Olá senhoras e senhores leitores(as) da Liga das Trevas! No último post deObscuras Travessuras, acompanhamos a complicada situação de Willian e da sua Camarilla ao iniciar a noite com o sequestro de Felipe, que de alguma forma é ligado aos lobisomens. Essa situação coloca a Torre de Marfim em cheque diante do Sabá, os sequestradores, e dos Garou, temíveis e fiéis a pactos. Nosso grupo de neófitos ficou encarregado de negociar a troca com o Sabá, vejamos o que fizeram.
Obscuras Travessuras II – Quem mandou?
Enquanto se preparavam para fazer as trocas, os neófitos receberam de Willian apenas uma recomendação: “Se do jeito que for, o objetivo é regatar o rapaz, afinal de contas, Felipe é filho de Augusto, o ancião garou que domina parte de Ilha.” Mesmo sem saber muito sobre essas lobisomens, já entendiam que frente a sua ira a fuga é a sua única chance de sobreviver. Garous possuem força sobre-humana naturalmente, e isso só se torna mais terrível quando ele se transformam em sua forma híbrida.
Felipe ainda era jovem, morava no centro com sua mãe e, pelo que parecia, ainda não tinha despertado sua ancestralidade. Porém, esse detalhe era desconhecido aos néofitos envolvidos no resgate. Os mais temerosos ou apegados a miséria de sua não-vida, temiam fazer o resgate. O motivo não era a possibilidade de precisar enfrentar membros do Sabá, mas a possibilidade de irritar um lobisomem jovem e não sobreviver.
Anthony, tomou a iniciativa e reuniu o grupo. Fez uma chamada para o número de Diego, o membro do Sabá que trataria a troca, deixando-a em viva-voz. Marcaram o encontro na entrada das Docas. Anthony percebeu uma postura um pouco evasiva e passiva no tom de voz de Diego. Estranhou o fato, pois o modus operandi do Sabá é mais agressivo e combativo. Desconfiado, advertiu o grupo e logo partiram para o encontro.
Os neófitos, Anthony, Juliano, Breno e Johann, encaminharam-se para o depósito em que eles entregariam algo que os membros do Sabá precisavam resgatar. Assim que os membros do Sabá estivessem em posse do objeto eles deveriam entrar em contato com Diego que se dirigiria para o lugar onde o rapaz seria entregue.
A noite era de muita neblina e pouco vento, de modo que a iluminação fraca das docas fazia que o ambiente ficasse nebuloso e silencioso. Assim como combinaram, Diego não veio, mas vieram quatro enviados do Sabá. O clima entre os grupos era tenso, parecia que uma troca de tiros e golpes poderia ocorrer a qualquer hora. Entre os do Sabá, parecia que Mônica era quem gozava de mais prestígio e razoabilidade entre eles.
Uma discussão em frente a porta do depósito ao qual precisavam entrar, quase iniciou uma briga. Mônica acalmou os ânimos dos seus colegas. Roger, extravasou sua raiva dando um soco numa porta metálica, na qual ficou impresso seu punho em meio ao amassado. Ameaçou esmagar a cabeça de um dos neófitos assim como ele esmagou a tranca da porta do depósito ao qual precisavam entrar, caso a troca não ocorresse bem.
Foram até o lugar indicado, pegaram o referido pacote em um cofre escondido numa parede falsa do escritório. Um caixote comprido de aproximadamente um metro de comprimento, uns 15cm de altura e 25cm largura, revestido de couro com dois feixes metálicas. Juliano, assumiu para si o pacote, e afirmou que somente entregaria mediante a troca com o rapaz sequestrado.
Era hora de renegociar. Afinal eles estavam entregando o que lhes era solicitado, mas estavam sem garantias de que receberiam o que pediram. A lógica era simples, mas o desconforto foi bastante grande. Em uma ligação para o Diego, firmaram como posto de troca para o “toma lá, dá cá” a roda gigante que estava na Beira Mar Norte. Era um lugar aberto, visível e movimentado, mas agindo da maneira certa, poderiam conseguir trocar sem grandes problemas. Antony e Juliano ficariam responsáveis por trocar com os dois capangas de Diego que estavam servindo de guarda-costas de Felipe.
Os demais membros do Sabá estavam livres, e mesmo que os ânimos incitassem uma briga e um extermínio ao inimigo, a gravidade da missão foi mais urgente. Por isso, Juliano e Anthony foram para o ponto de troca e Breno e Johann, também foram, mas escondidos para proteger a retaguarda.
Porém, antes de seguirem seus rumos, uma notícia os deixou desconfiados. Lillian e Viktor conseguiram informações de que Mons. Luke e o arcebispo não estavam em Florianópolis há quase um mês. Tinham registro de passaporte com viagem para França e conseguiram rastrear a localização deles lá. Além disso, a análise da caligrafia em contraste com outros escritos que tinham registros, mostrou sinais de diferença. A orientação que receberam do Xerife e do Príncipe a partir dessas informações foi: foquem no resgate do rapaz.
O príncipe enviou no aplicativo de comunicação próprio da Torre de Marfim desenvolvido com acesso apenas entre os membros dessa Camarilla. “No momento não importa quem mandou, o que importa é que o rapaz seja entregue aos lupinos antes de amanhecer. Quem mandou, quem enganou a nós, quem armou tudo isso fica pra depois. Sem entregar o rapaz ao pai dele, não teremos um depois.”
Continua…
Espero que estejam curtindo a trama e o desenvolvimento da Crônica. É um tanto difícil transformar partidas de jogo em crônicas, mas espero que a leitura seja satisfatória.
Talvez alguns termos específicos do sistema do Word of Darkness possa parecer confuso para quem não tem contato com esse RPG. Por isso, acompanhe todos os posts da Liga das Trevas e fique por dentro de tudo. Aprenda o sistema, a rica história do cenário, as características que estão por trás da nossa crônica e das partidas que estamos jogando.
O grupo estava determinado e iniciaram sua jornada rumo a destruição causada pelas aranhas. Havia ansiedade nas possibilidades do que encontrariam na morada dos escamosos. Se eles, em maior número, não conseguiram salvar sua fortaleza, o que cinco goblins poderiam oferecer de ameaça às criaturas gigantes aracnídeas que dizimaram os Kobolds.
Gadrak e Kine iam a frente cuidadosos, enquanto Baas levemente recuado protegia a retaguarda. Era nítido que Gbada e Ogwe estavam temerosos, mas comedidos, devido às lembranças do companheiro perdido em meio a impulsividade.
Enquanto andavam com cuidado, usando a mata como cobertura, analisaram o caminho e perceberam que a copa infinita das árvores acima deles poderia ter oferecido a cobertura necessária às aranhas. Não havia estrago ou trilhas que indicassem avanço terrestre, perceberam padrões de ataques vindos de cima, o que indicava que algumas aranhas talvez pudessem ter algum tipo de inteligência, fato que os deixava ainda mais apreensivos. O golpe certeiro vindo do alto se espalhou pela fortaleza e agora, enquanto se aproximavam, percebiam que as madeiras e troncos rompidos se projetavam de dentro para fora. Houve combate frenético ali, os escamosos lutaram com todas as forças. Enquanto avançavam, os goblins contavam o número de aranhas abatidos, percebendo que para cada kobold caído havia pelo menos cinco aranhas que tinham metade da altura deles. A força invasora deve ter sido monstruosa, pois o número que restava ali nem de perto deveria se equiparar ao horror enfrentado dias antes. Analisavam os dias que se passaram do ataque pela condição dos corpos, a presença dos vermes e o mau cheiro presente. De certa maneira, aquilo beirava o sobrenatural, mas independente do mistério que ali havia, não tinham espaço para outras preocupações além de ferramentas, armas e quaisquer objetos que pudessem ajudá-los a derrotar os invasores.
À medida que contornavam a formação rochosa, Kine fazia gestos com as mãos indicando uma pequena passagem que tinha encontrado no dia anterior que os levaria para dentro oferecendo cobertura além daquela propiciada pela noite. No caminho até tal passagem notaram o movimento de uma aranha de tamanho equivalente a quatro palmos deles, logo outras duas se juntaram à primeira. O movimento delas era rápido, mas sempre se concentrava do ponto que necessitavam adentrar. Os goblins se reuniram e Baaz disse que poderiam tentar arremessos certeiros. Gadrak concordou mas complementou que deveriam se aproximar mais, para evitar erros que pudessem chamar a atenção de mais criaturas, chamou para si a responsabilidade de acertar um delas enquanto restavam aos outros, duas tentativas para cada aranha.
Respiraram fundo e se aproximaram agachados. Quando chegaram a seis metros das ameaças, se levantaram rapidamente para o arremesso. Gadrak fixou seu olhar na cabeça da aranha e imaginou os olhares dos agressores de sua terra, um misto de raiva e fúria fizeram com que o arco de seu braço e a potência muscular fossem impulsionadas em um arremesso perfeito que fez com que a ponta afiada de madeira entrasse firmemente entre os diversos olhos, rasgando a carne aracnídea, permitindo que um fluído cinza escorresse da cabeça perfurada, findando assim a vida daquele monstro. Ao mesmo tempo os demais também acertaram seus alvos, porém espasmos ainda eram percebidos dos corpos das duas aranhas que foram atingidas. O líder se adiantou e sacou sua machadinha de pedra desferindo golpes rápidos para evitar mais barulho. Os goblins aproveitaram para recuperarem as pequenas lanças de madeira antes de seguirem pela passagem descoberta por Kine. O caminho era um corredor natural de pedra, bem pequeno e estreito, que permitia um goblin de cada vez, se deslocando vagarosamente. Ali havia teias grudentas e um cheiro incômodo de carne pútrida de um Kobold morto, em provável tentativa de fuga. Haviam ainda aranhas menores em quantidade, que se alimentavam da podridão presente. Os caçadores não tinham outra opção já que estavam ali, além é claro que aquele trajeto diminuiria consideravelmente o tempo para atingirem os pontos de interesse dentro daquela fortaleza de morte.
Avançaram com dificuldade mas não se abateram com aquele desafio, outros piores já tinham sido superados e logo se deram conta que nas fissuras daquele caminho mais uma criatura de maior tamanho se esgueirava. Dessa vez fora Ogwe o primeiro a perceber a ameaça que se dirigia ao líder. Não podia hesitar e nem gritar o aviso, foi então que sacou sua machadinha tosca e fez um arremesso desafiador no pequeno espaço disponível. Gadrak ao ouvir o leve barulho da arma girando acima de sua cabeça notou então o perigo mortal, mas já era tarde para temores, não necessitaria engajar-se em combate, pois o jovem caçador demonstrou habilidade no golpe aplicado. Um gesto de cabeça positivo foi prêmio suficiente para o goblin que logo recuperou sua arma da cabeça da aranha que surgirá.
Terminaram o apertado caminho retirando cuidadosamente tábuas quebradas que antes tinham como objetivo selar a passagem. Diante um espetáculo macabro. Entre as rochas, os escamosos tinham construído muros de madeira e casas de boa qualidade com habilidade invejável, as habitações eram ligadas a segmentos do muro de madeira, ao sul de onde estavam percebiam um buraco no chão, com diâmetro assustador, no qual os Kobolds construíram uma estrutura de cordas e rodas que deveria descê-los para uma caverna, se lembrava disso, mas ficou pensativo imaginando o que construíram e acharam lá embaixo. Independente disso, eles pareciam ter prosperado em riquezas e números e ficou triste em perceber que tudo tinha sido substituído por teias compostas por filamentos de espessura variados com aglomerados de ovos bizarros com tonalidades que beiravam um cinza claro. Em meio aquele dossel fúnebre havia corpos desmembrados e putrefatos. Alguns inchados e cheios de aranhas que se deslocavam ávidos por alguma seiva vital que pudessem usar para nutrir-se. Gadrak fez gestos apontando o caminho que fariam até a primeira estrutura que até onde via parecia fechada.
