Égide da Tempestade – Parte 7 – Contos de Thull Zandull

Anteriormente em Égide da Tempestade – Parte 6, o grupo de centuriões ficou a mercê da natureza, presos por uma tempestade,  e ao fim dela descobriram que os inimigos eram muitos e bem mais preparados. Dargon acredita que essa guerra está perdida. Fique agora com Égide da Tempestade – Parte 7.

Égide da Tempestade – Parte 7

Prenúncios de calamidade

Era um dia que remetia as melhores lembranças de Soren. O Sol, o semblante vivo de sua divindade ali finalmente trazia seus fulgurantes raios para aquecer corpos e mentes de legionários cansados. 

Apesar do desafio, o trabalho feito naquela semana foi intenso. Havia um pequeno fosso e a terra retirada foi utilizada como ponto elevado, suas bases reforçadas com madeira, assim a terra não facilmente cederia. 

Espigões de troncos também foram espalhados pela estrutura, fato que impediria cargas de quaisquer montarias que avançassem. O local no qual estavam tinha dois andares subterrâneos, que foram limpos e organizados. A estrutura como um todo não passava de um torrilhão de vigilância. Porém apesar do abandono ainda tinha uma forte estrutura. 

Com o passar dos dias, alguns aldeões juntaram-se à guarnição. Estes traziam notícias sobre os diversos ataques e as derrotas sucessivas das forças de defesa. Nada de novo para aqueles que ali estavam no limite da tormenta, que em breve estaria à vista. Fato que a construção em suas épocas áureas podia contar com até 70 pessoas, entre soldados e viajantes à procura de segurança durante a noite. Mas naquele dia, a contagem já passava de 200. Infelizmente uma boa parcela destes não eram combatentes treinados, mas recusaram-se a deixar a segurança que a posição oferecia. 

Dargon, utilizava parcela de seu tempo em treinar os mais fisicamente aptos com o mínimo necessário. Enquanto refletia sobre quanto tempo as provisões durariam. Havia racionamento de tudo e com organização todos conseguiam espaços para descanso, tudo era compartilhado e de certa forma a presença do Exarca trazia paz e ordem, mesmo em condições difíceis não havia reclamação, mas sim um esforço contínuo. 

O Minotauro não ignorava esses detalhes, pensava consigo que em outras condições, com mais pessoas e com uma estrutura adequada, o Exarca poderia ser um governante digno. Porém todas as vezes que deixava sua mente divagar, rapidamente era trazido de volta com alguma urgência a resolver. 

Aquele realmente era um dia tranquilo, mas rapidamente a tranquilidade momentânea cessou com o retorno apressado de um batedor. Dargon o interceptou:

-Quais informações trás de sua posição?

-Centurião, há soldados em marcha, acredito que tem o dobro de nossas forças. Linhas de suprimento bem estabelecidas, trazem consigo uma bombarda senhor! Não acreditei quando vi, mas trouxeram uma das temíveis armas construídas pelos infiéis do oeste distante. A arma maldita cuspidora de ferro e fogo!

Uma verdade dolorosa

Dargon conhecia bem o poder de tal arma. Havia temor quando as primeiras foram utilizadas nos campos de batalha do sul do Império. 

Desde então a Fé Diáfana tentava compensar com crença cega o desequilíbrio trazido pelos estrangeiros. Para piorar, havia ordens para que nenhum tipo de equipamento de infiéis fosse usado, já que estavam maculados. O centurião nunca entendeu o motivo, pois aquelas armas faziam grande diferença quando funcionavam adequadamente. De posse da informação imediatamente procurou o Exarca. 

Ao chegar no pequeno aposento privativo no topo do torrilhão, percebeu a porta entreaberta. Lá percebeu um brilho avermelhado e ao se aproximar sorrateiramente presenciou Soren preparando uma espécie de poção com pequenos cristais, seu corpo estava castigado, mais magro e com feridas que resistiam a cicatrização. Estava sem camisa e desta maneira, Dargon viu chagas variadas e manchas escuras parecidos com hematomas. A armadura do líder ali estava no suporte, com uma luminescência constante vinda da parte interna onde rumas cristalinas existiam.

O centurião entrou abruptamente:

-Soren? O que é tudo isso?

