Qual Matéria é Essa? – Prólogo em Enots #04

Prólogo em Enots é uma serie em 4 contos que contará a história da Criação e Decadência do plano Enots. Em Qual Matéria é Essa? o Sr. Lunenn explica para os 4 jovens estudantes como se deu a Criação de Enots, desde o primórdio. Mas ele mesmo reconhece que se deve ter cautela na busca pelo conhecimento!

Qual Matéria é Essa?

O pequeno gnomo, de cabelos e barbas grisalhas que se estendiam até seus pés, cobertos por um chapéu pontudo marrom, roupas largas, botas grandes e inúmeros livros embaixo do braço adentrou a sala, particularmente pequena e fria. O Sr. Lunenn havia sido encarregado de ficar com os alunos na detenção após a aula. No total, quatro adolescentes: dois humanos, uma elfa e um meio-elfo, que falavam muito, jogavam bolinhas de papel uns nos outros e comiam algumas frutas no fundo da sala. 

O velho respirou fundo, sabendo que havia sido notado pelo grupo e estava sendo ignorado. Eles estavam ali por um motivo particularmente curioso: haviam entrado sem permissão na ala proibida da biblioteca, onde os livros mais antigos e raros ficavam guardados, e aparentemente, estavam buscando sobre os Titãs e os Dragões. 

A falta não era grave, e o professor sabia que o desejo por conhecimento daquelas quatro crianças era admirável, mas nem toda busca por sabedoria deve ser feita sem acompanhamento, e elas não ficariam quietas, nem obedeceriam ao que ele poderia pedir naquele momento. Colocou os livros sobre a mesa e pensou, enquanto as observava, e quando finalmente percebeu o que poderia fazê-las ficarem satisfeitas e com desejo por mais aventuras, sorriu.

Lentamente caminhou ao quadro que estava limpo e escreveu em letras garrafais: A CRIAÇÃO. Logicamente, isso não foi o suficiente para fazer com que parassem de brincar, mas ele percebeu que Alan, o humano mais jovem, cochichou algo para Briana, a elfa um pouco mais velha. Ainda de costas, enquanto largava o giz, começou a falar com sua voz rouca:

“A história real talvez nunca tenha sido contada, mas com muita pesquisa e busca incessante de fragmentos perdidos em línguas não tão lembradas, foi possível ter uma noção de como as coisas aconteceram e como a Criação se deu através do tédio e do poder anormal de seres as quais não compreendemos.”

Virou-se para perceber que eles haviam se calado e o olhavam com curiosidade, ansiando pela continuação de suas palavras. Seu sorriso se alargou mais enquanto se dirigiu para sua cadeira, puxou-a e a colocou na frente de sua mesa, próxima às carteiras dos alunos que estavam vazias, sendo supervisionado pelo olhar atento dos jovens.

“Mas é claro que sempre existem aqueles que contam que viram tais seres, e acabaram enlouquecendo, ou ganhando propósitos de vida totalmente diferentes e coisas similares, mas isso não é o importante, a questão aqui é a história da Criação.”

Valmor e Torny, o humano mais velho e o meio-elfo da mesma idade de Alan, sentados em cima das mesas, lentamente saíram e se posicionaram atentamente nas cadeiras, enquanto o Sr. Lunenn limpou sua garganta.

“Era uma vez… há muito tempo, quatro criaturas gigantes com formas inimagináveis, que receberam o nome de Titãs Primordiais, as quais sempre foram descritas de maneira diferente por cada cultura, de acordo com a conexão elemental que possuíam, contendo os elementos principais: Terra, Fogo, Ar e Água.

Ninguém sabe dizer como vieram parar no Plano Material, se sempre existiram aqui, se estiveram adormecidos em tempos remotos ou se um acidente causou a aparição deles, mas em determinado momento, os quatro criaram Enots. Um planeta, que conteria a perfeita harmonia dos elementos que detinham.”

O professor parou de falar, enquanto viu Alan se aproximando, escolhendo uma cadeira, e parando mais próximo dele, o observando com ar de expectativa. 

“Com nosso planeta formado, os Titãs perceberam que precisariam de criaturas para habitá-lo, porém não entraram em um consenso de como seriam feitas, e por isso, decidiram criar quatro continentes principais e cada um seria responsável pelo povoamento do seu próprio. E em sua ganância, egoísmo e inveja, cada um criou uma criatura parecida com a do outro, com pouca diferença entre elas: os quatro Dragões Primordiais.”

Briana, se levantou e se aproximou, perguntando:

“E como eles eram? Os Dragões?”

Sentindo-se aliviado por estar conquistando a atenção deles, o Sr. Lunenn respondeu com grande ênfase:

“As gravuras, estátuas e pinturas que temos em vários livros, quadros e estruturas mostram o que imaginamos que sejam suas formas. Os draconatos também possuem uma grande conexão com os Espíritos, que podem ser vistos em sua aparência, mas vocês sabem como eles se tornaram menos numerosos depois da Grande Guerra, e como preferem ficar distantes agora.”

A elfa sorriu e acenou com a cabeça, enquanto o professor prosseguia:

“Os pergaminhos descrevem coisas confusas e distantes após esse feito. Alguns dizem que os Titãs despenderam muito poder para criar os Dragões e por isso adormeceram, outros dizem que o desgaste ocorreu por estarem fora de seu Plano Original, e obviamente, tem aqueles que simplesmente não acreditam em nada disso. 

Mas a questão é que os Dragões ficaram sozinhos e, com o tempo, acabaram conversando e se conhecendo, trocando experiências e conhecimento sobre si mesmos e suas habilidades, e no final, começaram a teorizar sobre o que aconteceria com eles depois dali. Haviam sido criados com algum motivo? Os Titãs voltariam?”

Ele parou por alguns momentos, enquanto os outros jovens se aproximavam, e voltando a atenção para eles, deu de ombros e continuou:

“Até hoje essa pergunta perdura. Muitos dizem que eles apenas gostam de assistir ao caos que acontece em Enots, e como ocorre o desenvolvimento da Criação sem suas interferências. Há quem diga que eles só acharam o caminho de volta para casa, ou que se entediaram com as criaturas que os Dragões formaram. 

No caso, inicialmente, criaram pequenos Dragões Elementais, do seu próprio elemento e de novos, conforme se juntavam uns aos outros, desenvolvendo um sistema equilibrado de grupos com poderes diferenciados, e cada vez menores, dragões com novos elementos foram aparecendo, sendo necessária criar ilhas e continentes menores. 