Puseram-se a andar agachados usando o que pudessem para evitar as criaturas, esquivavam-se das teias, sabendo que todas pertenciam a uma perigosa rede de defesa que alertaria sua presença. Os corações de todos dispararam e suas respirações precisavam ser contidas diante do perigo que se abatia sobre eles. Apesar do tormento, o líder orientou-os bem e chegaram até a estrutura sem serem perturbados pelas aranhas maiores. Empurraram a porta e por sorte a mesma não estava trancada, lá dentro havia um caos causado pela possível fuga de muitos escamosos, mas ainda restavam objetos úteis. Não havia teias grossas ali, apenas as comuns de aranhas pequenas. Fecharam a porta e puseram-se a procurar algo útil. Gbada parecia ter instintos apurados para procurar coisas, achou ferramentas úteis de curtição com facas afiadas de aço, algumas com lâminas pequenas e curvas, além de outros itens que poderiam enfim permitir a manufatura das armaduras desejadas. Além disso, o jovem perspicaz notou um local secreto entre tábuas da estrutura onde pequenas chapas e malhas de argolas de metal foram encontradas. Aquilo era fantástico, além das expectativas. Kine logo achou mochilões onde tudo foi acomodado, porém haveria barulho se ficassem se deslocando com aquilo. Gadrak orientou que os dois mais jovens voltassem, refazendo o caminho, levando consigo os tesouros obtidos, enquanto Baaz, Kine e ele iriam até o local onde o grande ancião ficava. Todos concordaram e o grupo se dividiu. Os três mais experientes aguardaram até notarem que os jovens de fato não teriam dificuldades para escapar levando as preciosidades obtidas. Mais calmos, ao perceberem o sucesso nesta fase da empreitada recobraram o foco no último alvo.
Ao se deslocarem perceberam que ali havia maior movimento das aranhas, mas o grosso daquela massa aracnídea mantinha movimentos constantes em torno do buraco. Notaram que a casa do ancião tinha sido levemente fortificada, talvez usada como bastião de resistência, porém havia um buraco no teto, causado por grande pressão ali aplicada, com certeza ponto de onde o ataque se espalhou para dentro. Para terem sucesso escalariam um segmento de muro descoberto de teias e depois deveriam fazer um salto perfeito para o teto, por onde desceriam. Precisariam de corda, ao passo que Baaz retornou à oficina vasculhada para encontrar o item vital. Kine citou que poderia ficar aguardando em cima, garantindo a segurança da corda para o retorno. Gadrak concordou.
Pouco tempo se passou e Baaz retornou com corda suficiente para o trabalho. Puseram-se então a escalar com as mãos nuas, aproveitando qualquer pequena brecha de apoio. Cada avanço era desesperador, pois as teias se acumulavam e se projetavam como tentáculos ávidos pelo contato incauto que asseguraria mais alimento às aranhas que ali estavam. Ao chegarem a uma altura suficiente, arquearam os corpos para tentar se projetarem com um empurrão rápido das pernas. Eram ágeis e fortes, fato que permitiu sucesso na queda no telhado. O movimento de queda foi suavizado pela habilidade que tinham em amortecer impactos similares, habilidade adquirida pela necessidade das caçadas e fugas diversas que tiveram. Aranhas pequenas se abateram sobre eles, mas nada digno de medo. As maiores permaneciam fixas no entorno do buraco ao sul, abaixo e distante deles. Olharam pela rachadura do telhado e notaram que ali dentro havia teias maiores e grossas, assim como o mau cheiro típico e sinais de combate desesperado. Kine buscou ponto para fixar a corda e se encarregou de segurá-la e puxá-los rapidamente se necessário. Baaz e Gadrak começaram a descer. O local era rico em objetos de barro, ídolos e outras riquezas em tecidos, couro e tesouros que poderiam ser interessantes em outro contexto, buscavam ali, algo para combate e logo perceberam entre corpos de Kobolds e aranhas, os restos mortais do ancião de roupas adornadas. Diziam que ele possuía poderes mágicos de cura, infelizmente nunca teriam chance de presenciar esse milagre, pois ali estava o ancião caído em um canto, com uma aranha com o dobro de seu tamanho derrubada a frente dele, próximos dos dois, restava um escamoso com duas espadas curtas de ferro em suas mãos, deveria ter tombado em luta, segurando firmemente as armas e tentando defender o ancião.
Baaz recolheu as armas e retirou do corpo o que restava da armadura de couro, pois ela continha também pequenas placas de metal e argolas. Gadrak se aproximou do corpo do possível curandeiro e viu que o mesmo tinha duas boas adagas na cintura, um cajado de metal adornado e segurava firmemente um globo de objeto cristalino transparente com um líquido prateado dentro, parecia ser muito frágil e parecia realmente um milagre que não tivesse se quebrado. O objeto era uma esfera perfeita e não havia saída para o líquido escapar, havia metade do espaço interno ocupado por aquele grosso fluido prateado.
Recolheram os objetos, puseram em uma bolsa encontrada e puxaram levemente a corda, sendo içados um a um por Kine. Pularam com habilidade de volta ao segmento de muro e começaram a descida. Ao chegarem ao chão ouviram um estrondo vindo da parte sul onde estava o buraco. Olharam com cuidado e viram que outro segmento da murada caíra, revelando indivíduos que se dirigiam ao buraco. Não eram humanos, reconheceram as peles verdes e musculosas das figuras que invadiram o local. Estrutura óssea larga, corpos pesados com pele grossa similar a couro. Eram seis Orcs, cinco deles vestindo peles e munidos de armas grandes variadas. Viram de relance o movimento, pois logo várias aranhas gigantes se abateram sobre eles. Era fantástico, os gritos de guerra e a maneira como aqueles guerreiros abriram as criaturas aracnídeas com facilidade enquanto moviam-se para o buraco. Gadrak agradeceu aos espíritos ancestrais, pois aquela distração permitiria a eles retornar. Enquanto se afastavam perceberam que nenhum dos seis tinha tombado e que a luta era ferrenha e se estenderia por muito tempo diante do número de aranhas. O único daqueles Orcs que se destacava era um grandalhão com uma espada de aço reluzente de duas mãos que lutava de peito nu usando apenas um elmo com chifres curvos. Não entendia o objetivo deles, mas eles precisavam manter o foco.
Logo o trio se encontrou com os jovens do lado de fora. Retornaram pelo caminho feito pensando no que presenciaram. O barulho de luta continuava a cortar a noite, mas os goblins precisavam voltar ao acampamento e se prepararam para o retorno e sua própria luta pela salvação da terra de seus ancestrais e aqueles do clã que dependiam deles.
A baixa ocorrida horas atrás ainda incomodava o grupo que restava, a preocupação com ira da fêmea ainda rondava a todos, a única distração em todo contexto de tensão era a dor muscular de carregar tamanho peso daquele javali de cascos brônzeos. Kine assumiu para si a responsabilidade de batedor, já que demonstrava naquele momento maior vigor que os companheiros de caça. Gadrak e Baas, mais experientes às dificuldades das jornadas tentavam forçar a marcha enquanto Gbada e Ogwe tentavam demonstrar sua resiliência ao enfrentar um terreno difícil, irregular de mata fechada enquanto nitidamente sofriam com a carga que carregavam, carga essa não só física, mas emocional. Sabiam que tinham cometido um grave erro ao desrespeitar as orientações do líder de caça. Percebiam pelos olhares rápidos de Gadrak que talvez houvesse arrependimento de tê-los trazido, algo que só ocorreu devido a falta de opções do clã, mal eles sabiam que na verdade o líder entendia que o fardo imposto aos jovens tinha sido exagerado e lamentava a perda precoce de um dos seus.
Mesmo com um clima de incerteza e pensamentos atormentados variados, os goblins chegaram a um ambiente cheio de pequenos montes cortados por raízes gigantescas e formações rochosas peculiares. Ouviam zumbidos altos nas copas frondosas que formavam um tapete verde majestoso acima de suas cabeças. A Mata Velha cativava a cada olhar, mas os sons e sentidos aguçados das pequenas criaturas alertava sobre os horrores que espreitavam naquele ambiente.
Kine que estava mais a frente percebeu pequenos sinais na mata que indicavam território do povo que procuravam. Pequenos penduricalhos feitos de corda grossa e ossos que tentavam intimidar outras raças com presságios de mau agouro e maldições. O batedor respeitava estes objetos e demonstrou respeito se ajoelhando e fazendo sinais para que em breve ele e os demais companheiros pudessem adentrar aquele local sem que ameaças sobrenaturais se abatessem sobre todos. Logo os quatro que carregavam a caça chegaram ao ponto em que a reverencia ocorria e de maneira similar, porém mais rápida, também prestaram respeito.
A marcha precisava continuar, mas a exaustão estava cada vez mais próxima. Havia agora revezamentos para que a preciosa caça pudesse ser ofertada rapidamente aos Kobolds. Gadrak tentava inspirar a todos, mas percebia que era um esforço grande demais. Faltava pouco para que as esperanças fossem renovadas, porém ao terminarem de subir a última colina antes da grande morada do povo escamoso perceberam que talvez os ancestrais os tivessem abandonado.
Abaixo deles era possível ver a grande formação de pedras irregulares que antes parecia uma poderosa fortaleza natural cravada entre as árvores milenares. Os kobolds eram criativos e a madeira vasta que ali jazia fora moldada a vontade deles, fechando as brechas entre as rochas, ampliando proteções oferecidas pela selva, porém algo que as criaturas ignoravam é que elas mesmas poderiam apenas ter se expandido a desejo daquela Mata Velha, sempre geniosa e sorrateira com aqueles que ali tentavam explora-la. Em algum momento aquela força selvagem sentiu um breve temor com os escamosos e então se sentiu compelida por presságios a acabar com a ameaça enquanto a mesma era controlável.
Diante dos incrédulos goblins havia um emaranhado de teias cobrindo o que antes era a morada de um povo aliado. A madeira partida e os corpos dilacerados podiam ser vistos aquela distância pelos olhos treinados dos caçadores e a angústia tomou conta de todos. Eles acreditavam que aqueles mais próximos dos Humanos poderiam ajuda-los de alguma maneira. A sábia Akerele nunca errara em suas visões, então como aquilo podia ser verdade.
Em meio aos questionamentos da dura realidade que se apresentava todos sentaram e ficaram por um momento distantes recuperando o fôlego e ao mesmo tempo aturdidos com as possibilidades que se esvaiam. Gadrak ficou pensando consigo mesmo que era o líder e cabia a ele qualquer decisão difícil. Se lembrou de como seu povo o respeitava por sua mente afiada e sua habilidade em inspirar, talvez tivesse sido líder a mais tempo se não fosse tão jovem. Foi então que compreendeu os sussurros da anciã de seu clã. As respostas poderiam ser encontradas ali, respostas sobre como enfrentar os invasores, todas estavam diante dele, imaculadas. A Mata Velha não retirara suas esperanças mas sim, propunha a eles um desafio, um jogo no qual suas habilidades seriam testadas e se vencessem sairiam mais experientes e preparados para erradicar os invasores. Chamou Kine e pediu que ele andasse em torno daquele local ameaçador analisando os perigos e possíveis entradas, depois chamou Baas e pediu que procurasse um refúgio possível para acamparem e recuperarem as forças. Para os dois mais jovens ordenou que começassem a limpar o animal abatido, tirando o couro com cuidado. Enquanto isso, começou a escalar uma das altas árvores que ali estava para organizar os pensamentos.
