamente se aproximou e se agachou ao meu lado, e antes que eu pudesse falar algo e reclamar, ele cochichou “Quer conhecer Astra?”. Eu parei. Lentamente olhei para ele e encarei para seus braços.

Astra era linda e será mais ainda do que eu quando crescer. Não tenho dúvidas disso. Aquele pequeno serzinho me encarou de volta e sorriu, e ali eu tive certeza que ela seria minha pequena estrela nas noites escuras.

Eu não ficava mais sozinha como antes. Chegava da escola animada e tinha ela para cuidar. Ria e brincava com ela, e ver seus olhos brilhando eram minha bateria diária. Mas eu continuava me esforçando. Agora, em dobro. Eu tinha mais do que motivos suficientes para conseguir juntar muito dinheiro. Eu iria cuidar dela… a todo momen… sempre estaria… não iria…

Essa é a primeira parte da série “Diário de uma Sombra”. Para ler a segunda parte, clique aqui.
(em breve)

Caso compre na loja da Jambô, use o nosso código mrpg10 para receber 5% de desconto! E se quiser comprar na loja da 101 Games, use o cupom MRPG10, e aproveite 10% de desconto!

Por último, mas não menos importante, se você gosta do que apresentamos no MRPG, não se esqueça de apoiar pelo PicPayPix ou também no Catarse.

Dessa forma, torne-se um Patrono do Movimento RPG e tenha benefícios exclusivos, como participar de mesas especiais em One Shots, de grupos ultrassecretos e da Vila de MRPG!

Ou então, apoie nossa revista digital, a Aetherica! Ela também traz contos e novidades para você!


A Estrela – Diário de uma Sombra #1

Texto e Revisão: Raquel Naiane.
Arte da Capa: Theo Siviero.


Encontre mais contos clicando em: Histórias.

Publicado por

Raquel Naiane

Uma barda que explora as muitas alegrias que a arte pode proporcionar.

Sair da versão mobile