Séculos perduraram nessa brincadeira alquímica, onde envelheciam lentamente. Mas o tédio também os alcançou, e sentiram-se presos à sua própria criação.”

“Eu nunca ficaria entediado com muito poder.” – falou sorrindo e arfando o peito o humano mais novo. 

“É claro que ficaria” – prontamente respondeu Torny – “em algum momento você não teria mais o que fazer, eu acho.”

“Vocês dois devem ficar quietos, quero ouvir a história” – repreendeu Valmor, o mais velho dentre eles. 

O Sr. Lunenn apenas assistiu à cena, esperando que se acalmassem, e quando percebeu que a atenção deles estava voltada para si, continuou:

“Os quatro Dragões Primordiais conversaram com os pequenos dragões, e decidiram por fim, realizarem a Entrega ao planeta. A entrega de seus corpos, mentes e espíritos em sua totalidade, pois assim, outras criaturas iriam nascer, outras raças seriam formadas, e Enots teria a diversidade que nascera para ter, sem ficarem presos a uma forma. 

Alguns dos pequenos dragões preferiram manter sua forma, alguns transformaram-se em espíritos que passaram a serem guias e gurus das raças que surgiram, e os grandes Quatro aprovaram as diferentes iniciativas que tiveram. 

Com isso, entregando-se ao planeta, harmonizaram-se dentro dele, estando em equilíbrio com a Criação. Porém, o Dragão Vermelho decidiu fazer diferente, e se entregou ao Sistema e aos Planos, sendo guiado para formar o que nós chamamos de Sol, onde antes só havia a Lua”

“Por que ele fez diferente?” – Briana novamente se arriscava a perguntar.

“Existem muitas teorias, mas a pergunta que poderíamos fazer é: como ele sabia que precisaríamos que ele fizesse diferente, para conseguirmos sobreviver nos dias de hoje?” – retrucou o professor. 

A elfa apenas assentiu, claramente pensativa.

“Não sabemos exatamente como as coisas surgiram, pois ninguém estava lá. Inclusive sobre nossa Lua existem inúmeras histórias, vejam bem, os mais antigos dizem que ela seria o olhar dos Titãs sobre Enots, e a única ligação que eles ainda possuem conosco, e a mudança das estações seria apenas uma forma deles mostrarem que o ‘Titã Observador’ agora era outro. Mas não temos meios de comprovar isso. Ainda não.O gnomo completou, enfatizando a última frase, o que fez a jovem sorrir enquanto o Sr. Lunenn continuava:

“A partir desse ponto e durante os próximos milhões de anos foram criadas e estabelecidas os climas, habitats, localizações, passagens de tempo e estações de ano, física e espirituais sobre o planeta. As raças foram sendo criadas tendo dentro de si a força de um elemento, como se todos tivessem sido escolhidos por um dos Primordiais. 

Em um acordo não falado, os Dragões criaram os draconatos para manter viva a forma dracônica que haviam recebido dos Titãs. Aumentando o número de colorações e elementos que os tais poderiam receber. No entanto, com o tempo, aqueles com os poderes de Ar, Terra e Água, sumiram. Ninguém sabe o real motivo: se fugiram, se esconderam, ou se os Primordiais só não conseguem mais usar suas forças para fazê-los nascer, e preferiam se dedicar a Enots totalmente.” Ele respirou fundo, tomando o ar, ergueu suas mãos e bateu nas coxas.

“A civilização foi criada! Reinos, vilarejos, cidades, grupos, guerras, festividades, brigas territoriais, e muitos outros eventos começaram a acontecer, e os Dragões e os Titãs não ficaram mais com tédio, dizem as boas línguas.” – Ele sorri, piscando para os adolescentes – “As más línguas afirmam que quando isso acontecer, Enots irá explodir ou os Titãs vão voltar com força total para pegar de volta a mana que colocaram no planeta.” Ele dá de ombros enquanto observa o rosto assustado dos jovens, e antes que pudessem perguntar algo, disse:

“Mas também, outra coisa aconteceu: com a Entrega e o desaparecimento físico dos Dragões, outros dois elementos foram criados, pois existia a necessidade dos elementos se unirem e se separarem de alguma forma, de maneira a permitir que os elementos não fiquem sozinhos: o Éter e a Morte. Mas essa é história para outro dia.”

O professor se levantou enquanto soava o sinal do fim da aula. Os quatro moços se entreolharam e com algumas repetições fervorosas começaram a pedir que o gnomo continuasse as histórias e lhes contasse sobre as coisas que aconteceram. Eles tinham muitas perguntas não respondidas. O Sr. Lunenn lhes estendeu as mãos para os acalmar, e explicou:

“Buscar conhecimento é bom, mas o perigo espreita em cada lugar e informações sempre foram importantes e preciosas, por isso, são mantidas em alas proibidas ou sob segredos amaldiçoados. Poderemos continuar algum outro dia essas explicações.”

Os dois mais velhos se conformaram com a resposta, chamando os mais novos para irem embora, com a promessa de que continuariam outra hora, e o professor seguiu seu caminho. 

O velho gnomo seguiu pelos corredores da escola, agora mais silenciosa, ouvindo seus passos ecoarem pelo piso gelado. Adentrou a sala dos professores assobiando e manteve a postura, mesmo percebendo que havia algo errado assim que sentiu um leve arrepio em sua nuca. Se dirigiu à mesa onde havia café lhe esperando e enquanto o colocava em seu copo e observava a fumaça subir, perguntou para o ambiente, com a voz calma e séria:

“O que você quer? Sei que está aí, espreitando… Se não quiser se revelar, ótimo! Logo encontrarão meu corpo aqui, se for o caso, e provavelmente irão te caçar.”

Virou para a sala, agora percebendo estar mais escura que o habitual, então, em meio às sombras, percebeu uma forma humanóide se mexendo, enquanto sob o leve brilho azul de uma das luminárias mágicas, viu a máscara de caveira que só conhecia pelas histórias. Olhos fundos e negros circundando olhos drow com alguns detalhes em dourado (o gnomo tinha certeza de serem pretos nas histórias) contornando os dentes. Era um Eskeleton, servo de Argen.

“Você não tem mais a quem servir, elfo.” – o gnomo tomou coragem para falar.

A figura aproximou-se lentamente, mostrando seu tamanho três vezes maior que o do professor, enquanto ele terminava de beber seu café e deixava o copo sobre a mesa, encarando a figura que estava encapuzada sob um manto negro. A máscara não permitia ver suas feições, mas o Sr. Lunenn sabia que sorria.