Do alto de um dos galhos, Gadrak observava a antiga morada dos kobolds, sentia uma espécie de iluminação enquanto estava ali solitário organizando as rápidas ideias que chegavam. O povo escamoso tivera contato com Humanos, aqueles lagartos tinham desejo por ferramentas e sempre se gabaram dos tesouros adquiridos com esforço. Eles poderiam ter boas armas e se o grupo que restava a ele fosse habilidoso poderiam entrar naquele emaranhado de teias e sair com objetos preciosos para enfrentarem novamente os invasores de sua terra. Tinham consigo couro e ossos do javali Brônzeo, além das placas do besouro gigante, somados e manipulados com boas ferramentas poderiam se tornar armaduras boas e leves. A mobilidade do grupo seria importante para enfrentar oponentes com tanto aço. Se entre aqueles corpos lá embaixo houvesse lâminas ou qualquer outro item que de alguma maneira providenciasse vantagem, não faltaria coragem aos seus para entregarem suas vidas pela proteção do clã. Ao mesmo tempo não sabia quantas aranhas existiam no emaranhado de teias, seria um perigo tremendo arriscar tudo naquele jogo proposto pela Mata Velha, mas não restara alternativas. Pensou no herói de seu povo e em como as provações o tornaram digno e honrado. Sabia consigo mesmo que poderia haver brechas para falhas.
Gadrak desceu da arvores e então notou que tempo havia passado, Baas já tinha retornado e estava ajudando os mais jovens na tarefa de limpar o javali e retirar o couro. Logo, ele explicou que encontrou embaixo de uns trançados de raízes uma proteção adequada para fazerem um acampamento. O líder ordenou que boa parte da carne fosse deixada ali, retirou os ossos necessários a efetivação dos planos futuros traçados a pouco e disse que a carcaça farta do animal garantiria que predadores pudessem ser apaziguados. Kine retornou e se juntou a eles na breve marcha até o ponto seguro. O local escolhido realmente permitia uma boa visão do ambiente, em um ponto mais alto onde as raízes moldaram-se em uma concha natural que provia cobertura. Se apressaram em camuflar o ambiente. Acenderam uma pequena fogueira, o máximo que o refúgio permitia, assaram a carne e começaram a conversar. O líder explicou que sua meta seria invadir o local e buscar objetos importantes com base nas lembranças que tinha, começando pela morada do coureiro e depois rumando para a tenda do ancião, precisariam ser rápidos para não terem perdas e obterem a chave para o confronto derradeiro que viria ao retornarem a seu lar. Kine complementou dizendo que talvez seria possível, haviam muitas aranhas gigantes no local mas a concentração era oposta aos locais que seriam visitados, o batedor citou que uma aranha maior que tudo que viu, rondava uma entrada de caverna que havia ao Sul do centro da aldeia escamosa, fato que levava as demais aranhas a ficarem em torno dela. Talvez teriam algum conflito, mas se fossem ágeis seriam bem sucedidos. Baas disse que poderia ajudar, lembrou que uma erva chamada urtiga de mosca talvez oferecesse leve proteção. Essa erva era usada para afastar insetos que eram comuns em locais de pesca, pensou que em demasia e cobrindo os corpos de todos pudesse causar repúdio as aranhas. Gadrak acrescentou que não eram aparentadas, os mosquitos e aranhas, mas que valia a tentativa, pediu que o mateiro tirasse o dia para procurar a erva e preparar o unguento. Aos mais jovens restou a tarefa de prepararem mais azagaias enquanto o líder e Kine revezariam a ronda.
Com mais um dia terminado, houve avanços sensíveis, o unguento estava preparado, três azagaias para cada caçador foram distribuídas e nenhum perigo novo surgira. Escolheram avançar a noite, pensando que talvez houvesse alguma vantagem, não levaram consigo peso extra além das armas, pois precisam ser rápidos. Kine desenhou no chão o caminho que fariam e Gadrak completou as informações apresentando onde estavam os dois pontos que visitariam. Com o plano traçado era chegada a hora de enfrentar o desafio, mas estranhamente os cinco ao se entreolharem percebiam que de alguma maneira vínculos fortes estavam se formando, a missão era maior que todos individualmente, se houvesse esforço mútuo haveria vitória na demanda que aceitaram.
A jornada pela Mata Velha deveria continuar, o grupo passara um tremendo susto no embate com o besouro gigante, porém sabiam que deveriam continuar a jornada para caçar o javali de casco brônzeo. Após algumas horas de viagem, a mata à volta deles já era mais espessa, com o nome dado ao local remetendo aquelas surpreendentes árvores de copa frondosa que se estendiam como uma onda verde majestosa. Tudo ali fazia com que eles se sentissem mais pequenos do que já eram. Os troncos maciços eram largos, mesmo de mãos dadas, todos juntos não conseguiriam superar a circunferência daquele alicerce vegetal com centenas de anos. A fome já não era um problema, já que o besouro abatido continha um interior repleto de massa comestível e sabor agradável para os padrões goblins, podiam assim, manter o ritmo da caminhada, sem ter pausas para refeição.
Já à tardinha, Baas percebeu sinais claros da passagem de animais, ao passo que Gadrak, analisou os rastros ao lado de Kine, ambos concluindo que tinham encontrado o que estavam procurando. Aqueles sinais demonstravam que estavam adentrando a morada de um casal sem filhotes, tendo em vista que o deslocamento das criaturas seria conjunto. Gadrak conseguiu extrair mais informações com seu olhar treinado e experiência de caça, julgando assim um tamanho e peso aproximados, que denotava um casal adulto de proporção levemente superior à média da espécie. Devido ao odor tênue, pôde ainda dizer que haviam passado por ali há pouco tempo, fato que daria a eles tempo para o preparo da armadilha. Logo, Gbada, Jajem e Ogwe começaram a cavar, usando suas mãos e as toscas machadinhas de pedra, precisam de um buracos largo de 50 cm de profundidade para colocar os pontas esculpidas de madeira, que lesariam a mobilidade de uma das criaturas permitindo que todos se abatessem sobre a caça. Os caçadores mais experientes disseram aos jovens que assim que terminassem deveriam subir nas árvores próximas e se esconder, passando em seus corpos o extrato da raiz roxa, enquanto eles próprios iriam seguir a trilha em busca do casal de cascos brônzeos. Assim fizeram.
Os três caçadores começaram sua busca pela trilha, lendo os detalhes e caminhando com cuidado prestando atenção a todos os sinais da floresta, a mata alta impedia visões a longa distância, mas confiavam em sua audição, furtividade e também na raiz roxa que poderia ser um fator decisivo contra outros predadores. Enquanto caminhavam improvisaram pequenos escudos com as placas de quitina retiradas do besouro abatido horas antes. Fizeram furos centrais nas pequenas placas por onde passaram pedaços de corda que seriam usados para segurar a barreira diante deles. Não era algo projetado para durar, mas poderia ser útil para garantir suas vidas em pelo menos uma pancada. Ainda, julgaram que o uso de fundas seria um recurso provocativo importante na estratégia que usariam, assim com as placas rígidas mais curvadas prepararam a cuia na qual as pedras poderiam ser acomodadas e atiradas, usaram cipós para fazerem as alças. Gadrak demonstrava domínio nesses ofícios. Agora; preparados; mantiveram os passos. Já à noite, perceberam que os rastros indicavam maior proximidade das criaturas, sinais de fezes frescas fizeram com que suas respirações e, enfim, seus corpos respondessem a um perigo iminente. Sentiam como se os músculos deles gritassem, ansiosos pelo embate ou pela fuga.
A escuridão nunca fora um inimigo da raça dos três, portanto continuaram sua aproximação, notando bem todos os detalhes do local que os circundava. Eis que ouviram o som de água corrente. Subiram cuidadosamente em uma árvore próxima e então viram o córrego no qual os dois fabulosos animais, se refestelavam. Puderam ver a coloração amarronzada das peles de ambos, com variadas cicatrizes, demonstrando os desafios enfrentados até chegarem a fase adulta, havia ainda pelos grossos e eriçados ao longo de suas colunas e aquelas afiadas e proeminentes presas, mortais a quaisquer seres que não respeitassem aquela fúria em forma de músculos que ali estava. Nesse momento, Gadrak fez gestos para que Kine se deslocasse para o ponto oposto de onde aguardavam e vigiavam. Deveriam aproveitar um momento em que ambos estivessem separados para um ataque conjunto que despertaria a ira, assim poderiam prosseguir com o plano. Seria uma boa distância de corrida, fato que fizera com que o trio já tivesse feito um combinado a partir das ideias de Gadrak, revezariam entre deslocar-se e separar-se, um misto de provocar e correr, contando com sua habilidade para escalar as árvores e usá-las como fonte de breve segurança. A criatura iria persegui-los e estaria cansada quando chegassem no ponto combinado, onde enfim abateriam o grande animal.
Observaram atentamente, até que todos perceberam o momento em que a fêmea, de presas levemente menores e mais curvadas, começou a se afastar atravessando o córrego. Gadrak levantou vagarosamente o braço, na qual Kine viu a funda, o sinal que aguardava.
Kine foi certeiro ao atirar a primeira pedra. A fêmea foi atingida no focinho e irritada se deslocou ao ponto originário daquela agressão, o macho iria segui-la caso não tivesse sido atingido por duas pedradas na cabeça, fato esse que desviou sua atenção. As criaturas se separam. Rapidamente os goblins aproveitaram os galhos grandes e seu leve peso para se deslocarem rapidamente por cima. Continuaram a atirar pedras certeiras à medida que o animal acumulava fúria e investia contra as árvores. Baas e Gadrak sempre paravam de se deslocar evitando perder o equilíbrio nestes golpes, aproveitavam ainda para demonstrarem suas presenças à criatura, provocando-a ainda mais. Enquanto isso, Kine seguia processo parecido, mas não apresentava sua presença, escondendo seu corpo com habilidade e seu cheiro graças ao extrato de raiz roxa. Sua intenção era distrair e ganhar tempo, pois a fêmea ficava irritada e atordoada com a situação.
A dupla de caçadores continuou seu deslocamento preciso, com saltos curtos, mantendo a criatura num implacável ritmo de perseguição. Sabiam que Kine fizera bem sua parte e torceram para ele retornar em segurança. Mantinham e repetiam cuidadosamente suas atitudes, evitando cometer erros. A criatura demonstrou leve cansaço e já não investia como antes, para um caçador inexperiente aquele poderia ser um sinal errôneo de presa fácil, fato que se concretizou. Quando estavam bem próximos do buraco perceberam que os jovens goblins, ávidos pela emoção ou apenas inconsequentes, estavam no chão, confiantes apenas no extrato usado e em sua pouca habilidade de camuflagem. Gadrak pensou naquele momento que eles talvez quisessem provar coragem e seu valor diante dos mais velhos enquanto Baas pensava que os três eram burros demais para não seguir uma orientação clara. Esses breves pensamentos rapidamente foram seguidos dos gritos de ambos caçadores, que tentavam alertar sobre o perigo enquanto mantinham a atenção do poderoso javali. Foi em vão, a criatura tinha sido duramente castigada e seu cansaço foi suplantado ao ver presas; finalmente; a seu alcance. Sua fúria foi despejada violentamente em uma carga contra os goblins que acreditaram estar ocultos àquela besta que posicionava suas presas para um golpe fulminante.
Gadrak viu o momento em que Jajem foi atingido no peito, as presas perfuraram o peito do pobre jovem com tamanha força que o líder de caça sabia que costelas e órgãos se partiriam diante daquela violência, pode rapidamente ver nos olhos do incauto caçador, o desespero diante da morte e as lágrimas que escorriam em seu rosto. Lágrimas temerosas de um jovem intempestivo após cometer erros, porém aquele erro seria o último cometido por Jajem. O goblin foi arrastado por alguns metros, enquanto todos ouviam enquanto ele se afogava em seu próprio sangue, sinal dos pulmões perfurados. Havia aquele som gorgolejante de pedido de socorro que impedia os movimentos de Gbada e Ogwe. Os dois ficaram parados, desesperados e atônitos com o que havia acontecido. O corpo do indivíduo atingido caíra, quando o javali balançou rapidamente a cabeça para se livrar do peso extra, fez uma pequena curva para iniciar nova investida. Não ouviram mais sons suplicantes de Jajem.