Soren se virou calmamente:

-O último recurso meu caro amigo. Desde que chegamos a esta terra tive que usar tudo que tinha à minha disposição para manter a chama de esperança viva. A fé é sincera, mas os poderes nem tanto. Há magia, mas não da fonte que imaginava. Lembra que falei a você sobre os conhecimentos e poderes ocultos deixados de lado pela Autarquia? Pois bem, elixires preparados com fragmentos de geodos arcanos podem potencializar qualquer tipo de magia utilizada, porém a um alto custo para saúde do usuário. Meu grande poder, minha dádiva é verdadeira, mas sua força nem se compara a de outrora. Minha poderosa armadura também tem pedras e encantos abominados pelos mais fanáticos e puritanos praticantes da fé, apenas desta maneira é possível usá-la em combate. Com todos estes recursos, este velho corpo decidiu fazer um sacrifício digno. Meu estoque não durará muito e minha intenção agora é garantir que o assombro desta manifestação em campo garanta a vida do máximo de pessoas que eu puder. Não chegaremos a cidade de Basil, não tombaremos gloriosamente em campo. Vou honrar meu juramento Dargon, isso eu garanto.

-Eu e todos os outros acreditamos em sua força divina, mas agora percebo que não passavam de embustes, os mesmos usados pelos Venéficos que caçamos, estou confuso em ver que a dádiva que orgulhosamente citou não passava de uma demonstração da corrupção dos geodos arcanos?

-Dargon, a corrupção e os instrumentos que cita SEMPRE foram um argumento, um ponto de vista nesta luta de ideologias! Não aprendeu nada em todo este período que estamos em campanha. Eu te tirei daquela maldita fortaleza assim como seus comandados, com uma única esperança… SAIA, É UMA ORDEM!

Tambores da guerra

Dargon bateu a porta atrás de si, à medida que caminhava dava ordens aos soldados, preparando assim todos para o combate, porém as palavras que ouvira de Soren ecoavam em sua cabeça. Ele se lembrava de sua juventude, se lembrava do período anterior a seu rito de purificação, se lembrava de tudo que viveu antes da legião, mas nada mais importava, havia mais um combate, provavelmente seu último.

Um de seus oficiais se aproximou:

-Senhor, um mensageiro Orc se aproxima, devemos abatê-lo?

-Negativo, desejo ouvir o que ele tem a dizer.

O mensageiro em imponente couraça de aço montava um lobo atroz, parou a dez metros da torre e solicitou audiência, Dargon foi a seu encontro.  

Foi então que o Orc disse:

-Venho em nome de Mira, comandante das tropas em marcha. As forças que defendem este torrilhão devem se render ou faremos o fogo chover sobre vocês ainda está noite!

Antes que Dargon pudesse responder, Soren surgiu gloriosamente respondendo:

-NÓS RETRIBUIREMOS, COM IRA E RELÂMPAGOS!

Dargon ouviu o clamor de exaltação dos legionários com a bravata proferida pelo Exarca. Havia determinação e coragem quando a figura heróica de Soren surgia, isto era inegável, porém nem toda coragem do mundo seria capaz de deter as forças que investiriam contra eles…

Continua…


Égide da Tempestade – Parte 7 – Contos de Thull Zandull

Autor: Thull Zandull
Revisão de: Isabel Comarella
Artista de Capa: Douglas Quadros

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Égide da Tempestade – Parte 6 – Contos de Thull Zandull

Anteriormente em Égide da Tempestade – Parte 5 a comitiva continua na extenuante viagem. Dargon está impressionado com o poder que a Fé concedeu ao Exarca Soren. Mas sua própria fé ainda será testada em sua jornada. Fique agora com Égide da Tempestade – Parte 6

Égide da Tempestade – Parte  6

Maus presságios.

A jornada pela estrada régia persistia e como um sinal de mau presságio o tempo começou a castigar a todos. Já era o segundo dia com chuvas torrenciais, algo atípico para aquela época do ano. A estrada apesar de mal cuidada ainda mantinha-se firme, uma lembrança agradável dos dias de glória do Império. Porém, assim como ele, dava sinais claros que a inércia dos responsáveis pela manutenção causava prejuízos nítidos quando a análise ocorria a longo prazo. 

Fora, as divagações, o Exarca Soren refletia consigo até que ouviu o chamado do centurião Dargon, indicando que haviam chegado a outra estrutura comunal usada pelos antigos destacamentos de vigilância das estradas. Assim como esperavam, a construção estava em péssimo estado, porém com algum esforço poderia servir de guarnição fortificada. 

Os esforços naquela noite foram maximizados pela agressividade do temporal. Não havia outra alternativa ao experiente líder daquela companhia a não ser permanecer naquele local por mais tempo, até que as chuvas dessem uma trégua. Ainda durante a madrugada, Soren começou a rascunhar ordens e pensar na melhor utilização daquele local. Implorou por iluminação e recebeu uma resposta misteriosa. Ele sabia que teriam que permanecer naquele local por uma semana, não entendia a natureza do presságio, mas ele era um homem de fé, algo diferente de toda estrutura de poder que o circundava e ao qual ele firmemente criticava. Permanecia firme a outros dogmas, outros juramentos e por isso seus vínculos pareciam tão diferentes de outros Exarcas.