“Você está certo, professor” – uma voz grave ecoou – “informações são perigosas!” e o mundo ficou escuro para o velho gnomo.


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Qual Matéria é Essa? – Prólogo em Enots #04

Revisão e Montagem da Capa: Isabe Comarella

 

 

Minhas Últimas Palavras – Prólogo em Enots #03

Prólogo em Enots é uma serie em 4 contos que contará a história da Criação e Decadência do plano Enots. Em Minhas Últimas Palavras o mago Dood nós revela um segredo. O segredo que trás muito peso para todo a história de Enots!

Minhas Últimas Palavras  

“Espero que ao encontrarem esse caderno possam entender minhas motivações, meus medos e angústias, e acima de tudo, possam me perdoar pelo mal que causei. Não foi minha intenção. Na verdade, eu só queria que o mal acabasse. Mas entendi tudo errado. 

Era inocente demais para perceber o que estava buscando. 

E, antes que me esqueça, me chamo Dood, e eu era um mago.

Para começar, irei relatar o óbvio. Sempre fui um estudioso, e acredito plenamente na Criação e nos relatos esparsos que temos sobre como ocorreu. Sempre acreditei no poder dos Dragões Primordiais e na existência dos Titãs Primordiais. Mas esse não é o ponto. A questão é que comecei a buscar entender mais sobre as raças e sobre o que estava acontecendo em Enots. 

Em nosso planeta e com o passar dos anos houve o esquecimento quase total dos ensinamentos passados, onde as tradições antigas e a comunhão com a força elemental que existe em cada um foi perdida, nos tornando alheios à nossa existência, aos nossos sentimentos e às nossas origens, onde nosso elemento principal não tinha mais poder. E eu acredito plenamente que com isso, os Dragões perderam um pouco da mana que detinham no início, e por isso, hoje não são quase citados ou vistos.

Com a perda dessa identidade, as raças já não davam importância àquilo que realmente precisavam. Deixavam de visitar os Templos Dracônicos que haviam surgido quando os Dragões partiram, e agora, não passam de lendas folclóricas. Os Templos Elementais também foram perdidos, tendo sido construídos por raças que hoje se escondem ou foram extintas, e deixados na memória de livros que ninguém mais abre. Templos que contém muito poder e mana. Que extrapolam os limites do que podemos fazer, e que concedem sem pedir nada em troca.

E quando finalmente, os seres se lembraram da mana elemental que possuímos, começaram a guerrear entre si, querendo que seu elemento se tornasse supremo. Tornando corrupto algo que era puro. 

As guerras começaram dessa forma. Com o propósito de aumentar um elemento específico e sua força, mesmo que nós precisemos do equilíbrio que existe para mantê-los em harmonia. 

Tentei encontrar os motivos que levaram grandes reinos, impérios e povos a começarem com essa neurose tão repentinamente. Alguns disseram que ouviram vozes à noite, alegando serem dos Titãs, e que eles exigiam poder. Também ouvi relatos de governantes que encontraram livros perdidos ou esbarraram com algum Templo Elemental, e ao lerem ou verem algo, tiveram a certeza de ser necessário ter um elemento principal. 

Todas as histórias pareceram contadas pela metade, faltando partes importantes para compor o quebra-cabeça, sendo recheadas de fofocas. Mas a questão é: os maiorais começaram com isso. E rapidamente o sentimento se espalhou. Intrigas menores surgiram, quase sempre com a justificativa de fazerem parte dos interesses elementais. Mas logo percebi que eram apenas desculpas para o massacre.

Pequenas vilas e vilarejos tiveram famílias brigando entre si, terras começaram a ser proclamadas, onde antes, podíamos andar em liberdade. 

Mãe contra filho. Irmão contra irmão. 

E inocentes pagavam o preço.

Isso me cansou.

Comecei a pesquisar, tinha que ter algo. Algo que fez toda essa confusão explodir. Tinha que ter… 

Minha filha não podia ter morrido em vão.

Até que percebi que a mana que eles tanto defendiam estava estranha, não era como a descrita nos livros e a conexão com o planeta. Era totalmente diferente, e eu sentia isso também. Eles não estavam defendendo a energia original, era algo assustadoramente desconexo.

Nesse período, além da destruição, as raças que descendiam diretamente dos Dragões, como os draconatos, passaram a serem perseguidos e mortos. Muitos acreditavam que o fato deles estarem vivos era fator predominante para que houvesse guerras baseadas nos elementos. Por sua vez, os que conseguiam sobreviver, passaram a viver em ermos distantes, perdendo um pouco de sua cultura e civilidade. A maioria fundou clãs bárbaros, onde novas leis e regras funcionavam e guiavam o povo a continuarem vivos. 

Outras criaturas, não tão numerosas, mas diretamente ligadas a algum poder elemental, também foram perseguidas e extintas. Povos que naturalmente emitiam um dos quatro elementos, mesmo que nem tivessem tomado partido na guerra, perderam tudo, forçando os poucos sobreviventes a se esconderem e se isolarem. 

A terra foi assolada pela destruição. 

E depois de muito tempo eu entendi. 

Entendi por qual motivo sentia tanta diferença na mana que eles usavam durante as batalhas. A que antes era quase totalmente usada para o bem agora não era mais, e acredito, que para tentar se preservarem um pouco dessa confusão, os próprios Dragões tenham dividido ela em duas: Luz e Escuridão. As quais chamei de Lumnya e Temnyam, respectivamente.

Durante as batalhas que consegui observar, era clara a diferença. Os soldados que usavam dos elementos baseados em Lumnya eram puros, porém, em menor número, e logo foram derrotados pelos que usavam de Temnyam sem se importarem com as consequências. Eles também começaram a apresentar um potencial muito maior. Como se a escuridão pudesse ser mais forte que a luz. Mais sedutora… 

Passei a estudar enfaticamente, e além desses elementos, percebi que existiam outros dois que eram deixados de lado, mesmo que fossem mais fortes. Mesmo que pudessem ser a resposta. 

E talvez fossem. E eu poderia usá-los. 

O Éter e a Morte. 

O primeiro é do Plano Etéreo dos espíritos Dracônicos e dos seres, assim como da consciência universal, estando presente em tudo e em todos, e não sendo visível de forma normal. Algumas culturas já falavam da existência de um Plano do Éter, onde os espíritos ficam após a Morte, sendo protegidos de dores e do mal. Mas claro que nem todas as culturas são esperançosas assim. 