Baas e Gadrak sabiam que o medo levaria a vida dos outros dois. Sacaram suas azagaias, segurando-as com uma mão e com a outra prepararam os escudos improvisados. Saltaram corajosamente, gritando em direção aos jovens. Aquela ação surtiu efeito e impediu o exato momento de novo ataque do animal, que aparentemente avaliava a ameaça. Isto deu tempo para o líder de caça orientar aos berros os jovens a se afastarem. A voz firme dele fez com que Gbada e Ogwe recuperam-se momentaneamente o controle e se afastassem em direção a árvores próximas. O javali ao perceber a situação das presas iniciou seu movimento letal. Baas se posicionou e esperou até o último momento para tentar se esquivar, habilmente posicionou o escudo de maneira que as presas não o atingissem em cheio e que o golpe resvalasse a sua esquerda. Sua astúcia foi decisiva e impediu o ataque mortal, porém a força e o impacto foram tremendos que ele foi arremessado perdendo seu escudo e arma. Gadrak aproveitou então esse momento para escorregar do lado oposto ao ataque aproveitando para estocar a parte inferior da anca do javali, aquilo diminuiria sua velocidade e permitiria que eles tivessem maiores chances. O golpe foi perfeito e a azagaia penetrou fundo em uma parte em que o couro não era tão rígido, inclusive se partindo.
O animal ferido sentiu o golpe e cambaleou. Gadrak não sacou armas, soltou seu escudo e pensou no buraco, precisaria de menos peso possível e todos os membros livres para adquirir velocidade e potência para ação que imaginava. O javali hesitou, mas pôs-se a enfrentar o desafio, focando toda sua ira no líder.
A disputa começou, o goblin correndo em direção a armadilha, pensado que seria sua última esperança enquanto a fera sentia que enfim acabaria com seu agressor. Ambos, goblin e fera sentiam arder em seus corpos, fornalhas que queimavam ao máximo as energias em uma disputa férrea entre predador e presa. A Mata Velha já tinha assistido aquela disputa inúmeras vezes e logo Gadrak percebeu que não teria chances diante da robustez de seu algoz. Ouvia os cascos cada vez mais próximos e percebia que faltava pouco para que seu plano desse certo. Foi então que o líder ouviu um zunido; uma pedra atingiu o olho da grande besta. A dor, desequilibrou-a, fazendo com que o salto da presa pudesse ser dado, restando ao javali uma queda direta sob as pontas afiadas do buraco.
Baas recobrou as forças no momento certo e não deixou seu bravo parceiro sozinho, sua habilidade com a funda fora fundamental. Assim que percebeu a queda do animal, recuperou sua arma de haste e segurou firme sua azagaia com as duas mãos enquanto se dirigia para o buraco. Gadrak, ao terminar seu salto, já se virou rapidamente sacando sua machadinha de pedra. Ambos caçadores ouviam o sofrimento do javali, pois a queda desengonçada fizera um grande estrago em seu dorso, com várias perfurações. Tal fato instigou os golpes precisos da dupla de caçadores, que agora conseguia desviar dos lentos e ineficazes golpes da fera.
Kine alcançou a todos no momento do abate do animal. Demorou para afastar a fêmea e então cuidadosamente se deslocar furtivamente de volta, sabia que o fato de cortar o córrego atrapalha qualquer perseguição olfativa. Sua sensação de alegria no sucesso rapidamente foi cortada ao perceber os jovens próximos de um dos seus, caído em meio a mata.
Os três caçadores estavam cansados. Se aproximaram de Jajem enquanto Gbada e Ogwe olhavam tristes para o líder. Gadrak queria gritar, mas não havia tempo para aquilo ou mesmo para rituais fúnebres. Manteve sua mente clara e logo orientou os jovens a pegar cipós e organizarem tudo para arrastarem a caça, precisavam ser rápidos em se movimentar pois a fêmea ainda estava viva e poderia retornar. Não poderiam carregar a besta abatida e Jajem ao mesmo tempo, não poderiam desperdiçar forças mesmo para preparar uma fogueira fúnebre, não poderiam perder tempo em uma cova. Olhou para todos, não precisou dizer uma só palavra. A vida deles era dura e não podiam nem mesmo se dar ao luxo de lamentar suas perdas.
Gadrak se abaixou e pegou os adornos do clã. Quando pudesse, cantaria por ele e em suas palavras exaltava a maneira como entregou sua vida pelos membros da família que aguardavam em seu amado lar, iria ignorar a exaltação de sua tenra idade, sua memória não seria manchada pelo ímpeto, Jajem pagou com a vida e sua barganha seria usada para alimentar canções de caçadores e doutrinar aqueles que nasceriam.
A jornada precisava continuar e o grupo dos cinco se afastou rapidamente sem olhar para trás, deixando Jajem ao abraço acolhedor da Mata Velha.
Chegaram finalmente no local de descanso já tão aguardado; no monte Trinca osso; já a tardezinha. Os três caçadores mais experientes Gadrak, Baas e Kine sentiam seus músculos retesarem de maneira dolorida, cada passo dado fazia com que eles tivessem que manter a firmeza, suportando a dor da subida. Os jovens Gbada, Jajem e Ogwe percebiam que seus guias necessitavam de repouso, mas também se lembravam que havia honra e dignidade em jogo, fato que os levava a contemplarem tamanha demonstração de resistência, bem como, respeito pelos caçadores mais velhos.
Ao chegarem próximo ao cume, logo procuraram a pedra, que ao ser deslocada, revelava uma caverna digna e segura. O ponto alto da trilha, poderia ser usada por animas e por isso o uso da pedra era necessário para sempre terem um esconderijo seguro para quaisquer situações. Empurraram levemente a rocha, de maneira que apenas uma fresta fosse revelada e usada para adentrar o ambiente. Lá dentro haviam frestas variadas no teto e até pequenos raios de luz poderiam cortar a escuridão senão não fosse a chegada da noite. Gadrak então indicou aos mais jovens que descessem pelo lado oposto de onde estavam, pois lá veriam um pequeno lago natural formado por uma nascente de um morro próximo. Neste ambiente, pequenos animais poderiam se aproximar, além disso havia um fungo que crescia próximo ao lago, que permitia a obtenção de um cogumelo grande e comestível ou ainda pequenos insetos.
Quando os mais jovens saíram, a noite já caía, momento usado pelos três goblins mais experientes para acender uma pequena fogueira, já havia no local estoques de gravetos que poderiam mantê-los aquecidos. Aproveitaram para se recostarem em pedras curvadas que naquele momento ofereciam um conforto e alento aos corpos castigados. Não houve conversa, todos sabiam que a manhã seguinte seria tensa, devido a urgência da caçada e sua dificuldade. A Mata Velha oferecia perigos variados e caso não mantivessem os sentidos aguçados poderiam se tornar presas de outros animas, criaturas ou ainda gigantescos insetos que viviam naquele ambiente místico e antigo. Os javalis de casco brônzeo eram ariscos e tinham presas afiadas. Os caçadores antigos que tiveram adornos feitos com os cascos, apresentavam com orgulho tal troféu que afirmava a habilidade em caçar e a coragem em enfrentar este grande animal. Gadrak estava pensativo, pois a melhor oportunidade seria primeiro encontrar o casal de animais, torcer para que não houvesse filhotes, já que isto instigaria os instintos mais agressivos da fera, separa-los e então focar esforços no macho, enquanto a distância, os mais jovens já teriam deixado uma armadilha preparada. Em seus pensamentos tudo parecia claro, porém sua experiência indicava que nessas situações sempre havia problemas inesperados que levavam muitos caçadores a um fim prematuro. Além disso, precisavam eles estarem descansados, para o embate de resistência que travariam com um animal musculoso de instintos afiados.
Os jovens retornaram com cogumelos, água e uma quantidade razoável de grilos e insetos gordos de sabor forte. Aquilo era um verdadeiro banquete e todos agradeceram e dividiram igualmente as porções. Fecharam a pequena passagem e descansaram.
Despertaram antes do Sol nascer, se organizaram e começaram a jornada para sudeste, rumo a Mata Velha, momento no qual Gadrak começou a explicar o plano. Ao chegarem à mata, rastreariam trilhas usadas pelo grande javali, animas territoriais, momento ao qual escolheriam um ponto, para então cavarem e fazerem um fosso com pontas afiadas. O buraco não precisaria ser fundo, mas deveria comportar pontas afiadas de cerca de três palmos de sua mão, vários destes objetos seriam suficientes para minar as forças do javali, que então seria abatido por golpes firmes de azagaia. O problema principal seria chamar atenção de um destes, para que viesse na direção certa. Enquanto explicava, um dos jovens caçadores sugeriu o uso de uma isca, mas Gadrak logo o corrigiu, citando que os javalis de casco brônzeo tinham olfato e audição apuradas, situação na qual deveriam manter sua ira ativa, de maneira que suplantasse seus sentidos. Ele continuou explicando que esse era o real motivo da dificuldade desta caça, citou ainda que precisariam usar extrato de raiz roxa para amenizar seus cheiros e ter maiores chances de sucesso. Com as explicações dadas, continuaram sua jornada.
Pouco depois de duas horas, de descida em ângulo suave, perceberam a mudança gradativa do ambiente, com o surgimento de arvores esparsas e porções cada vez menores de pedra. Aproveitaram este ambiente para cortarem galhos grossos com suas toscas ferramentas. Enquanto andavam, iam afiando e preparando os objetos de madeira que seriam usados na armadilha, além disso aproveitavam também galhos grandes, muito ramificados, porém leves para fazer a cobertura que seria preenchida com folhas.
Baas era um bom mateiro e conhecedor de ervas, logo percebendo que estavam em uma área no qual poderiam encontrar a raiz roxa. Enquanto estava ocupado nisso, os demais aproveitaram para fazer mais pontas afiadas para armadilha. Minutos depois ouviram um grito desesperado. Rapidamente armaram-se com as azagaias; longas lanças esculpidas em madeira, com pontas mortais; e correram de encontro ao grito. Diante deles havia um inseto pavoroso e grande, um besouro recoberto com uma carapaça negra que reluzia com as luzes do Sol, tinha altura equivalente a dois deles e um comprimento quatro vezes maior que isso, sua presença instigava instintos de auto preservação. Baas correra e subira em uma árvore dizendo que a criatura surgirá debaixo da terra se abatendo sobre ele sem que tivesse chances. As pinças afiadas proeminentes da cabeça, se mexiam ferozmente e antes que pudessem se dar contar, passaram de caçadores à caça em questão de segundo.
Gadrak manteve sua postura firme, deixando sua azagaia firme a sua frente, preparado para apoiá-la no chão, caso o ser investisse contra ele, ordenou que os demais cercassem o gigante besouro, distraindo assim sua atenção de maneira que todos pudessem estocar rapidamente e então recuar, Assim fizeram, mas a criatura mantinha seu foco em Baas. Assim que o besouro começou a se deslocar para a arvore na qual ele tivera subido, todos arremessaram suas azagaias, nenhuma cravou firme na criatura. Suas defesas naturais pareciam ser feitas de placa intransponível. Desesperados todos sacaram novas armas e se prepararam para a luta próxima. A coragem dos mais jovens vacilou e mesmo de posse de machadinhas com lâminas de pedra lascada não conseguiram avançar. Kine e Gadrak investiram com fúria, com gritos de guerra, fazendo uma forte parábola com seus braços ao golpearem firmes a criatura. Houve efeito nestes golpes e um movimento daquele ser gigante de um lado para outro indicará que despertaram a atenção da criatura. Baas aproveitou a oportunidade e saltou da arvores com sua azagaia em uma posição vertical perfeita. O golpe perfurou fundo a carapaça acima atrás da linha da cabeça. Tal golpe fez o titânico besouro vacilar e então os jovens encorajados pela vantagem avançaram gritando e saltando sobre o corpo gigante. O Besouro se mexia de um lado para outro enquanto recebia repetidos golpes de todos. A firme armadura natural não resistiu a repetidos golpes vindo de várias direções e logo a ameaça não mais se movia e os goblins puderam dar brados pela vitória obtida.
