Old Dragon: Senhores da Guerra – Resenha

Jogos OSR muitas vezes são considerados mortais, injustos e perigosos. Já imaginou então, por acaso, jogar Old Dragon em um cenário ainda mais mortal, mais injusto e mais perigoso? Então, ponha seu elmo e ajuste sua armadura, pois Senhores da Guerra foi escrito pra você!

Quem são os senhores e de qual guerra estamos falando?

O Guia de Campanha: Senhores da Guerra é um suplemento de Old Dragon escrito por Rodolfo Vieira Maximiano. É o primeiro a chegar às prateleiras após o bem-sucedido financiamento coletivo em 2023. O livro é um guia de campanha, um tipo de suplemento voltado para introduzir regras que moldaram sua campanha em uma direção específica, mas sem ser um cenário pronto.

No caso, SdG (para abreviar) busca trazer para o Old Dragon um clima de ficção histórica, baseado em autores como Bernard Cornwell e Conn Iggulden. O livro ainda cita outras inspirações cinematográficas, como Gladiador e Tróia.

Apesar de não possuir um cenário específico, o capítulo introdutório aponta para três temas importantes para uma campanha de SdG. Seriam eles: a existência de uma força bélica colonizadora organizada (como o Império Romano); um conflito entre uma religião antiga e uma religião “nova” imposta pelos conquistadores; e povos que ameaçam as fronteiras locais.

Quando propus a campanha para meu grupo, usei a série Vikings como exemplo.

Parede de Escudos!

O livro prossegue descrevendo vários elementos para criar sua campanha. Desde trechos mais descritivos, ensinando como ambientar seu jogo dentro da expectativa de uma campanha de ficção histórica, passando por tabelas que podem ser usadas para detalhar personagens e acontecimentos da história, como ritos funerários, origens e traumas e também regras específicas, como combates em paredes de escudos e magos e clérigos menos fantásticos.

As novas regras, particularmente, foram minha parte favorita do livro. Os combates em paredes de escudos são dinâmicos e conseguem equilibrar o impacto da força do grupo com a dinâmica das ações individuais dos personagens sem perder a simplicidade de Old Dragon. Vitória acertadíssima do autor!

“Morra, invasor!”

Magos e clérigos, aqui chamados de druidas ancestrais e padres, possuem menos habilidades mágicas e precisam redobrar sua esperteza para se sobressaírem em um cenário extremamente belicista. Mas claro que isso sempre foi parte da diversão em jogos OSR. As regras para itens “mágicos” também ficaram bem evocativas e totalmente no clima. Como não existe mágica de verdade, como em um cenário de fantasia tradicional, por exemplo, as armas, armaduras e acessórios podem “evoluir” conforme sua história se desenrola.

Além disso, ainda temos regras para combates (ainda) mais mortais, infecções e várias outras coisas que farão sua campanha mais brutal e desafiadora.

Temas sensíveis e o perigo de viver em uma época brutal

O livro não foge de discutir temas sensíveis, como escravidão, mortalidade na infância e violência de maneira geral. Contudo, senti falta de um tratamento um pouco mais cuidadoso sobre como abordar esses temas de maneira mais cuidadosa e respeitosa em jogo, um diálogo necessário nos dias de hoje, com tantas mesas se formando pela internet.

Jogos como Kult, por exemplo, mergulham de cabeça nesse tipo de tema, mas nunca se esquivam da discussão sobre como abordá-las em jogo. Conversar sobre isso pode, inclusive, dar mais liberdade para o mestre ir ainda mais longe em suas descrições, pois fará parte do acordo entre todo mundo (vale a pena ler o texto do Mestre Brother Blue sobre isso aqui no site).

Aliás, admito que a descrição de violência sexual logo no primeiro capítulo do SdG me deixou ligeiramente desconfortável. Não acho que é suficiente para estragar a experiência do livro como um todo (estou mestrando uma campanha e está muito divertida, inclusive), mas é o tipo de coisa que pode acabar afastando alguns jogadores.

“Às armas! Mas com consentimento!”

Por Fim

Senhores da Guerra está disponível nos formatos físico e virtual, sendo que quem comprar o PDF também pode desfrutar do conteúdo do livro no Old Dragon Online. Lembrando que a versão digital do livro básico de Old Dragon é gratuita para quem se cadastrar na plataforma.

E não se esqueça de ver outros textos sobre Old Dragon e a OSR.

Bom jogo a todos!

OSR – Parte 4: Precisa ser Mortal?