Alguns só falavam que os espíritos ficariam vagando, podendo atravessar para nosso Plano e se comunicar conosco. Também tinham aqueles que sempre relataram terem visto “fantasmas” e coisas “paranormais”, apontando esse Plano como culpado pelo seu medo. Mas cá entre nós, é meio difícil acreditar nesses termos quando temos magia que permite a invisibilidade ou mudanças em nossa forma. 

E para completar, ainda tinham os céticos, que pensam que esse Plano não passa de um lugar vazio. Mas eu atribuo esse conceito a um outro lugar, que meu amigo Sr. D. estudava. Não sei o que aconteceu com ele, mas ele chamava esse ‘vazio’ de “Plano do Eco”. E você terá de encontrá-lo se quiser saber sobre isso, pois fui proibido de falar mais do que qualquer um possa ter conhecimento sem ter estado aqui. 

De qualquer forma, o segundo elemento é a Morte, sendo ele o estágio final de todas as coisas. Acredito que os Dragões o criaram para que, com a possibilidade de um fim iminente, as criaturas pudessem viver intensamente e melhores, diferente deles, que viviam no tédio e tiveram que partir para se livrar de um peso que não lhe foi oferecido, mas apenas atribuído.

Porém, eu logo descobri, que a Morte estava diretamente relacionada à Temnyam, e a alimentava. Por isso estava cada dia mais forte. Por isso os exércitos que usavam essa parte da mana conseguiam derrotar seus inimigos facilmente. Por isso os embates estavam cada vez mais cansativos. Todos estavam usando da Morte para vencer. 

Tentei encontrar no Éter algo que pudesse nos tirar de tudo que estávamos passando, mas eu estava fraco. Velho. Assustado. Comecei a ser ameaçado, conforme foram descobrindo o que estava estudando. 

E eu tentei. De todas as formas. Eu tentei.

Sabia que poderia existir um Templo do Éter. 

Mas nunca o encontrei, por mais que o procurasse. 

Até que um dia eu me rendi. 

Diante de todas as ideias que circundavam minha mente, eu pensei que poderia usar a Morte para impedir que as coisas continuassem da forma que estavam. 

E esse foi meu erro.

Eu estava tão cansado, mas a ideia me pareceu tentadora. Eu realmente pensei que pudesse funcionar. A ideia era simples. E se a Morte fosse espalhada de uma vez por todas? Se todos não tivessem mais elementos, e eles fossem retornados aos Dragões no centro do planeta? Todos ficariam iguais, com o mesmo elemento, sem superioridades. Então todos poderiam viver em paz, certo?

Interpretei errado alguns manuscritos antigos.

Isso poderia funcionar!

Claro que hoje eu sei que fiz besteira. Os Espíritos me mostraram depois. Mas na época, eu queria que funcionasse. 

E o meu desejo era egoísta. 

Eu queria minha filha de volta.

Controlando a Morte, eu poderia trazê-la, né?

Poderia tê-la comigo novamente… 

Passei a procurar por esse elemento. Estudando-o de todas as formas e perspectivas. Tentando encontrar o Templo que ele teria, pois lá eu poderia ter as respostas que buscava. Mas em minha ânsia, acabei encontrando um outro Plano, que logo viria a conhecer como Plano da Corrupção. 

Ali eu consegui ter maior controle sobre Temnyam. Sobre magias, dogmas e ritos profanos e malignos, pois era a fonte de toda a escuridão necessária para ter o poder que eu precisava para concluir meu plano, que teve, dentre tantas, uma falha que custou a minha vida.

Uma Larva da Escuridão com uma voz sedutora, me sussurrava tudo que eu buscava. Parecia ler meus pensamentos e conhecer meus sentimentos, sabendo meus pontos fracos e o que poderia usar para me atrair. 

Minha filha… 

Ela disse que poderia me ajudar a trazê-la de volta.

Lentamente, acabei cedendo aos seus caprichos.

Tudo depois disso é turvo e, ironicamente, uma grande escuridão. E apenas aqui, no Plano do Eco, me foi elucidado tudo que ocorreu a seguir.

Sem que eu soubesse, me tornei a porta de entrada para que a Larva me transformasse em algo que ficaria conhecido como Lich, me dando uma nova aparência, e um novo nome: Argen. E tudo que fiz a seguir foi pior do que tudo que já tinha vindo. 

Criei exércitos que ficaram conhecidos como Eskeletons. Eram elfos malignos, que ganharam até novas colorações ao me obedecer. Eles me serviam. Serviam à Larva. E ela servia ao Titã Devorador. 

Não sei se ele é uma espécie de ‘irmão’ ou um inimigo natural dos Titãs Primordiais, só sei que ele havia sido banido e expulso para outro Plano ou realidade. E naquela época, esse Titã, que ficou conhecido dessa forma por sempre fazer isso: destruir a mana existente em um lugar, pois é isso que o sustenta, estava vindo para nosso Plano.

Ao ceder meu corpo à Larva, ela me fez passar por um ritual arcano na qual aprisionou minha alma a uma filactéria. Um tipo de pedra circular lisa e oca por dentro, com símbolos arcanos e magia negra inscritos com prata, sendo forjada pelas minhas mãos enquanto possuído. Essa pedra se tornou seu vínculo comigo e com o poder que o Titã Devorador me concedia enquanto Lich. 

E aqui, leitor, é que você entra.

Argen, meu outro eu, construiu o Templo da Morte sobre o oceano, e deixou essa filactéria bem guardada ali. E quando foi vencido pelos Heróis, meu corpo foi desintegrado, e ela se manteve ali. Protegida pela Larva. Esperando que alguém vá até lá, para ser iludido como eu. Pois o Titã ainda quer vir para cá. 

Mas espero que sendo avisado, você não caia nas promessas que ela lhe fizer, encontre essa pedra, e destrua-a. 

Para isso, será necessário encontrar alguma arma que eu tenha usado, o que é complicado, pois minhas armas sempre foram meus livros. Mas você pode visitar o Sr. D. deixei com ele um martelo de mão. Espero que seja o suficiente, pois foi a única coisa da qual consegui me lembrar. 

Agora você sabe de tudo.

Sabe que minha intenção não era ruim no fim.

Os Espíritos me deram a chance de contar o que houve, mesmo que eu não saiba se algum dia alguém irá ler, pois estou no Plano do Eco, e daqui, não sei o que poderá seguir. 