Agora tinham comida e ânimos renovados com aquele encontro. Kine disse que as placas poderiam ser usadas e talvez úteis na caçada que estava por vir. Falou a Gadrak que poderiam fazer escudos ou talvez algum tipo de armadura. O líder disse que armaduras seriam inviáveis no momento, mas escudo improvisados seriam bons. Baas voltou a procurar a raiz e logo trouxe o suficiente.
Apesar da surpresa, talvez aquele encontro tivesse sido fortuito, talvez seus ancestrais estivessem de fato apoiando-os de algum jeito. Pensou que porções deste besouro e suas placas somadas ao poderoso javali dobrariam mais facilmente os Kobolds.
Olá senhoras e senhores leitores(as) da Liga das Trevas! Meu último post ambientava o cenário a partir do ponto de vista da Camarilla. O Cenário ainda está em construção colaborativa, mas já estamos jogando Vampiro a Máscara. Das partidas que jogamos é que surgiram as crônicas que vocês lerão por aqui. Desta vez, Obscuras Travessuras, narra as ações de um grupo de neófitos em meio a uma trama em que o Príncipe se vê encurralado, em uma Sinuca de Bico.
Essa crônica será subdividida em partes, para que tenhamos textos menores e mais “palatáveis”. Vamos a primeira parte.
Obscuras Travessuras: parte I – Sinuca de Bico
Em Julho de 2018, Willian, o príncipe, inicia sua noite com grandes problemas. Nesta noite ele teria uma reunião para alinhar o que ele chama de “erigir a Torre”, que nada mais é do que suas rotineiras reuniões para dirigir o seu Domínio em padrão de excelência. Porém, o príncipe é surpreendido por uma correspondência endereçada a ele vinda de ninguém menos do que Monsenhor Luke, o segundo em ordem de comando do Sabá na região.
Em um envelope continha um smartphone e um bilhete:
“Vocês retiraram meu acesso às docas, mas preciso de acesso ao depósito B. Envie um número de seus emissários para abrir o depósito, eu enviarei a mesma quantia dos meus para resgatar minha mercadoria. Quando meus emissários notificarem que estão em posse de minha carga, o cãozinho será levado para o lugar em que os seus e os meus combinarem. Assim podes evitar maior dano em seu trato com aqueles cães. Faça contato Diego pelo número salvo na agenda do celular, façam as tratativas da troca.
PS. Esse celular tem acesso à babá virtual que está filmando o soninho do lobinho.
PPS. Não esqueça de carregar a bateria e mantê-lo conectado internet.
Ass. Monsenhor Luke.
13/07/2018”
Ao ligar o celular e abrir o aplicativo, ele vê a cena de Felipe, o filho caçula do ancião garou, amarrado, vendado e amordaçado sob a vigília de dois capangas de Mons. Luke.
Após contemplar a cena, Willian teme por preocupação. Os membros do Sabá capturaram o rapaz dentro de seu domínio. Não havia contrato formal com os lupinos sobre isso, mas certamente significa uma falha em sua Torre. Concluiu não estar tão forte quanto julgava, mas não tinha muito tempo para ficar pensando nisso. Era a hora da reunião e os atrasos são inadmissíveis.
Foi à sala de reunião, que fica num andar privativo do Hotel Majestic, encontrou-se com os anciãos e todos os membros da Torre de Marfim, exceto as crianças da noite ainda não devidamente apresentadas. Não deixando transparecer sua instabilidade, teceu mais uma vez um discurso sobre a coesão e dado que haviam neófitos presentes, antes de seguir as tratativas, impôs a todos o ritual de Vinculi Pluris.
Para o ritual, todos colocaram uma porção de seu sangue dentro de um cálice feito de um metal avermelhado com desenhos rúnicos toscamente entalhados. À medida em que colocavam o sangue, observaram que o cálice nunca enchia. Então, do mais jovem para o mais velho, cada um sorveu um gole do sangue misturado. Ao chegar no príncipe que, sendo o último, sorveu o último gole que esvaziou o conteúdo. Assim todos estavam subordinados a um pacto de sangue que garante um certo nível de confiança e credibilidade entre os membros. Eram como irmãos de sangue, não apenas pelo gesto, mas de fato ligados pelo sangue e pela estranha magia que através dele acontece.
Após isso, encaminhou os neófitos ao treinamento que ele julga necessário para seus membros. Discutiu as políticas de domínios, a influência com mundo mortal, as relações com o Mundo das Trevas, e tudo o que estava acontecendo no domínio e nos arredores. Mostrou a preocupação em expandir em direção ao Sul da Ilha antes de direcionar as forças para o continente.
Por fim, compartilhou com os presentes aquilo que recebera na correspondência. Pediu para Pedro, o Xerife, investigar as informações o quanto antes. Pedro, por sua vez, entregou o conteúdo à Lillian e Gregor e pediu que fizessem uma varredura online sobre os envolvidos, rastreassem a fonte do vídeo, para garantir que não era uma gravação, e adquirir o máximo possível de informações.
Lara, a Senescal, dirigiu uma pergunta arguta, com ar de preocupação. “Como poderiam dirigir o sequestro a esse rapaz? Acaso sabem algo sobre nossos tratos com os garou? Parece um golpe preciso demais para ser pura sorte.” Discutiu-se o assunto de um possível espião ou traidor até que o Willian finalizou o assunto: “Melhor assumirmos uma desvantagem com o Sabá, ao menos momentaneamente, e investir nossas forças no resgate do rapaz do que ficar em desvantagem com os garou.”
Lillian e Gregor se certificaram da procedência da filmagem e era real. Rastrearam o endereço e deram as informações ao príncipe. Ele dividiu algumas funções. Ele e os anciãos se dirigiram ao Morro da Lagoa, para tratar do assunto às claras com os Garou e ganhar tempo para que os neófitos tratem do resgate. Os demais membros, todos deviam ficar disponíveis e dar todo o suporte para que os neófitos dessem cabo do resgate. Os neófitos, é claro, se perdessem suas vidas, não seriam grande prejuízo, eles seriam a linha de frente, seriam as “buchas de canhão” e a mão de obra.
Continua…
Então pessoal, espero que esse prefácio da Crônica tenha servido para despertar o interesse de vocês!
Talvez alguns termos específicos do sistema do Word of Darkness possa parecer confuso para quem não tem contato com esse RPG. Por isso, acompanhe todos os posts da Liga das Trevas e fique por dentro de tudo. Aprenda o sistema, a rica história do cenário, as características que estão por trás da nossa crônica e das partidas que estamos jogando.
Gadrak chegou a sua aldeia após uma marcha forçada que exaurirá suas forças e a de seus dois companheiros. A entrada da aldeia ficava em uma pequena cadeia de montes rochosos escarpados, uma trilha sinuosa com vigília constante de membros mais jovens de seu povo. O agora líder, via aquele caminho com potencial para uma defesa desesperada, caso tudo desse errado. Ao chegar deparou-se com o círculo formado pelos paredões de pedra nos quais os hábeis membros de seu clã haviam esculpido e trabalhado as cavernas até se tornarem ambientes agradáveis para se morar. Havia escadarias e caminhos elevados de madeira, bem como pontes pênseis amarradas com cordas que permitiam trânsito entre as moradas, que situavam-se a diferentes níveis do chão. Era nítido que o local acomodaria mais membros de seu povo, mas infelizmente seu clã já sofrera pesadas perdas ao longo dos meses. Enquanto sua mente divagava nas possibilidades em relação aos invasores, dirigiu-se ao centro da aldeia onde a grande fogueira permanecia acesa e olhou os totens esculpidos de seus ancestrais. Receberá deles uma grande dádiva, sua mente trabalhava mais rapidamente que os demais goblins, inquietava-se com ideias variadas e com questionamentos estranhos. A anciã sempre lhe dissera que havia recebido uma graça e uma maldição no dia de seu nascimento, mas Gadrak; apesar de respeitar as tradições; acreditava que ele mesmo poderia forjar seu destino e que as falas da velha e sábia goblin eram geradas de sua observação e experiências que passara em tempos distantes.
Gadrak fez os gestos cerimoniais na fogueira; algo repetido pelos seus companheiros; todos foram até a sábia goblin Akerele. Ao entrar pediu a benção dos espíritos, respeitando o ambiente e as crenças antigas e após permissão começou o relato. O ambiente no qual estava inspirava poder, havia ossos, patuás e ídolos de barro, um cheiro de incenso de ervas com aroma forte junto de uma tênue fumaça se espalhavam pelo local. Akerele vestia peças de corpo com adornos variados, pequenos objetos, pedras brilhantes e outros itens da natureza que simulavam uma armadura forjada pela vontade, pela fé inabalável de muitos anos de existência.
Suas palavras; quase que pronunciadas em um transe místico; diziam que os invasores carregavam consigo a mesma fome insaciável dos antepassados e dos membros vindouros dos povos Humanos, uma fome que nenhum alimento pode conter, uma fome que urge com a ânsia de conquista, uma fome de morte e de dominação.
Gadrak se lembrava de seu pai contando como os Humanos adoravam as pedras de cor dourada. Ele dizia que a cada temporada de caça pediam permissão a Três Cortes para retirar de sua morada, pequenas quantidades da pedra. Uma parte delas era usada para trocas feitas por antigos viajantes de seu povo. Infelizmente isto não mais ocorria, pois era comum que acordos com goblins terminassem com a morte daqueles que humildemente apenas pediam trocas justas pela pedra dourada sagrada de seu povo. Enquanto se lembrava dessas histórias imaginou que os invasores, talvez também tivessem seus sábios de mente apurada que se lembravam desse período. Talvez a fome não tivesse sido saciada pelos viajantes goblins que tiveram suas vidas e as pedras sagradas levadas e agora estavam ali, mais desejosos do que nunca, por aquilo que tanto valorizavam.
Precisava rogar na caverna Sagrada por iluminação, precisa dos sussurros do grande herói de seu povo, mas também queria entender melhor seus inimigos e pensou em outro povo, que vivia distante, mas que teve mais contato com os Humanos. O povo de pele escamosa avermelhada, tão pequenos quanto eles, de parentesco distante com os grandes lagartos antigos que voavam e a tudo devoravam. A sábia chamava-os de Kobolds. Precisaria levar uma bela oferenda antes que pudesse ser recebido e fazer suas perguntas. Não podia perder tempo, pois os invasores, mesmo não conhecendo os perigos e trilhas antigas logo chegariam a seu local sagrado e depois se encarregariam de dominar seu povo.
O agora líder pediu a velha goblin que usasse seus unguentos curativos e pediu aos seus que se armassem e pegassem recursos para a viagem. Solicitou a três jovens que se juntassem ao grupo de adultos e rapidamente os sagrou caçadores com os ritos rápidos sucedidos pelas dádivas de Akerele. Gadrak pensou que não era a situação ideal, mas já havia certo conhecimento de sobrevivência dominado por aqueles jovens e precisaria de mais mãos para enfrentar o desafio.
