A Adaga da Revelação: Artefato de Kult: Metrópolis 199X

Este artigo é sobre um NPC da nossa campanha de Kult na Twitch, Crônicas de Leipzig. Se você está acompanhando os episódios pelo YouTube, saiba que o texto contém alguns spoilers.

Os elementos apresentados aqui podem ser usados por mestras que queiram incorporá-los nas suas próprias campanhas ou apenas serem lidos como inspiração para suas próprias criações.

A Adaga da Revelação

Viajantes perdidos em seus prazeres que eventualmente encontram o Templo dos Desejos em Metrópolis já se depararam com um guardião exigindo um preço em sangue diante das portas do Templo. Isso serve para testar aqueles que estão realmente dispostos a se sacrificar por seus prazeres.

Eventualmente, algum humano pode acabar botando suas mãos em uma das adagas empregadas pelos guardiões do templo: uma longa lâmina escura geralmente com cabo feito de osso, madeira ou metal. Se a adaga provar o sangue de uma pessoa, o portador faz uma Rolagem + Alma:

+Alma

(15+) Você é inundado com os desejos da vítima, tanto os superficiais quanto os mais profundos e ocultos. Se você usar isso para chantagear ou enganar a pessoa, considere que sempre será bem sucedido ao tentar Influenciar, como se tivesse rolado 15+. Você também pode fazer até três perguntas como se tivesse sido bem sucedido em Ler uma Pessoa. Além disso, você pode aumentar a força de uma Relação com essa pessoa em até 1 ponto. Se usado contra outro jogador, você passa a conhecer o Segredo Sombrio desse jogador.

(10-14) Você é inundado com os desejos superficiais da vítima, mas não os profundos. Você pode induzir a vítima a fazer o que você quiser, como se tivesse sido bem sucedido ao tentar Influenciar, mas apenas até o final da cena. Você também pode fazer uma pergunta como se tivesse sido bem sucedido em Ler uma Pessoa. Porém, a proximidade com pensamentos ocultos de outro ser humano faz sua Estabilidade cair em -1.

(9-) Você é inundado pelos desejos da vítima, mas de forma caótica, violenta e desencontrada. Sua Estabilidade cai em -2. A Mestra faz um Movimento.

A Adaga da Revelação tem Dano [0], e mesmo que um personagem ofereça-se voluntariamente para ter seu sangue absorvido pela Adaga, ainda assim ele precisa Suportar Ferimento.

Por Fim

Kult é um dos meus jogos favoritos de todos os tempos. Se você chegou aqui sem saber do que se trata, confira nossos posts sobre o jogo e assista nossa campanha no YouTube.

Não esqueça de conferir também nosso material de The Dark Eye.

Bom jogo a todos!

 

Hierarquia da Camarilla – Dicas de Vampiro: A Máscara

A Hierarquia da Camarilla é citada brevemente em praticamente todas as edições de Vampiro: A Máscara. Porém, muitos jogadores (e narradores) têm dúvidas sobre como funcionam realmente os títulos e cargos na Torre de Marfim. Hoje, vamos tentar explicar um pouco melhor o que cada um deles faz.

Necrofeudalismo

A Camarilla emula uma sociedade feudal, onde favores, intrigas e domínios valem mais do que dinheiro. Então, muitos títulos estão associados a melhores domínios e prestígio na hora de cobrar favores. Porém, isso também implica em obrigações especiais que ajudarão a manter o bom funcionamento da sociedade vampírica.

Também é importante dizer que o poder relativo de cada título varia um pouco de domínio para domínio. Você pode ter cidades onde o príncipe é forte e reina absoluto, ou domínios onde a primigênie tem mais prestígio, mantendo o príncipe quase como um testa-de-ferro. Ou mesmo lugares onde o senescal é a eminência parda por trás de todo o aparato da sociedade imortal.

Portanto, ao lado de cada título vou colocar um valor de Status. Essa é a minha interpretação de como funciona a Camarilla na prática, mas sinta-se à vontade para discordar nos comentários.

“Ou melhor: é imperativo, por ordem do Príncipe, que você comente nesse post.”

Príncipe (Status 4-5)

O Príncipe é a peça-chave da hierarquia da Camarilla. É o responsável pelos assuntos da cidade como um todo: dividir domínios, assegurar o respeito às seis tradições e, principalmente, atuar como um juiz e mediador.

Ao contrário do que parece à primeira vista, o termo “príncipe” não tem relação com o título de nobreza destinado ao sucessor de um rei. Na verdade, o termo se origina no princeps senatus, o político que presidia o Senado Romano.

Um tropo recorrente em Vampiro é reunir o grupo com uma missão do Príncipe. Mas já parou pra pensar como o príncipe pode fazer isso? O que ele vai fazer se você recusar, exatamente?

O Príncipe controla o acesso de cada membro às áreas da cidade onde é permitido se alimentar (já que toda cidade é seu domínio). Em troca, espera que cada membro seja leal e cumpra com determinadas obrigações quando solicitado. Assim, se recusar pode trazer sanções sobre quais áreas é possível ou não se alimentar. Esse é só um exemplo do poder que o príncipe pode exercer.