O Sr. D. adoraria estar aqui…

Assim que terminar de escrever estas palavras, minha jornada estará completa e o destino de minha alma, incerto.

Desejo boa sorte, bravo herói. Irá precisar”


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Minhas Últimas Palavras – Prólogo em Enots #03

Revisão e Montagem da Capa: Isabel Comarella

Assim Nasce um Vilão – Prólogo em Enots #02

Prólogo em Enots é uma serie em 4 contos que contará a história da Criação e Decadência do plano Enots. Em Assim Nasce um Vilão, vamos acompanhar a jornada do meio-elfo Morkrani, sedento por poder ele vai atrás de seu objetivo.

Assim Nasce um Vilão 

Após a Grande Guerra existiu um meio-elfo, chamado Morkrani, que se tornou famoso por um único motivo: expedições. 

Masmorras antigas, construções abandonadas, e principalmente templos eram desvendadas pelo jovem que escalava montanhas e encontrava reinos perdidos em busca desses locais enigmáticos, e o que todos buscavam entender era o motivo para tal ambição. 

Muitos diziam que ele ansiava por itens mágicos, mas essa teoria logo era descartada, pois a maior parte daquilo que conseguia deixava em museus, em posse do governo ou de guildas. Alguns diziam que eram pelas histórias que os bardos contariam sobre seus feitos e de como atrairia belas damas, mas ele sempre se afastava das festividades e jamais fora visto nos braços de alguém.

O que os teorizadores não sabiam é que esse meio-elfo conhecia as propriedades mágicas primordiais que esses lugares forneciam, sendo mais antigas que a própria Criação, não somente vindouras de itens ou do divino, mas também de tempos remotos as quais os livros não mais discorriam, e a qual ele conhecia através de manuscritos encontrados no quarto do pai que desapareceu, e por isso, ele buscava pela promessa do que havia lido: ser preenchido completamente pelo poder primordial.

Sua fama era transmitida através dos reinos. Nobres e poderosos tentavam persuadi-lo de inúmeras formas a contar seus motivos e aspirações, porém ele sempre contornava a situação. Até que um dia, brindando com um jovem rei ganancioso, que queria que o meio-elfo trouxesse os itens apenas para ele, o burguês acabou se deixando levar pela bebida, revelando um dos maiores segredos que possuía: a Marca da Fênix – uma maldição que cercava a família real. 

O jovem sabia que não poderia ficar vagando para sempre e que alguma hora seria bom ter aliados que pudessem protegê-lo e servi-lo. Vendo na confissão do rei uma oportunidade, propôs um acordo: ele continuaria suas expedições, e voltaria ano após ano até que o rei ou seus herdeiros, tivessem uma filha, que seria prometida a ele, formando uma união com benefícios mútuos. Mas, se ele demorasse e outra oportunidade aparecesse, ele não a desperdiçaria. O rei, tão orgulhoso, vaidoso e arrogante quanto o jovem, concordou.

O meio-elfo continuou suas aventuras solitárias e mesmo quando voltava de mãos vazias, se dirigia à ferreiros de confiança para construírem itens que alegaria serem antigos e raros, enganando pequenas cidades e aldeias. Não somente isso, quando encontrava reinos com criaturas consideradas “perdidas” ou “extintas”, que tinham medo de voltar à superfície e serem caçadas ou mortas novamente, sempre realizava chantagens em troca de seu silêncio.

Um dia, o rapaz encontrou o Templo do Éter, que continha em suas paredes passagens sobre Templos Elementais, inclusive sobre o Templo da Morte, que fora construído por Argen durante a Grande Guerra, aguçando sua curiosidade e decidindo que iria fazer de tudo para encontrá-lo. Talvez ali teria o poder do grande Lich, e se existisse, iria tomá-lo para si. 

Após muitos sacrifícios, não somente de seu próprio sangue, mas também de muitos inocentes, descobriu uma ilha longe de todos os continentes, que ficava rodeada por águas turbulentas e nuvens negras, a qual ele tinha certeza ser o lugar onde iria encontrar o que queria. 

Com muito esforço encontrou um grupo de marujos que aceitou navegar com ele, já que todos sempre informavam que na direção que queria ir não tinha nada, porém, aumentando a recompensa que os tripulantes teriam, o grupo concordou em acompanhá-lo. 

O mar estava tranquilo, e os marujos beberam, cantaram e guiaram o navio com grande maestria. O meio-elfo até começou a pensar que sua vida teria sido mais divertida se tivesse optado por escolher um grupo para si, mas ao terceiro dia, quando já se aproximavam do local, o mar se mostrou mais agressivo.

Os marujos diziam não ver sombra ou contorno de ilha, mas o meio-elfo afirmava enxergá-la no horizonte, e por isso, indo contra tudo que acreditavam, eles prosseguiram. A noite foi longa e começaram a ser atacados, mas ninguém sabia dizer o que ou de onde os ataques vinham. Pareciam tentáculos gigantes, mas num piscar de olhos, era somente uma sombra que se desfazia no ar, como poeira. Às vezes, pareciam milhares de flechas e arpões que estavam sendo lançados de lugar algum, mas olhando ao redor, não se via sinais de buracos que pudessem ser causados por eles. 

E parando um momento, o jovem viu os tripulantes mortos. 

Era por isso que não andava em grupo.

Percebeu que tinham apenas algumas pessoas que gritavam e tentavam matar algo irreal, então ele pensou: não era verdade. Deveria ser algum tipo de magia, e o que estava fazendo o coração dos tripulantes parar de bater talvez fossem armadilhas, armas ou magias simples, que quando atacadas da maneira correta e certeira, estavam eliminando um a um. 

Eram fracos.

Por isso ele não andava em grupo.

Sem pensar muito, deixou-os enquanto pegava o único bote salva-vidas e saía dali. Os tripulantes viram suas intenções e partiram para cima dele. Aquilo era traição. Mas quando tentavam atacar, aquela sombra impedia. Coincidência? O meio-elfo acreditava que não. Estava predestinado a algo e nada de ruim iria acontecer com ele. 

Adentrou o bote que estava intacto, “milagrosamente”, e começou a se afastar do navio, sendo impulsionado pelas ondas através das pragas e maldições gritadas pelos que ficaram no navio e logo morreriam por sua culpa. 

Mas ele não se importava. 

Era melhor que eles.

A viagem que cobria o resto da distância não foi tão simples quanto imaginava, e mesmo sabendo que estava sendo guiado, acabou sendo jogado violentamente contra pedras pontiagudas de coloração preta, que detinham o brilho da lua sobre si, mesmo com as nuvens pesadas que cercavam o lugar. 