Partiram cerca de três horas depois que chegaram, o cansaço e dores musculares os acompanhavam, seu grupo agora contava com os sobreviventes Baas e Kine, bem como os jovens Gbada, Jajem e Ogwe. Enquanto viajavam usando as trilhas mais perigosas, porém mais rápidas, contava tudo aos membros de seu grupo de caça. Iriam rapidamente a morada Sagrada de Três cortes e depois perto do anoitecer, acampariam no passo do cume Trinca Osso, os mais jovens e revigorados forrageariam ou caçariam o que pudessem para manter a força do grupo, em seguida viajariam um dia a sudeste em busca da Mata Velha, onde poderiam caçar os grandes javalis do casco brônzeo. A caça inteira seria ofertada a tribo de Kobolds da Mata Velha em troca de informações sobre o povo dos Humanos e de talvez a chance de trocas necessárias com a pedra sagrada que também seria levada. Daí em diante, não havia detalhes, pois só estes passos já seriam desafiadores o suficiente.
Chegaram a caverna, esbaforidos, mas determinados. Gadrak olhou a sua volta e diferente do dia anterior no qual descansara ali, adentrou a caverna, na qual haviam toscas esculturas de seus antepassados, pinturas nas paredes e muitas fendas de onde a pedra dourada sagrada brotava. Ao fundo, depois de tantos metros, sem a dificuldade da escuridão, via ao fundo a perfeita estátua de Três Cortes, em uma posição selvagem de ataque. As histórias de seus antepassados diziam que este herói de seu povo se aventurou em terras distantes, lutando ao lado de vários povos guerreiros. Seu maior feito teria sido um desafio pavoroso contra um touro de pedra que assolava o Norte, havia sido o último sobrevivente do combate, mas segundo as histórias o bafo desta terrível criatura transformava a pele em pedra, ceifando assim a vida de qualquer um. Um antigo seguidor do herói presenciou a luta e após o embate trouxe consigo seu antigo mestre petrificado daquelas terras distantes, dando início assim a nosso clã em homenagem a este grande goblin. A estátua era notável, podíamos ver que seu porte e armamentos eram dignos de histórias heroicas e todos de seu clã buscavam sussurros deste notável, esperando assim seguir trilhas dignas de seu passo glorioso, agora Gadrak estava ali, buscando orientação. Ajoelhou-se, solitário e orou por forças e ajuda neste desafio difícil. Não queria que seu clã findasse. Chorou sozinho na escuridão, não ouviu palavras, não ouviu nada além dos sons da caverna e diante de si, pensou que em algum momento aquele herói tivesse sentido medo, mas a diferença entre ambos era que seu antepassado, subjugara aquele temor e seguira em frente desafiando o mundo com suas duas adagas afiadas e sua presença inabalável.
Gradrak agradeceu pela inspiração, ficou contemplando o semblante daquela grande figura de pedra e ao se levantar pensou que lutaria até suas últimas forças para proteger seu clã. Uma jornada o esperava e sua primeira vitória contra o medo já o tornava mais forte.
O guerreiro despertou com dores agudas em suas costelas e com a cabeça latejando após o embate ocorrido na noite anterior. Para ele o plano não tinha falhas. Atacar os invasores das terras milenares de seu clã era algo necessário segundo o credo de seu povo, aproveitar o manto noturno da grande mãe era propício para assegurar vantagem.
Enquanto despertava com suas dores o guerreiro ficou pensando ali; naquele ambiente pedregoso e acidentando; o que de fato havia acontecido. Olhou para os lados e percebeu que em seu grupo de ataque só restavam dois dos seis que haviam partido da pequena aldeia. Não entendia o que os invasores queriam naquelas pobres terras, pois pouco espaço havia para cultivo naquela morada selvagem repleta de pedras afiadas de tamanhos variados. Seu avô havia contado muitas histórias sobre os colossos que vagavam pelo mundo em tempos antigos, fato que o levava a comparar as trilhas com veias sinuosas, hoje usadas habilmente pelo clã para fluir pelo corpo deste que talvez; um dia; tivesse sido uma destas criaturas fantásticas daquelas histórias contadas por seu avô. Apesar de não ser o líder deste grupo, já ganhara renome em batalhas anteriores e seus parceiros olhavam com respeito aquele entre eles, com a mente mais aguçada.
O guerreiro levantou-se e foi até os feridos que jaziam ali com leves luxações da noite anterior. A mente dele reconstruía as orientações recebidas pelo líder que consistia em usar o passo de Pedrafiada para emboscar os invasores enquanto utilizavam um pequeno promontório para armar acampamento, como a noite não seria um incomodo para os adaptados olhos do grupo de caça, separados em dois segmentos, poderiam surpreender todos que tentavam conspurcar a sagrada morada. O ataque ocorreu assim que todos estavam desprevenidos e prontos para descansar da jornada. Haviam dois homens magros, altos e esguios de vestes espalhafatosas com detalhes brilhantes e adornos variados, aparentemente sem armas. Uma mulher robusta e forte, munida de escudo de madeira reforçado com abas de aço e rebites, portando uma pesada armadura de aço que cobria seu peitoral estendendo um saiote de malha pelas pernas, podia-se ver ainda que por baixo da placa havia malha de mesmo material e vestes pesadas de couro grosso. A mulher parecia excepcionalmente forte para carregar tamanho peso e por fim mais dois homens com armaduras de couro curtido reforçados com tiras de metal, sem escudo. Os três usavam espadas de bom material, bem afiadas e reluzentes.
O ataque começou com uma saraivada de azagaias. Todos os ataques focados nos mais frágeis, sem armadura. Por estarem se preparando para o descanso, a lutadora mais equipada retirava suas placas com auxílio de seus companheiros quando a batalha começou.
Três azagaias acertaram em cheio o peito de um dos esguios homens que tombou rapidamente. Mesmo sem tempo para recolocar a placa, a mulher gritou ordens aos homens que se colocaram em posição de defesa do frágil homem sem proteções corporais. Com a brecha, aproveitaram a oportunidade e investiram, sacando seus machados talhados em ossos afiados. O líder dos agressores também gritou orientações e sentiram os antepassados imbuírem seus corpos de vigor sobrenatural. Apesar do ataque tentar flanquear a posição inimiga, foram rapidamente rechaçados com uma defesa forte da mulher, que se moveu de maneira a evitar golpes em pontos vitais, deixando apenas malha e couro para as lâminas das toscas armas. Já seus dois parceiros não puderam evitar a carga e logo já estavam abalados diante de cortes profundos que sangravam. Foi então que tudo mudou abruptamente diante dos olhos de todos. O homem frágil fez leves gestos no ar com uma das mãos enquanto buscava em sua bolsa de couro pequenos penduricalhos feitos com pequenos elos prateados adornados com pedras brilhantes, entoou palavras de comando aos espíritos elementais e estes o atenderam. Repentinamente uma língua de fogo, semelhante a um chicote serpenteou de sua mão, movendo-se em direção a três dos pequenos atacantes, dentre os quais, estava o líder. As chamas lamberam seus corpos e como todo espírito do fogo, ávido e impestuoso, logo estava a consumir mais e mais os corpos de todos os acometidos por aquele poder destrutivo. Estupefatos com tamanho poder começaram a recuar e para espanto geral o primeiro homem abatido pelas azagaias começava a lentamente se levantar irradiando uma luz dourada que se espalhava por todo seu corpo, não haviam mais ferimentos e aquela iluminação forte feria os olhos dos sobreviventes.
Com o antigo líder caído em chamas, o guerreiro assumiu voz de comando e ordenou o recuo. Enquanto corriam ouviram mais uma vez a voz do portador das chamas, dessa vez clamando pelos espíritos da terra para retaliarem tal investida. Novamente o pedido fora atendido e logo os sobreviventes viam se cercados por estilhaços de tamanhos variados de pedra. Apesar da sobrevivência, todos estavam muitos feridos e então decidiram recuar para o local mais sagrado que conheciam, dentro das rochas do Sagrado Três Cortes.
O guerreiro voltava a si enquanto trazia esses pensamentos dolorosos, tristes por ver que os elementos favoreciam os invasores de seu lar, enquanto meditava sobre o que fizera de errado para merecer tamanho castigo. Toda essa torrente foi amenizada enquanto começava a caminhar para o pequeno riacho em busca do musgo brilhante que poderia amenizar as dores dele e dos seus.
Ao chegar até o riacho viu seu reflexo e contemplando sua pele verde, nariz pontiagudo e longas orelhas típicas do povo goblin, respirou fundo diante das tatuagens em seu rosto que representavam honra e coragem para seu povo de pequena estatura. Olhou seus brincos saqueados em lutas gloriosas e pensou consigo mesmo que podia ser muito mais.
Chegava a hora de proteger sua família com sua mente afiada e tomar as rédeas da situação. Os invasores altos de pela clara iriam se arrepender quando Gadrak, de fato se tornasse aquilo que seus antepassados viram nas fogueiras no dia de seu nascimento.
Gadrak respirou fundo, ele era o guerreiro e agora líder dos sobreviventes. Pensou consigo que não poderiam fazer nada em apenas três e que deveriam estar mais bem preparados para abater rapidamente os dominadores de elementos. Imaginou que cinco jovens não iniciados na vida adulta, poderiam ser um número importante; apesar da inexperiência; para sanar a lacuna deixadas pelos mortos. Dessa maneira deveria se apressar pelas trilhas secretas, chegar a sua aldeia e buscar forças. Só então partiria para o coração do local sagrado onde estava para buscar orientações de seu antepassado Três Cortes. Não deveria ir agora, pois precisava da purificação da anciã de seu povo. Havia urgência em tudo e logo pôs se a marchar chamando seus dois parceiros de luta.
Muito dependia dele, crianças, mulheres e anciões. Todo seu pequeno clã goblin, agora iria depositar suas esperanças em seus ombros e ele sabia que não iria e nem poderia desapontá-los…
Florianópolis, em sua versão WoD, é um espelho geográfico e histórico da mesma cidade no mundo real, com pequenos ajustes que podem favorecer a narrativa. Sabe-se que nas crônicas da White Wolf, o cenário Latino Americano, e, portanto, o Brasil, é uma grande área de influência do Sabá, o que não significa que não existam outras seitas e grupos vampíricos carregando sua sede de sangue por aí.
Para esse cenário, decidi, junto com os jogadores, criar um ambiente em que todos os integrantes da mesa possam jogar e narrar. Uma tentativa de narrativa compartilhada, em que todos podem usar do cenário base e NPC’s que criei para produzir uma crônica e desenvolvê-la na mesa.
O contexto histórico mundial no momento da trama em que estamos jogando
Os movimentos da Gehenna estão pulsando, mas os de sangue fraco não foram envolvidos. Os vampiros de sangue mais forte voltaram para suas origens, e no Brasil ficaram os vampiros de sangue mais fraco. Na sociedade vampírica, os Independentes e o Sabá conquistaram quase todo o espaço nacional. O crescente do Movimento Anarquista assusta os vampiros mais presos às suas estruturas de poder. Todos esses movimentos da sociedade dos não-vivos têm repercussões diretas nas políticas da humanidade, sejam elas conservadoras ou revolucionárias.
Há em Florianópolis uma organização da Camarilla mostrando resultados ao se organizar. Será um novo levante da ordem? Será que os presságios da Gehenna foram interpretados de maneira precipitada? Porque a Torre está se levantando novamente?
Florianópolis
Sem grandes diferenças históricas e geográficas, mas com toda ambientação de que um cenário cyberpunk, gótico e distópico pode oferecer. A presença das criaturas noturnas, com sua sede de sangue e tramas políticas por poder e ganância acabam criando para as pessoas normais um ambiente que as torna também mais taciturnas, mesquinhas e egoístas. Os mortais não entendem o que acontece por detrás das cortinas, mas sabem que algo está se movimentando, fazendo crescer sombras, medos, horrores e até loucura. Todos fingem viver uma vida normal, mas os mais espertos e mais despertos pressentem os eventos que podem mudar tudo, e, provavelmente, a mudança vai ser pra pior.