Hoje vamos falar de um clichê que às vezes afasta pessoas de jogos OSR, Jogos oldschool têm essa fama de serem extremamente mortais, de que a vida dos personagens não importa. Tudo é descartável e o roleplay fica em segundo plano. Será verdade? Será que não há espaço para jogos cheios de interpretação e drama, já que seu personagem pode morrer ao entrar no corredor errado numa dungeon?

Bom, sim… e não. E provavelmente não do jeito que você está pensando.

O Perigo do Acaso

Em níveis baixos, sistemas OSR como Old Dragon são, sim, mortais, principalmente se comparados a jogos mais modernos, como a quinta edição de D&D. Contudo, essa mortalidade não se dá à toa. Esses jogos são assim porque são imprevisíveis.

Realmente, é muito difícil dizer quem vai levar a melhor nessa luta.

Jogos oldschool tendem a ter números menos inflados, o que faz o resultado do dado ter mais peso. Porém, isso vale também pros adversários: o combate é perigoso para os personagens, mas também é tão (ou mais) perigoso pros goblins que estão enfrentando o grupo!

Isso gera uma dinâmica que força os jogadores a tomarem um pouco mais de cuidado com suas ações se quiserem sobreviver. É um reflexo da ideia de que os personagens em um jogo OSR são realmente iniciantes: um jovem que decidiu pegar uma espada e sair em busca de aventuras com pouco ou nenhum treinamento. Jogos modernos tendem a tratar o herói de nível 1 como um aventureiro já formado e treinado. O que nos leva a outro fator importante.

História Emergente

Sim, seu personagem vai ser muito frágil até o nível dois ou três (até mais do que isso se for um mago). Porém, sobreviver a algumas aventuras vai moldar a história de seu personagem! Isso é uma escolha de design, e não um problema, e está ligado ao fato de que, na maioria dos sistemas OSR, criar uma ficha de personagem é um processo muito mais rápido.

Isso é importante porque criar uma ficha requer investimento de tempo. Com vários poderes e habilidades para escolher, é natural que a morte do personagem traga um pouco de frustração. Jogos OSR esperam que você gere uma ficha rápido e passe a gostar do personagem enquanto vê ele crescer, sobreviver e evoluir. Além disso, eu tenho certeza que quem já passou por um sufoco em que viu o personagem quase morrer em OD2 ou outro jogo oldschool vai lembrar desse momento pelo resto da vida!

Se você quiser que seu personagem tenha mais chances de sobreviver, tenha em mente que cautela é essencial em um jogo oldschool. Sair correndo para atacar os zumbis é muito, muito perigoso! Andar com cautela, tentar negociar, cutucar coisas com uma vara de três metros antes de botar a mão nelas são algumas dicas básicas de como agir para garantir que seu personagem vai continuar respirando.

“Vocês têm um minuto para ouvir a palavra do senhor?”

Drama e Interpretação

Não podemos esquecer que mesmo em versões antigas do D&D (que embasam todo o estilo OSR), cenários bem desenvolvidos, NPCs marcantes e ganchos narrativos já estavam lá. Então, é esperado sim que os personagens sobrevivam e construam uma história. Mundos como Mystara, Greyhawk, Dragonlance, Lankhmar e Forgotten Realms são todos anteriores ao lançamento do AD&D 2e (a linha de corte entre o que é considerado oldschool e o que não é). Agora pense: por que os autores se dariam o trabalho de escrever um NPC profundo e detalhado como Elminster se ninguém fosse sobreviver para encontrá-lo?

“Eu não tenho amigos por que todo mundo morre antes de me conhecer. Triste.”

O fato é que com toda essa mortalidade e imprevisibilidade não é incompatível com personagens profundos e bem desenvolvidos. Aliás, arrisco dizer que o fato de temer pela própria vida pode trazer mais uma camada a ser explorada na personalidade do seu herói.

Além do mais, depois que os heróis tiverem um pouco de experiência, lá pelo nível 5 ou maior, já serão capazes de sobreviver à maioria dos desafios sem muita preocupação. Nesse ponto, aliados, senhores de terras e outros NPCs recorrentes já terão marcado sua presença na história, o que intensifica ainda mais as possibilidades de roleplay.

Por Fim

Jogos OSR são sim mais mortais do que algumas contrapartes modernas. Contudo, isso de maneira nenhuma vai contra as possibilidades interpretativas que surgirão na história. Na verdade, é mais provável que a mortalidade traga novas possibilidades de interpretação. Aliás, se você se interessou por esse estilo de jogo, o livro básico de Old Dragon 2 pode ser adquirido clicando aqui.

E não se esqueça de ver nosso texto sobre partidos políticos em mundos de fantasia.

Bom jogo!

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