Quando abriu os olhos não sabia quantas horas haviam passado. Olhou para o céu, as nuvens estavam escuras e o ambiente não tinha um único ponto de luz. Será que havia passado um dia inteiro ou apenas alguns instantes desde que estivera no navio? Olhou para o mar. Parecia calmo, como se nunca tivesse sido tempestuoso. Não conseguia compreender, mas sentia que estava próximo de descobrir a magia primordial que tanto buscava.

Sorriu aliviado enquanto se levantava, agradecendo a visão no escuro que o permitia não estar totalmente cego, mas enxergando com muita dificuldade, usou um de seus truques, e buscando por uma pedra que coubesse em sua mão, iluminou-a proferindo algumas palavras, e logo o ambiente se mostrava mais simpático.

Se fosse durante o dia, a única coisa que poderia fazer alguém pensar que ali não era uma ilha paradisíaca seriam os grandes veios e musgo preto que circundavam as plantas e o cenário que estava ao redor. Se fosse outra pessoa, já teria buscado um jeito de ir embora. Mas ele estava ali, e ele queria o poder para si. 

Começou a adentrar a floresta, sem medo, como se já tivesse estado naquele lugar anteriormente, talvez em um sonho distante que tivera. Mas isso não importava. Ele apenas seguiu confiante, não prestando atenção ao seu redor, pois se o fizesse, perceberia que a floresta não continha os barulhos naturais que deveria ter. Andou até encontrar uma grande ruína que antes poderia ter sido qualquer coisa. 

Era o Templo. 

Ele sabia disso.

Caminhou em direção ao lugar totalmente hipnotizado pelas pedras negras que estavam caídas, percebendo que algumas áreas pareciam intactas. Lentamente foi até a frente do Templo e sorrindo, adentrou o local. 

As paredes eram lisas, cheias de rachaduras, sem adornos, tecidos ou objetos. Também não tinha poeira, o que levou sua mente a imaginar se o motivo era mágico ou se existiam criaturas que limpavam o local. Ele se sentia estático, como se estivesse preso no tempo, petrificado em um lugar que não fazia sentido, e a sensação perdurava mesmo estando em movimento através dos corredores largos.

Conforme andava desviando de destroços e detritos caídos, viu ao longe a sala central, com o que parecia ser uma espécie de trono. E no ímpeto de chegar lá, correu distraído em sua própria ansiedade, tropeçando, e como numa dança ensaiada, caiu em uma abertura no chão, provavelmente, uma das armadilhas do local que com a destruição, acabou abrindo mais e se transformou numa armadilha natural. 

Bateu nas paredes enquanto caía e se chocou contra o chão com muita força, sabendo que qualquer pessoa normal morreria no processo, mas como um aventureiro experiente, percebeu que apenas havia arranhado algumas partes de seu corpo. Respirou fundo tentando se recompor, mas quando ia se levantar, sentiu uma grande dor na perna, e antes que pudesse entender que não estava conseguindo se movimentar, foi atingido pelas pedras que se soltaram das paredes.

Acordou um tempo depois, totalmente no escuro, coberto por rochas e poeira. Sentou-se e começou a contabilizar os estragos: sua bolsa, com todos os componentes, estava longe. A pedra luminosa tinha se apagado. E ele estava repleto de cortes e sangrando mais do que estava acostumado. Mas seria fácil sair dali. Era preciso apenas conjurar algumas magias simples, falar algumas coisas, mexer seus braços, e pronto, iria pegar sua bolsa. Mas quando tentou conjurar, percebeu que suas mãos tremiam e o feitiço falhou.

Assustado, começou a pensar, até que percebeu: aquele material preto que circundava toda ilha tirava sua mana. Lembrou-se do poder do Lich. Todas as histórias que conseguia pensar lhe faziam ter a certeza: ele iria morrer ali. Desesperado, sua mente buscava por alguma solução, mas o que poderia fazer? Tentou de tudo, mas nada adiantava, então finalmente se rendeu aos gritos de socorro, mesmo sabendo que ninguém ouviria.

Após alguns momentos com seu pranto sendo dispersado pelos corredores, ouviu um arrastar lento acima de sua cabeça e olhando ao alto, percebeu uma Larva branca, do tamanho de seu antebraço, se aproximando pela parede. Limpou seus olhos das lágrimas enquanto o animal parava em sua frente.

Instantes silenciosos se passaram, enquanto ela lhe encarava, até que o ar foi cortado por uma voz rouca que ecoou, e mesmo que não estivesse vendo aquele bicho abrir a boca, sabia que vinha dele o que era ofertado de maneira sussurrada e convidativa:

“Você sempre esteve em templos e masmorras, e agora vai morrer sozinho… 
Ninguém vai te encontrar, porque ninguém se importa com você…
Você não precisa de ninguém. 
Posso te dar poder!
Tudo que quiser…
Você precisa me ajudar a te ajudar…
O outro que ajudei não era forte o bastante… 
Mas você parece ser… 
Você é forte… 
Mas vai morrer fraco…
Só quero que todos conheçam o que meu mestre tem a dar… 
Aceite minha ajuda!
Tenha o poder do conhecimento e da morte!”

Sua mente vagou conforme a proposta foi sendo efetuada. O mestre da larva era quem? Argen? A Morte? Se eles existiam, ele poderia pegar seus poderes? E o que ele teria a dar?

Essas e outras perguntas percorriam seus pensamentos, e aos poucos, conforme a Larva sussurrava promessas, ele cedeu. A fome, o frio, o sono e a sede também o influenciaram, mas não foram o fator principal: sua curiosidade, vaidade, ganância e orgulho foram revirados, pois o poder havia sido ofertado. 

Ele poderia ter tudo, certo? 

A Larva andou lentamente até o aventureiro que acenava sua cabeça em direção às promessas, e o bicho, subindo em seu peito, rapidamente cavou um buraco na direção de seu coração enquanto ele gritava de dor. 

Seu corpo e sua alma foram transformados, deixando-o com uma aparência diferente: pele murcha esticada sobre os ossos apareceram. Seus olhos sucumbiram à deterioração, e pontos verdes queimaram em suas órbitas vazias.

O silêncio durou horas, até que foi quebrado quando passos foram ouvidos vindos do largo corredor com a vala conforme aquela figura se aproximava do grande salão contendo o trono feito de ossos. Larvas de diferentes tamanhos apareceram, algumas subiram pelo seu corpo deteriorado carregando um grande e antigo manto vermelho com adornos dourados até seus ombros, onde mãos esqueléticas o prenderam sobre si. Iria encontrar a filactéria!