Camarilla
Após o êxodo dos membros mais antigos para a Europa e Oriente Médio, onde parecem estar se concentrando os movimentos da Gehenna, o pobre Joker, um Malkavian inteligentíssimo, vadio, descolado e que, outrora, fora membro da terrível Camarilla de Sombrio City (um cenário bastante caótico que joguei há anos atrás)percebeu sua amada mestra agindo de maneira estranha, falando línguas estranhas, reagindo a alucinações, e, enfim, decidindo se juntar a grande guerra. Sem muitas explicações, Milena apenas disse: “Não se preocupe, Jo, eu vou voltar! Fique na minha casa, cuide dela, mantenha-a em ordem! Quando eu voltar, quero tudo no lugar!” Entregou-lhe um cartão com o endereço de um apartamento no hotel Majestic na Beira-Mar Norte de Florianópolis, e se foi.
Deste dia em diante, Joker, voltou a usar seu nome, Willian, assumiu a postura de um homem sério, rígido, perfeccionista, exigente e estratégico em política, finanças, militarismo e crimes. Passou as noites dos últimos dez anos transitando pelas noites das cidades, fazendo contatos, procurando membros com interesses em comum, até que conseguiu reunir um grupo de membros que julgou serem capazes de fazer de Florianópolis um reino para a sua amada mestra e majestade poder voltar e desfrutar. Se ela queria apenas a casa, ou queria algo maior, isso é algo que somente Joker, Adriano (um amigo misterioso) e ela podem saber.
Atualmente
Willian é o Príncipe da Camarilla de Florianópolis. Exerce seu domínio de maneira complicada, pois de alguma maneira ele consegue manter todos os anciãos subordinados a si, mesmo que o clima entre eles não seja sempre amistoso. Ele exige que os membros sejam treinados para batalha, espionagem e investigação e inclusive subsidia isso. Não quer que a sua Camarilla seja um clubinho de sanguessugas que se escondem juntos, mas quer que sejam um grupo de elite, com pouquíssimos e excelentes membros capazes de constituir o poderio de uma Torre. Sua palavra é a lei, quem não a segue sofre as duras consequências.
(P.S. Essa breve história sobre Joker, Adriano e Milena não é de conhecimento dos personagens dos Jogadores, mas é importante para quem quiser narrar. Eu fiz também um breve background para os demais personagens importantes da Camarilla, mas com menos profundidade que esse. Os outros, pretendo desenvolver posteriormente, bem como também pretendo apresentar algumas das personalidades terríveis que tínhamos na mesa de Sombrio City).
O ponto de vista da Camarilla sobre: Sabá
Como é de se esperar, muitos membros, muitos rituais, muitas orgias, muita bestialidade e liberdade para a besta. Mas isso não significa desordem e caos completo. Enquanto suas crias cainitas seguem se reproduzindo, os bispos, arcebispos e cardeais se organizam para aprofundar seus conhecimentos sobre as Trevas e sobre a Besta interior, para serem capazes de ser, cada vez mais, aquilo que realmente são: vampiros. É preciso viver essa natureza. O arcebispo Sirius perdeu muito de seu domínio nos últimos anos, mas pretende reconquistar com a ajuda de um Cardeal, recém chegado à ciadade. Em pouco tempo (para vampiros imortais), os ânimos podem ficar exaltados. Uma guerra é iminente, os mortais sentem a pressão e tensão da rivalidade entre as duas seitas, e mesmo sem entender, temem pelo que pode acontecer.
O ponto de vista da Camarilla sobre: Lupinos
Sabe-se que eles dominam os morros e matas da Ilha da Magia. A natureza exuberante lhes anima o espírito, ao passo que a urbanização e os turistas os causam cada vez mais incômodos. Seja como for, eles não se preocupam tanto com os movimentos da sociedade, seja dos vivos ou dos mortos, mas se dedicam a serem guardiões de Gaia e evitar o crescimento da Wyrm. Ainda não sabem o que é, mas um “ninho de Wyrm” apareceu no Mangue do Itacorubi. Esse fenômeno atraiu membros do Sabá, então os garou fizeram um acordo com a Camarilla. Ela deve manter os Sabá afastados do mangue, e os membros da Camarilla podem transitar nos domínios dos garou, desde que se comportem como se fossem humanos normais. Caso se alimentem de alguém ligado aos lobisomens, o ancião da tribo tem liberdade para execução sumária do membro incauto que o fizer.
O ponto de vista da Camarilla sobre: Magis
Certamente há presença de magos, mas quem os conhece? Quem sabe onde estão? O que fazem? Quais seus interesses?
O ponto de vista da Camarilla sobre: Fadas
Por mais estranho que pareça, a Camarilla foi vítima da traquinagem de uma fada há pouco tempo. Ela se mostrou e se apresentou como uma fada, mas parece complicado de acreditar, até porque ela tinha uma presença escura e fria, embora fosse uma mocinha do tamanho de uma criança, com asas de borboleta azul escuro e vestida nos estilo Sininho. O absurdo parece confundir e negar uma possível verdade.
O ponto de vista da Camarilla sobre: Caçadores
Até agora a Camarilla não foi vítima de caçadores, mas ocasionalmente algum membro do Sabá tem desaparecido. Alguns bandos dizem ter visto uma “freira que faz os vampiros virarem pó”, mas isso não tem nenhuma evidência até o momento. Exceto o fato de que os vampiros, que seriam capazes de entrar em Igrejas normalmente, não têm conseguido fazê-lo e tem evitado os símbolos cristãos com frequência e temor maior do que o normal.
Isso é Mundo das Trevas, incertezas e tramas complicadas e misteriosas a serem desenvolvidas. Sua própria não-vida a ser vivida e preservada é o que importa.
Bem vindos à Florianópolis Noturna!
Sobreviva! Se tiver forças pra isso.
Para mais informações sobre Mundo das Trevas clique aqui!
Uma explosão em um prédio que se descobre ser uma instalação governamental secreta, um vírus é liberado acidentalmente, se espalha pelo ar e contamina a maior parte das pessoas.
As pontes são fechadas, impedindo que os cidadãos saiam da ilha e são orientadas a ficar em isolamento em suas casas até segunda ordem, algo está muito errado.
No quarto, os três ouvem um estouro de madeira se partindo com um forte impacto.
Com o susto, Lindemberg se agarra no braço do irmão mais velho.
– Caramba, caramba, que que tá acontecendo?!
Ana, tendo um surto de adrenalina sai correndo para fora do quarto, buscando a razão de todo o alvoroço, correndo com os punhos cerrados, achando estar pronta para o que estiver acontecendo.
Assustado, Lindemberg tem ainda mais convicção que Ana realmente é maluca. Enquanto isso, Anira procura algo que possa usar para se defender.
O cético e algo incompreensível
Ao arrombar a porta com um chute, Paulo nota que a pessoa que estava do outro lado da porta foi arremessada para dentro do quarto.
Ao ver a pessoa, ele nota que é uma mulher e ela está totalmente ensanguentada, sua camisola goteja sangue.
Vendo a pessoa no chão, Paulo abre toda a porta e questiona preocupado.
– Moça, o que que aconteceu? – Ao dar o primeiro passo para dentro do quarto, Paulo vê que o chão está encharcado de sangue.
Em auxílio, ele se abaixa e tenta sentir a pulsação da mulher, mas não há nenhuma para ser sentida, porém ela está se mexendo, tentando se levantar novamente e tentando agarrar a mão de Paulo.
Porém ao tentar se levantar, ela escorrega e somente consegue acertar um tapa no braço de Paulo, que se ergue, apreensivo, vendo a hostilidade da moça e, agora apontando sua arma para ela, se afasta até o corredor.
Nesse momento, Ana, que havia saído do quarto 414, vê Paulo recuando de dentro de um apartamento, apontando a arma para algo que está lá dentro. Ainda em seu ápice de adrenalina, Ana corre em direção a Paulo.
Quando os mortos não ficam mortos
Dentro do quarto Anira e Lindemberg estão amedrontados, sem saber o que fazer.
Lindemberg vai para trás do irmão, que se direciona para a porta e diz.
– Não vai não cara, não vai. Tranca essa porta!
– Fica aqui e fica quieto, eu vou ver o que tá acontecendo.
Nesse meio tempo, a mulher ensanguentada consegue se levantar e avança em direção a Paulo.
– Senhora, último aviso, deita no chão!
À esquerda, Paulo ouve passos correndo em sua direção, se aproximando rápido. Voltando ao foco na moça que sedentamente avança em sua direção, ele atira, abrindo um rombo no peito dela, onde fica o local do coração.
Com um tiro à queima roupa, a moça é projetada para trás, caindo novamente no chão banhado de sangue dentro do apartamento.
O tiro foi tão letal que quase todo o coração da moça foi arrancado de seu peito, o estilhaçando para trás.
Neste momento, Ana chega ao lado de Paulo César, que aponta a arma para ela, mas vendo de quem se tratava, volta sua atenção à moça que se encontra estática no chão.
– Moça! Chama a polícia agora, chama reforço! Diz que é o Paulo César!
Nesse momento, vendo com um resquício de visão periférica, Paulo nota que a moça que ele acertou fatalmente está se mexendo, tentando se levantar.
Pavor
No quarto, no momento que Anira decide olhar pela porta, ouve o estouro seco do revólver, Lindemberg entra em pânico, gritando pelo nome do seu irmão, pedindo auxílio e procurando outra forma de sair do quarto, cogitando até a hipótese de pular do quarto andar.
Vendo o pânico de seu irmão, Anira lhe dá um tapa no rosto, para que ele recobre a consciência.
– Calma! – Ela diz ao seu irmão.
– Mas foi um tiro irmão!
– Eu sei que foi um tiro! Calma!
Nesse momento, Anira sai do quarto para ver o que está acontecendo no corredor. Dentro do quarto, Lindemberg tenta se acalmar, sentindo o calor do seu rosto, produzido pelo tapa.
Acontecimentos extremos pedem medidas extremas
Ana ignora o que Paulo pede e procura um extintor de incêndio, algo que possa usar para acertar a pessoa que teima em se levantar.
Ela encontra um próximo ao elevador, e quando chega perto dele, nota que o piso dentro está cheio de sangue, algo muito macabro aconteceu ali.
Paulo decide entrar no quarto novamente. Atônito, sem entender mais nada, ele só encara a mulher no chão, com um rombo no peito, perto do ombro esquerdo, que ainda tenta se levantar a todo custo.
Olhando com mais atenção, Paulo nota que o ombro dela não está mais respondendo a vontade do corpo, trazendo muita dificuldade para que a moça tente se levantar.
Pela primeira vez Paulo nota que os olhos dela estão completamente brancos e a boca, tentando morder algo, que ela não encontra.
Ele apoia seu pé no ombro que não foi danificado, impedindo que ela se levante e questiona.
– Moça, que droga é essa que a senhora está usando?!
Nesse meio tempo Ana agarra o extintor e se dirige para dentro do quarto. Entrando no local, ela vê Paulo imobilizando a moça e grita.
– ATIRA NA CABEÇA!
Vendo a situação, Anira, que estava no corredor, entra novamente no quarto e tranca a porta.
– Berg, essas pessoas são loucas! Fica quieto aqui!
Revelações? Ou drogas?
A moça imobilizada no chão tenta inutilmente mexer o outro braço, como se não entendesse o que está acontecendo, tentando morder Paulo a todo o custo, em uma fome doentia e insaciável.
– Moça do cabelo estranho, você não me ouviu ainda?! – Paulo olha para Ana e tenta novamente fazer com que ela o escute. – Essa moça aqui, ela está drogada, então chama uma ambulância e a polícia, bota os outros dois no quarto e larga essa porra de extintor que não té pegando fogo em lugar nenhum! E como assim atira na cabeça?
