Deixe a Dark Fantasy Entrar no Seu RPG!

Deixe a Dark Fantasy Entrar no Seu RPG!

Olá, condenados, sejam bem-vindos ao fim do mundo. Hoje nossa conversa será sobre as histórias nas quais a esperança escorre por entre os dedos como sangue e onde a luz no fim do túnel é difícil de discernir em meio às chamas de sua destruição. Vamos falar de fantasia sombria — ou dark fantasy —, como inseri-la nos seus RPGs e dar um exemplo de um excelente sistema deste gênero: Shadow of the Demon Lord.

O Que É a Fantasia Sombria?

A definição mais fácil de fantasia sombria é a de uma história fantástica que incorpora o terror. Os elementos de fantasia costumam ter uma distorção, ou quem sabe uma verdade, que os leva para o lado sombrio. E não são apenas monstros horríveis, mas pessoas ainda piores que transformam um cenário de magia, reinos antigos e ruínas inexploradas em um verdadeiro mundo de fantasia sombria. Porque, como diz o bruxo Geralt de Rívia, tanto espadas de prata quanto espadas de aço são para matar monstros.

The Witcher é um ótimo exemplo de um mundo de fantasia sombria: nele, não só a mitologia, mas até mesmo contos de fadas e outras referências à ficção contemporânea assumem um tom obscuro e duvidoso, em que nunca se sabe como irá terminar, mas sempre tememos pela tragédia. Outro exemplo são As Crônicas de Gelo e Fogo, Dragon Age, Dark Souls e Warhammer.

Já nos RPGs, podemos começar citando o terror gótico de Ravenloft e terminar em Mörk Borg, passando pelas adaptações de todas as obras citadas acima e chegando, afinal, em Shadow of the Demon Lord.

O Fim É Apenas o Começo

No mundo de Shadow of the Demon Lord, os clássicos da fantasia medieval — religiões e cultos, raças fantásticas, poderes mágicos, reinos antigos, impérios malignos, ameaças dracônicas, terras distantes, nações exóticas e monstros do clássico ao bizarro — têm seu lugar ao sol. Ou, melhor: à Sombra. Uma entidade chamada de Demon Lord está sempre à espreita, procurando brechas nos limites da realidade para invadir o mundo e destruir tudo. Quando — não “se”, pois é apenas questão de tempo — ele invadir, não haverá escapatória, apenas o oblívio definitivo. Por isso, enquanto forças ocultas tentam trazê-lo para esta realidade, nossos heróis, voluntários ou não, tentam impedir sua vinda.

É neste quase fim do mundo que se passam as aventuras de Shadow. Em uma sessão, as personagens podem estar fugindo do massacre de homens-fera canibais. Na outra, tentarão libertar os prisioneiros de um necromante, prestes a perderem suas almas. Ao fim de suas carreiras, estarão vagando pelo próprio Vazio, cercados de infinitos demônios enquanto sacrificam suas vidas para fechar uma brecha que traria o Demon Lord. Espadachins, ladrões, magos e sacerdotes lutando lado a lado, sim, mas também carrascos, exorcistas, tecnomantes e devoradores de pecados — opções um tanto incomuns e levemente questionáveis, todas disponíveis aos jogadores.

E não só no cenário ou nas opções de monstros e personagens é que se faz a fantasia sombria de Shadow of the Demon Lord. Existem várias regras que apontam o caminho mais escuro, como contadores de Insanidade e Corrupção, doenças e ferimentos permanentes, magias negras com efeitos terríveis, maldições e outras consequências para ações tomadas em jogo. Tudo isso que está no sistema facilita incorporar o cenário na narrativa, e também ajuda quem quiser adaptar este sistema a outras histórias de fantasia sombria.

O Maior Desafio é Escolher Entre Dois Males

Complicar a vida nas personagens com regras cruéis, monstros bizarros e descrições sangrentas não basta para a verdadeira experiência da fantasia sombria: é preciso mostrar como o Mal, este com letra maiúscula mesmo contra o qual os aventureiros passam tanto tempo lutando, está não só presente por toda parte, mas também ganhando a batalha contra o Bem.

As pessoas são corruptas, e não só por ganância: que escolha elas têm na Cidade dos Ladrões, senão serem elas próprias criminosas? As pessoas são violentas, e não apenas pela brutalidade, mas porque, se atacarem primeiro, têm mais chance de sobreviver. As pessoas são egoístas e relutantes em se juntarem ao Bem em sua luta contra o Mal. Afinal de contas, o Bem perdeu tantas vezes que a probabilidade de derrota lhes parece muito maior do que de vitória.