O Grande Lich estava de volta!


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Assim Nasce um Vilão – Prólogo em Enots #02

Revisão e Montagem da Capa: Isabel Comarella

 

A Marca da Fênix – Prólogo em Enots #01

Prólogo em Enots é uma serie em 4 contos que contará a história da Criação e Decadência do plano Enots. Nesse conto veremos que Thersys foi chamada para ter A Marca da Fênix, e saberemos as consequência disso!

A Marca da Fênix  

Depois da Grande Guerra que quase dizimou o mundo, e na qual inúmeros nobres e famílias grandes tiveram trágicos fins, um grupo sobreviveu: os Droverson. Antes uma família a qual ninguém dava valor, graças à covardia, se mantiveram escondidos, e por causa disso tornaram-se nômades, destinados a juntar os poucos que escaparam das garras de Argen, um poderoso Lich que havia ascendido.

Parte da família aceitava que sua sobrevivência vinha do medo e de sua fuga, mas outra parte tinha vergonha de ter tomado tal atitude. Dentre estes, Thersys detinha a maior revolta quanto ao seu comportamento. Antes da Guerra, sendo aventureira, só ficou escondida para proteger as crianças de sua irmã gêmea, uma das primeiras a serem atingidas com os fragmentos da destruição que assolaram o mundo, mas agora, sentia que tinha de fazer mais, decidindo voltar às suas raízes, e sair pelo mundo em busca de aventuras, deixando seus sobrinhos em segurança nas mãos de seu ex-marido, que prometeu cuidar deles até que voltasse.

Ela seguiu viagem pelos continentes e pelas ilhas que circundam os mesmos, conhecendo as mais diferentes pessoas e armadilhas. Felizmente, seu grupo estava preparado para inúmeras situações, e mesmo com os muitos ferimentos e cicatrizes, ela jamais desistia de continuar seguindo, sabendo que voltaria para casa apenas quando saciasse sua alma aventureira.

 Após muitos anos de histórias fantásticas e perigos inestimáveis sendo ultrapassados, teve um sonho estranho, na qual um enorme pássaro rapidamente se aproximava dela e a abraçava com as penas, e após alguns instantes na qual sentiu um abraço caloroso, ele se dirigia à um grande vulcão.

Acordou assustada. Lembrava-se daquele vulcão. Era de uma ilha pela qual tinha passado e havia lhe chamado a atenção pelo vulcão estar em seu centro, mas eles não o haviam explorado. Sugeriu ao seu grupo voltar até lá, mas recebeu negativas da parte de todos.

Passou alguns dias pensando no sonho. Algo havia mexido com ela, que se perguntava o que poderia ter dentro do vulcão, já que estava inativo, ou assim aparentava, e a ideia, cada vez mais fixa em sua mente, fez com que ela tomasse uma atitude drástica, e em uma noite sem lua, decidiu seguir viagem sozinha. 

Felizmente, com toda experiência que havia ganho, soube se virar bem, chegando ao local e percebendo que a ilha estava totalmente deserta, e o vulcão inativo, explorando, percebeu que ele possuía inúmeras entradas em suas paredes, o que não condizia com aquilo que tinha de conhecimento sobre tais ambientes, e adentrando uma dessas aberturas, começou a perceber sinais de que seres inteligentes haviam vivido ali. 

Reconheceu pinturas, armas, objetos e escritas, que logo percebeu ser dracônico. Pelas pinturas, tinha certeza: draconatos vermelhos viveram ali. E juntando as peças, começou a deduzir o que havia acontecido: provavelmente, eles se refugiaram ali durante a Grande Guerra, mas talvez tenham sido encontrados pelos Eskeletons, já que ali havia muitos sinais de luta e cadáveres putrefatos, com marcas negras ainda em seus ossos. 

Começou a se perguntar os motivos de terem ido até ali para matarem um povo que vivia isoladamente, lembrou que durante a Guerra, seres elementais foram perseguidos, mas sentia que ali tinha mais. Passou a prestar mais atenção aos detalhes, buscando pistas e indícios de algum poder que eles poderiam ter e que pudesse ter sido roubado, porém não teve sucesso. Mas quando estava saindo pelo topo, tendo percorrido todo o interior do vulcão, suas passagens e grandes salas, notou rastros sutis que levavam a uma parede, levando-a a pensar que poderia existir uma passagem secreta. 

De maneira ágil, usou de seus pertences, kits e algumas habilidades que aprendera com um grupo de ladinos que passara um tempo, descobrindo uma pedra, que quando movida numa direção específica, abria uma pequena entrada, pela qual teve de se agachar e rastejar alguns metros, até conseguir se levantar e perceber um longo e estreito corredor, pelo qual avançou até se deparar com um salão oval com quatro cadáveres que pareciam estar montando guarda anteriormente circundando um grande pedestal que estava ao centro, contendo uma almofada vermelha empoeirada, e acima dela, algo que parecia um amuleto. 

O objeto detinha o formato de um pássaro com penas flamejantes, feito de ouro e coberto com uma aura vermelha brilhante, e parecia gritar seu nome. Parecia o mesmo de seu sonho. Se aproximou do amuleto, notando que sua pele estava formigando, e seus dedos, antes que pudesse pensar sobre suas ações, tocaram o pássaro, que se desfez em poeira dourada. Dali saíram quatro sombras iluminadas, iguais à forma do que mais tarde ela descobriria serem uma Fênix. 

Os Espíritos rodearam-na como se possuíssem consciência, com total curiosidade sobre sua libertadora. E de repente, sem mais explicações, com Thersys sentada no chão em profundo choque observando a cena, os quatro elementais se olharam, emitiram um som agudo, e enquanto um deles se aproximava dela, como um manto cobrindo uma criança, os outros três saíram dali atravessando as paredes rochosas. 

Tomada por um espanto notório, a aventureira entrou em desespero, tentando vomitar o que estava dentro de si, mas ao ouvir uma voz calorosa e quente, se acalmou. O Espírito se apresentou como Feit, fazendo-a lembrar que era um dos Heróis que derrotaram o Lich. 

Respirando fundo, ouviu a Heroína lhe explicar o que estava acontecendo, e o que agora seria sua nova vida.