– Ela é um zumbi!
Rindo da situação, Paulo não tem condições de acreditar na constatação de Ana, seu ceticismo não o permite.
Nessa discussão, vendo que nenhum de seus argumentos seriam levados a sério, Ana tenta colocar Paulo para o lado a fim de acertar a mulher, que já deveria estar morta, na cabeça com o extintor.
Paulo tenta a impedir, se colocando na frente dela, porém a situação não está fácil para ele e Ana lhe dá um encontrão com o extintor, que o desestabiliza, saindo da frente, porém libertando a moça que estava se debatendo no chão.
Se aproveitando dessa situação, ela agarra a perna de Paulo, tentando freneticamente mordê-lo, mas em um golpe de agilidade, ele consegue se desvencilhar, se jogando para trás e se aproveitando dessa oportunidade, atira na cabeça da moça que o atacou.
Com um tiro à queima roupa, o zunido ensurdecer em seus ouvidos causa dor, toda a massa craniana se espalha sobre suas roupas, mais em Paulo, que estava ainda mais próximo, suas roupas sempre bem cuidadas agora estão encharcadas de sangue e miolos.
Vendo a cena, Ana entra em colapso, por maior que tenha sido seu impulso em acertar o extintor na cabeça da mulher, ela não estava pronta para isso e a cena de tiro a leva diretamente para o dia em que seu namorado foi morto, em um tiroteio.
– Menina, não sei o que aconteceu, mas não tá certo. – Paulo tenta dar direcionamento a situação. – Chama o André, chama o Lindemberg e vamos sair daqui.
Sem escutar o que Paulo lhe diz, em choque, ela senta no chão, chorando e soluçando, sem conseguir ter qualquer reação.
A verdade também está lá fora…
No quarto, com o segundo tiro, Lindemberg apavorado só acha que alguém está invadindo e matando todo mundo.
Tentando conter o pânico do irmão, Anira lhe dá mais um tapa, tentando chamá-lo novamente para a realidade.
– Quem estava armado era o seu segurança, ele que deve ter dado os tiros.
– Ou atiraram nele, se deram dois tiros, um foi nele e o outro na Ana.
– Calma, ou ele deu dois tiros em alguma coisa. Calma, vai dar tudo certo.
– A gente precisa procurar algo pra se defender e se esconder, ao menos a gente vive um pouco mais.
Dizendo isso, Lindemberg sai em busca de algo que possa ser usado como arma e de alguma outra rota de fuga.
Quando ele esta na janela, nota que está chovendo e que há algo realmente estranho acontecendo na rua.
Várias pessoas correndo, gritando, fugindo, umas das outras. Algumas pessoas frenéticas correndo atrás de outras e quando elas as alcançam, se lançam sobre elas, poças de sangue se formam, parece que umas estão devorando as outras.
– André! André! André! Vem cá cara! É o apocalipse zumbi cara!
– Eita porra! – Desolado com aquela visão horrenda.
Tentando localizar uma forma de sair do local pela sacada, Lindemberg inclina a cabeça para olhar para baixo. Nesse exato momento, um corpo cai do andar de cima! Se caiu, se jogou ou foi jogado, não há como saber.
A verdade os alcançará
No corredor, vendo que Ana estava em choque, Paulo decide investigar um pouco mais o local onde se encontra o cadáver.
Ele fecha a porta do quarto e tenta não encostar em nada relacionado ao ocorrido e depois disso, se dirige ao frigobar para procurar algo para beber.
Entrando mais no quarto, Paulo nota que ao lado da cama há um pequeno cadáver, um bebe.
Essa criança está parcialmente devorada, tendo grandes semelhanças faciais com a moça que Paulo recém deu dois tiros, indicando um parentesco.
Há roupas de outras pessoas no quarto, mas não tem mais ninguém além do bebê, da mulher morta e de Paulo.
Num ato piedoso, Paulo cobre o corpo da criança com um lençol branco. E vai até o frigobar e pega duas bebidas, que virou direto na boca, em uma sede por sanidade que só poderia ser concedida por estas bebidas.
Neste momento, olhando mais uma vez para o cadáver da criança que ele acabou de cobrir com o pano, ela começa a se mexer. Sem ter mais condições de ver algo assim, Paulo sai do quarto e tranca a porta atrás de si.
Ao sair, ele encontra Ana ainda em choque, agachada contra a parede, chorando.
– Ahmm moça, eu entendo que a situação seja grave, mas a gente não pode ficar aqui parado, temos que ver como estão os dois ali no quarto e depois irmos para uma delegacia, um lugar seguro, porque parece que ninguém ouviu os tiros, ninguém veio ver o que aconteceu. É possível que esse hotel já esteja vazio.
Prestando um auxílio, Paulo tenta levantar Ana do chão e direcioná-la para o quarto.
O ouvido deles ainda está prejudicado pelo barulho do tiro a queima roupa, mas à medida que ele vai melhorando, ambos começam a ouvir passos, vários passos, vindo da direção da escada.
Aumentando seu esforço, Paulo levanta Ana e ambos vão à porta do quarto 414.
Ana logo que chega a porta, tenta abri-la, porém, ela está trancada.
– Ei, vocês dois! Abram a porta!
– O que vocês fizeram aí fora? – Questiona Anira, preocupada – Nós ouvimos tiros!
– Nós fomos atacados, a gente precisa sair daqui rápido, os quatro!
– Onde que tá o Paulo?
– Lindemberg, André – Responde Paulo, que estava ao lado de Ana – Saiam do quarto, precisamos sair daqui agora.
O barulho dos passos está cada vez mais alto, agora nitidamente misturado a gritos e gemidos de agonia.
– Abre a porta! Abre a porta agora! – Exige Paulo, sentindo um arrepio que percorre toda a região de sua coluna. – Abre isso logo e vamos sair daqui!
Atendendo a exigência, Lindemberg abre a porta e é puxado para fora por Paulo que ordena – Vão pro elevador, agora!
Anira vem logo após, assustada, tentando separar Lindemberg das mãos de Paulo, e este ordena novamente.
– Corre pro elevador pessoal! Corre que tá complicada a situação!
– Ana pega a mão de Lindemberg e começa a puxá-lo em direção ao elevador, ambos irmãos estão assustados com todo o sangue na roupa dos outros dois, que nitidamente não pertence a eles.
Sem tempo para explicações, todos correm em direção ao elevador, que fica ao lado da escada de incêndio, de onde vem os passos, que estão cada vez mais próximos, parecendo cada vez mais até dentro de suas cabeças.
Apertando o botão para que as portas do elevador se abram, a porta da escada também se abre e alguém sai de lá, a primeira pessoa de dezenas que se aglomeram nos corredores.
Todos entram no elevador e por impulso apertam o térreo, local onde deixaram os carros e onde imaginam ser mais viável a saída.
Quando a porta se fecha, o elevador começa a descer.
– É verdade que é um ataque zumbi? – Questiona Lindemberg, aflito com a situação.
– Ataque zumbi o que?! – Tentando se apegar a sua experiência, Paulo nega com toda sua convicção. – Todos vocês reiniciem os celulares, a rede deve estar com problemas, liguem para os pais de vocês que eu deixo vocês em casa.
Ana tenta explicar a situação que aconteceu no quarto, toda a estranheza da situação, uma mulher levando um tiro certamente letal no peito e continuar se mexendo, até levar um tiro na cabeça, mas isso é algo que só conceitos de filmes poderiam explicar, como zumbis.
Antes que ela pudesse continuar, o elevador dá um solavanco, ficando preso entre o térreo e o primeiro andar.
– A gente vai morrer! A gente vai morrer! – É a única coisa que passa pela cabeça de Lindemberg.
E mais um dos tapas calmantes de Anira faz com que Lindemberg recobre a lucidez.
– Presta atenção, eu vi um monte de gente correndo na rua e outras atrás comendo elas, parecia mesmo como um ataque zumbi, um monte deles! E a gente tá indo lá pra porta do hotel!
– Olha só, agora falando sério, eu não sei o que vocês tão na cabeça… – Paulo ainda incrédulo.
– Você nunca viu filmes não Paulo?
– Eu não sei o que está acontecendo, não sei se isso é um apocalipse zumbi, mas precisamos sair daqui!
Paulo ainda tenta justificar, dizendo que são drogas, alguma guerra entre gangues ou algo do tipo, mas nada é tão razoável quanto a explicação de um apocalipse zumbi.
– Paulo, vamos pensar que são drogas mesmo, você sabe como abrir essa porta do elevador?
– Aperta o botão de emergência Ana, isso vai chamar alguém.
Uma luz dentro do elevador começa a piscar, mas nenhum sinal de auxílio pode ser notado, nenhuma voz aconchegante indicando que há esperança do lado de fora das portas.
Olhando ao redor, Anira decide olhar para cima e vê um alçapão no teto, enquanto Paulo tenta abrir a porta do elevador na força bruta.
Anira pede ajuda para subir e recebe apoio de Paulo, ela consegue levantar o alçapão e subir na parte superior do elevador.
Cabos e uma imensidão escura se direcionam acima deles, na frente metade da porta do primeiro andar se faz visível.
Ela explica a situação para as pessoas ainda dentro do elevador e todos decidem por tentar abrir a porta de dentro do elevador e pular para o térreo.
Procurando por algo que possa ser usado para servir como alavanca, Anira encontra uma chave de fenda, esquecida entre os cabos sobressalentes soltos sobre o teto do elevador.
– Eu achei uma chave de fenda! Vou descer!
Com calma, para não quebrar a chave de fenda, com tempo, finalmente conseguem abrir as portas e ver a recepção.
Paulo decide descer primeiro, para ajudar os outros depois, se esticando o máximo possível para ver a situação na recepção.
Vários vidros quebrados, mesas e poltronas viradas, muito sangue em todos os lados, nas paredes, no piso e corpos, pessoas mortas para todos os cantos.
Com pouco cuidado, Paulo desce do elevador, fazendo barulho quando seus pesados pés tocam o chão da recepção após o pulo.
Nesse momento, Ana já se prepara para descer do elevador quando nota que alguns cadáveres agora estão sentados, olhos brancos, desorientados.
Quando ela desce, causa outro estouro no chão, o som de seu corpo se projetando no amplo cômodo da recepção.
A próxima a descer é Anira. Quando ela se projeta para descer, os corpos sentados estão procurando algo, confusos, parecem atordoados, como se recém despertos de um longo e conturbado sono.
Vendo isso, ela decide tomar cuidado para não emitir mais sons e acordar ainda mais os recém despertos.
Porém, nesse momento, Ana nota que as pessoas começam a levantar, desorientados ainda, procurando o que os acordou.
Anira ajuda seu irmão a descer enquanto Ana mostra a cena para Paulo.
– Eles podem nos ver? – Ele questiona – Tem outra saída?
– Talvez, vamos ter que sair pela porta dos fundos, sei lá..
– De qualquer forma vamos ter que passar pelo saguão…
Lindemberg pensa em sair e tentar abrir um caminho, quando a mão de Paulo o agarra pelo colarinho.
– Onde que tu vai guri? Tá maluco?
Quando Paulo termina de falar, todos os corpos param de se mover aleatoriamente e começam a fazer um barulho, um som gutural baixo, que parece estar na mesma frequência, parece estarem se comunicando.
E todos olham na direção dos quatro.
Continua…
Se você gostou do conteúdo deste texto não se esqueça de deixar um comentário, isso é muito importante para sabermos que vocês estão curtindo nosso conteúdo. E para acompanhar a série completa e também ter mais informações sobre Floripa em Chamas é só clicar aqui!
Baseado na campanha Floripa em Chamas mestrada por: Douglas Quadros Texto de: Diemis Kist Revisão de: Milles Araujo e Douglas Quadros Arte dos Personagens: Iury Kroff