Então, com tantas dificuldades que estas pessoas passam, com tantas escolhas difíceis que precisaram fazer, os heróis podem realmente culpá-las por suas transgressões? Elas não são vítimas neste mundo horrível, mesmo quando ajudam a perpetuar o mal que as aflige? E se isso não bastar para convencer os jogadores de que o certo e errado são difíceis de separar, o que acontece quando eles próprios precisarem fazer esta escolha?

Pense na seguinte situação: os aventureiros passam dias desbravando uma masmorra terrivelmente mortal, que até mesmo ceifou a vida de um de seus companheiros. Mas, no fim das contas, eles alcançam a câmara mais profunda e encontram a arma ancestral capaz de derrotar a Senhora das Trevas! A alegria é imensa até perceberem que a arma não funciona, e então alguém se lembra de uma antiga lenda dizendo que a arma precisa de dezenas de almas para ser ativada. Quem os jogadores escolherão sacrificar? Irão capturar seus inimigos e lhes dar um destino pior do que a morte? E, se não houver tempo antes da batalha final contra a Senhora das Trevas, eles sacrificariam uma pobre vila camponesa para ativar a arma e salvar o restante do mundo?

É destes dilemas que a parte mais sombria da fantasia sombria vem. Alguns chamariam de horror psicológico, mas é mais simples do que isso: são escolhas dramáticas em que nenhuma das opções é boa.

E, ainda assim, os protagonistas desta história podem sim ser verdadeiros heróis.

O Contraste com as Trevas Faz Brilhar a Luz

Em um RPG onde não existem escolhas simples de se fazer, em que cada ação tem consequências e a sobrevivência nunca está garantida, parece fácil para as personagens se tornarem más. Mesmo assim, não é disso que tratam a maioria das histórias de fantasia sombria, e sim daquelas pessoas que lutam pelo bem apesar de tantas dificuldades.

Quando a batalha é realmente mortal, escolher lutá-la é mais impactante, e quando a vitória não virá de graça, aqueles que se sacrificarem serão lembrados para a eternidade. Até mesmo ladrões e assassinos dando suas vidas pelo amor egoísta por seus companheiros tornam-se legítimos heróis em um cenário como este. Quando você torna as sombras mais profundas na sua história, a luz, a esperança e os atos heróicos ficam mais significativos do que nunca, e este contraste é uma valiosa ferramenta narrativa na fantasia sombria.

As Sombras Mais Densas

Para terminar este artigo, tome como inspiração algumas das Sombras do Demon Lord, uma espécie de tema geral das histórias de Shadow of the Demon Lord, que guia as aventuras das personagens desde o nível 0 até o 10 e além. Esta Sombra indica quais inimigos, quais perigos e dificuldades surgirão como obstáculos e como as tensões irão se elevar cada vez mais até o clímax ao final da história, em uma batalha de tudo ou nada.

Quando a Sombra afeta a própria magia, os feitiços param de funcionar como deveriam e têm consequências catastróficas se os conjuradores não forem cuidadosos. Ainda pior, aqueles que ainda escolhem usá-la correm o risco de mancharem suas almas com Corrupção.

Se a Sombra recai sobre os sonhos de um deus morto, a realidade começa a se moldar de acordo com as lembranças e terríveis imaginações desta entidade, e talvez encontrá-la e despertá-la — ou destruí-la — seja a única salvação.

Por outro lado, quando a Sombra afeta o Grande Dragão, um ser de pura destruição e poderio impossível de deter, os aventureiros podem começar escapando de suas chamas, mas terminar indo de encontro a elas, com algum plano suicida para fazê-lo… dormir.

E se a Sombra afetar as mentes, espalhando uma loucura infecciosa? O que melhor para explicar o chamado à aventura das personagens do que a simples e pura insanidade que as leva a arriscarem suas vidas em uma batalha perdida? Estas e outras Sombras apresentadas em Shadow of the Demon Lord servem de inspiração para qualquer história de fantasia sombria que você queira contar, e são fáceis de adaptar para outros cenários e sistemas.


Se você gostou desta premissa e quer conhecer mais sobre Shadow of the Demon Lord e outros RPGs, não deixe de conferir meu canal no YouTube e nos vemos na próxima aventura.

… se o Demon Lord não vier antes.

Publicado por

Ideias Arcanas por Mateus Herpich

Escritor e tradutor de RPGs para a Editora RetroPunk, criador de conteúdo internet afora. Confira meus contos, artigos, vídeos e sessões de RPG!

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