Feit, ao morrer, entendeu sua vida e a razão pela qual havia existido e o motivo de ter nascido tiefling em meio à humanos. Ela havia sido criada pelo Dragão Vermelho, e no processo, lhe foi passado o Poder do Sol que ele tinha em si, já que os Grandes Dragões gostavam de brincar com os mortais. 

Não foi sua escolha, mas ela havia recebido a responsabilidade de carregar essa marca. Se ela morresse, o mundo estaria condenado à completa escuridão, até que outro tiefling nascesse e fosse escolhido como elo com a Luz que o Dragão Vermelho detinha. Porém, no momento que decidiu se sacrificar, o dragão percebeu que não poderia manter a ordem das coisas dessa forma, e por isso, decidiu fazer a conexão mudar de uma criatura viva para um objeto.

A tribo de draconatos vermelhos que vivia no vulcão tinha conhecimento primordial da Profecia da Fênix, apontando para um item que apareceria no formato de um pássaro flamejante, e que deveria ser protegido a todo custo. Por isso, quatro bravos guerreiros foram incumbidos de se esconderem no salão oval, protegido também por diversas magias, para montarem guarda sobre o item que, naquele momento, ainda não existia ali. 

A fé deles na promessa de um item criado pelo Dragão Vermelho fez com que os draconatos não deixassem seus postos, mesmo quando ouviram seus companheiros serem massacrados do outro lado das rochas do vulcão durante a Grande Guerra. Mas eles não imaginavam o que teriam de enfrentar, tendo se preparado para confrontos diretos, não contavam que os Eskeletons iriam usar de artimanhas mentais, transpassando as paredes sólidas do lugar, e afetando qualquer criatura pensante que pudesse estar nas redondezas do vulcão.

Dessa forma, foram devorados de dentro para fora, enquanto o amuleto aparecia em cima da almofada e permaneceria intocado, até aquele dia. Thersys, sentindo-se sem honra para tal posição, começou a se desculpar com o Espírito que lhe acalentava com seu calor, e lhe transmitia a sensação de que tudo estava correndo de acordo com um plano que talvez já estivesse traçado, e percebendo que não havia motivos para se incomodar, continuou ouvindo a explicação.

O Dragão, sabendo que o objeto havia se desfeito, percebeu que a Luz ficava maior enquanto ligado à uma criatura viva, e por isso, iria encontrar outra forma de conexão, dividindo-se em quatro pássaros de fogo, cada um iria para um continente principal, onde adentraram um ser pensante, e iria permear sua família durante as gerações. 

Sendo a primeira criatura usada, uma mulher, assim se seguiria as outras quatro escolhidas agora, e Thersys seria uma delas, conectadas ao sol diretamente, ganhando habilidades relacionadas ao fogo, e influenciando o clima da região conforme o humor e a saúde delas fosse alterado, tendo também, mais anos de vida que uma humana normal. Porém, os homens que nascessem, estariam destinados a ter apenas metade da vida, representando o sacrifício de Feit, que morreu cedo demais diante do Lich. 

Enquanto processava essas informações, sentiu um leve ardor e queimação em suas costas, que quando inspecionada, percebeu se tratar de uma espécie de desenho que estava sendo formado no formato da Fênix, como uma mancha de nascença que sempre estivera ali, sendo informada por Feit que as mulheres seriam chamadas de Filhas do Sol a partir dali.

Após um período em silêncio, Thersys compreendeu seu propósito, e o motivo pelo qual sempre fora irrequieta, pois agora, seu coração estava tranquilo, como se tivesse encontrado o que tanto buscou em suas aventuras. Percebeu a grande benção e maldição que caíra sobre ela, e a qual, assim como a grande Heroína, ela não escolheu receber. 

Enquanto se levantava e caminhava para fora do vulcão, sentiu em si um grande peso, e ela tinha certeza: se as Filhas do Sol morrerem algum dia, o Dragão Vermelho não terá mais o que fazer, e o mundo irá adentrar numa escuridão e frio gigantescos. 

A aventureira, percebendo o perigo que corria, voltou para sua família, que para sua surpresa, havia construído uma pequena aldeia que estava em expansão. Contando aos mais próximos o que havia acontecido e o que carregava agora, mantiveram uma promessa de sempre proteger a família, ganhando destaque em termos de estratégia e segurança perante o povo do vilarejo, e após um conflito com outra grande família que se estabeleceu ali, instaurou-se uma monarquia, onde os Droverson eram líderes natos, e usavam sua posição de destaque para manter o segredo e a segurança que precisavam. 

As décadas foram passando, e as crianças que começaram a nascer eram apenas do sexo masculino, fazendo a região ficar mais fria e com fortes ventos no decorrer dos anos. A profecia era sempre lembrada, sendo passada de geração em geração aos meninos que nasciam e que sempre perguntavam o motivo de terem uma marca de nascença no formato de um pássaro de fogo. 

Até que um dia, o rei vigente, enquanto tentava barganhar com um meio-elfo alguns itens mágicos e raros para aumentar o valor do reino, se deixou levar pela bebida, retirando as luvas que sempre usava e mostrando a pequena marca, no formato de uma ave com penas flamejantes, que possuía nas costas da mão direita. O formato diferente aguçou a curiosidade do jovem ganancioso, que após ouvir a história, se viu, no futuro, pertencente a uma família poderosa que detinha o poder do sol.

Realizando um acordo com ele enquanto escondia suas reais intenções, afirmou que se voltasse ali e o rei tivesse uma filha, iria ficar satisfeito em se casar com ela, criando um laço concreto entre eles, e permitindo que todo e qualquer tesouro encontrado fosse dado ao reino. A promessa foi sendo passada pelas gerações aos homens que nasciam, enquanto meio-elfo havia desaparecido.

Quando finalmente uma menina nasceu, fez-se o dia mais lindo em anos, e o sol sorriu sobre o lugar, melhorando as colheitas e as festividades da região. O rei, tendo seu coração amolecido pelos cabelos ruivos e pelos olhos azuis da pequena Solara, que constantemente sorriam para ele e traziam a alegria de seus dias, já que sua amada havia falecido no parto, não quis levar adiante a promessa que outro rei havia feito, ficando satisfeito, com o desaparecimento dele já se estendia há uns anos, e a qual não despenderia esforços para encontrar. 

Ele estava em seu reino, tendo seus melhores dias, e cuidando de sua filha com todo amor e cuidado que poderia ter, mantendo o lugar sobre uma paz, recebendo todos igualmente e realizando acordos de boa vizinhança constantemente para manter a ordem.


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