Soren chamou Dargon para uma conversa. O centurião prontamente atendeu ao chamado mas não conseguia esconder sua curiosidade, ainda mais por conta do momento da madrugada ao qual fora convocado. 

-Dargon, peço desculpas pelo incômodo, mas preciso conversar sobre nossa atual situação. 

-Estamos sob seu comando. Adianto que tentamos avançar com os trabalhos para organizarmos uma área fortificada, mas infelizmente estamos lutando contra a exaustão e as forças da natureza.

-É exatamente sobre isso que desejo conversar. Não temos condições de avançar para Madras nesse momento. Precisamos permanecer neste local, amanhã você passará ordens aos soldados para derrubarem árvores e iniciarem os reparos deste local no qual estamos, dará ordens para construírem estruturas básicas de vigília, cavarão um fosso que será preenchido com estacas. Precisaremos utilizar nossos esforços nesses trabalhos, apesar do mau tempo. Quero que confie em minha decisão, pois nossa sobrevivência e verdadeira função nesse campo de ações será definido pelo passos cuidadosos que daremos. 

Um servo de pouca Fé

O centurião estranhou aquela postura e questionou a decisão.

-Estaremos cercados se permanecermos parados aqui, não compreendo sua decisão.

Soren continuou:

-Já estamos cercados há muito tempo e já havia citado isso a você. A tempestade traz mensagens ocultas, eu entendo e leio estes sinais por tempo demais para compreender que precisamos parar aqui. Você não está entendendo, não conseguiremos irem além deste ponto! Aqui teremos uma revelação de vida ou morte e por isso desejo que todos os dias você utilize seu tempo para progredirmos em nossas conversas.

O centurião assentiu e pediu permissão para retornar ao descanso. Durante aquela noite Dargon não conseguiu retornar ao sono, além da tempestade e preocupações, a fala do Exarca o deixou mais atento. 

Havia naquelas palavras tanta insuspeição que o Minotauro sentiu receios em relação ao que poderia estar esperando todos em Madras. Levantou-se ainda antes dos primeiros raios de luz e procurou seu melhor batedor, cedeu-lhe a melhor montaria que tinham e ordenou que viajasse até os arredores da próxima vila, trazendo informações. O batedor escolhido conhecia trilhas antigas e disse que tentaria fazer o melhor que pudesse, mesmo porque qualquer caminho seria um terreno de difícil avanço, porém a segurança urgia por caminhos ocultos. Equipamentos foram cedidos e ele partiu.

O centurião voltou a suas responsabilidades e durante todo o dia mantiveram as ordens recebidas por Soren.

Já ao cair da noite o Minotauro retornou para diálogo com o Exarca, que permaneceu isolado em seus aposentos.

Assim que adentrou o ambiente, Dargon percebeu sinais de cansaço físico extremos ao velho servo divino. Durante horas Soren retomou ensinamentos básicos sobre a Autarquia e sobre a Fé Diáfana. Aquele momento era agradável, pois havia domínio e paixão naqueles ensinamentos proferidos. Parecia que uma pessoa ou energia diferente operava pelo corpo cansado do velho combatente da Fé, mas ainda assim persistia com afinco em seu ofício.

Revelações divinas

Permaneceram nesses momentos de reflexão até o terceiro dia, momento no qual a ira da natureza demonstrava sensível redução e também momento de retorno do batedor enviado.

Dargon rapidamente foi ao encontro do homem, que parecia aterrorizado.

-O que encontrou em Madras?

O batedor respondeu:

-Encontrei nossa morte, meu líder! Existem homens, Orcs, Kobolds, Goblins e muitas criaturas selvagens trabalhando juntas, você acredita? Juntas! A cidade parece uma grande fortaleza móvel com tantos homens, armas de cerco de seres que mais parecem aríetes vivos. Eu contei uma força aproximada de 400 soldados, bem armados e preparados para luta além é claro das criaturas, pelo menos 50 de variados tamanhos. Não teríamos a menor chance contra aquela força e sinceramente não deve ser nem a força principal. Pelo Grande Deus, se tivéssemos prosseguido, já estaríamos mortos. Temos que recuar para o mar senhor. Basil está perdida, não existem caminhos que levam a cidade.

O centurião abateu-se com a informação e repentinamente Soren se aproximou, não disse nada, apenas olhou para ambos e fez sinal para retornarem às atividades. 

Dargon olhou para seu comandante e seu respeito ganhará novo patamar, deveria sim confiar nas palavras daquele verdadeiro servo divino. Iriam esperar o tempo necessário para encontrarem a revelação.

Continua…


Égide da Tempestade – Parte 6 – Contos de Thull Zandull

Autor: Thull Zandull
Revisão de: Isabel Comarella
Artista de Capa: Douglas Quadros

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