O príncipe também pode, como um juíz, julgar os crimes dos vampiros da cidade e decidir sua punição, geralmente em conjunto com a primigênie (às vezes sozinho, dependendo de seu prestígio). Claro que ninguém teria uma Caçada de Sangue decretada contra si por pura desobediência, mas a reincidência pode deixar o príncipe menos propenso a relevar outros crimes, como uma quebra de máscara aqui, uma falta de hospitalidade ali…

Senescal (Status 3-5)

O Senescal é análogo à Mão do Rei de Guerra dos Tronos. Sua função é auxiliar os Príncipe em assuntos administrativos, bem como agir como uma espécie de “vice-príncipe” quando este não pode cumprir com suas obrigações.

A relação entre Príncipe e Senescal pode ser conturbada, já que muitos Príncipes vêem o Senescal como um rival e traidor em potencial. Por outro lado, um Senescal de confiança pode acabar facilitando bastante a não-vida de um príncipe. Na verdade, a lealdade entre Senescal e Príncipe pode acabar sendo ou uma pedra fundamental para a sociedade local ou uma imensa vulnerabilidade a ser explorada.

Em cidades pequenas, pode acontecer do título de Senescal ser amalgamado com algum outro, como Xerife, Harpia, ou mesmo o membro mais antigo da Primigênie.

Aliás, Príncipe e Senescal podem ter uma gama muito ampla de relações possíveis…

Primigênie (Status 3-5)

O Conselho da Primigênie é formado pelos vampiros mais antigos de cada clã. Eles servem como uma espécie de parlamento ou senado da sociedade vampírica local. Também atuam como júri quando necessário, julgando a inocência ou culpa dos demais membros em conjunto com o príncipe. Nesses casos, a Primigênie atua como júri e o Príncipe como juiz.

A função dos membros da Primigênie é representar seus clãs e cuidar para que todas as decisões do príncipe sejam tomadas com equilíbrio, sem favorecer mais um clã do que outro, às vezes como conselheiros, às vezes com poder de veto real às decisões do príncipe.

Claro que, como tudo na sociedade imortal, nada é tão simples assim. É possível que, em algumas cidades, nem todos os clãs tenham representação na Primigênie, deixando-os desfavorecidos perante o resto da sociedade. Além disso, trocas de favores entre clãs e membros podem puxar o peso das decisões para lados inesperados.

Xerife (Status 3-4)

Toda a estrutura da Camarilla seria muito frágil se não houvesse músculos para protegê-la. O Xerife é o encarregado de assegurar que tudo ocorra em ordem, de investigar possíveis infratores e punir aqueles que foram condenados.

A Camarilla não conta com nada parecido com um aparato policial nem com um exército “profissional”, então o Xerife estará sozinho na maioria dos trabalhos investigativos. Contudo, solicitar auxílio de outros membros para investigar ou punir é um clichê excelente que provavelmente existe desde que a primeira mesa de Vampiro foi jogada.

Essa solicitação pode partir do próprio Xerife ou do Príncipe, dependendo do prestígio que o soberano desfruta na cidade. Cidades com príncipes fracos e xerifes fortes podem significar que este último atravessa a burocracia tradicional e solicita as missões diretamente aos personagens jogadores outros membros.

Naturalmente, cidades pequenas podem unir o título de Xerife a outro, como membro da Primigênie ou Senescal.

Investigador e porradeiro? É quase como se os nosferatu tivessem nascido pra ser Xerifes!

Harpia (Status 2-4)

Harpias são arautos responsáveis por comunicar as decisões do Príncipe ao resto da sociedade vampírica. Geralmente são os membros mais conectados socialmente, o que naturalmente acaba trazendo prestígio para o portador desse título.

Pense em um Harpia como uma espécie de social media da Camarilla. Agora, imagine que, ao invés de analisar tabelas do Google e postar em redes sociais, ele se reúne com cada um deles pessoalmente (ou marca reuniões, organiza eventos, etc.) para comunicar o que quer que o Príncipe e/ou a Primigênie necessitem.

Geralmente, também é de responsabilidade do harpia registrar formalmente as trocas de favores dos membros que possam ser cobradas depois. A forma de registro pode variar, seja em um grande livro com capa de couro, post-its em um escritório, retratos à óleo ou mesmo a pura memória. Neste caso, uma jogada arriscada que pode atrair inimigos que desejam realizar uma queima de arquivo, mas também pode ser utilizada como barganha para pedir ao Príncipe por proteção especial.

Naturalmente, cidades pequenas podem unir o título de Harpia a outro, como membro da Primigênie ou Senescal.

Guardião do Elísio (Status 2-3)

Se o Harpia é o social media dos vampiros, o Guardião do Elísio é uma espécie de promoter. Cabe a ele o papel de assegurar que o Elísio esteja sempre pronto para receber os membros da Camarilla que tenham funções a desempenhar, segredos a negociar e ofensas a trocar.

O Guardião também precisa garantir que as regras sejam respeitadas e que o Elísio seja seguro para todos, o que pode envolver algum nível de intimidação e capacidade de agir com violência. Ou, no mínimo, tenha aliados suficientes para impedir um estrago muito grande.

Cidades muito grandes podem contar com vários Elísios, e nesse caso, cada Elísio terá seu próprio Guardião.

“Irmão, quebra um galho pra mim? Tem uma galera ali naquela festa que eu preciso botar pra fora. Isso, agora! Agradeço.”

Por Fim

Espero que este texto tente elucidar um pouco como funciona a hierarquia dentro da Camarilla. É normal projetarmos um espelho da nossa sociedade nas sociedades fictícias dos diversos cenários de RPG, mas às vezes distorcer e alterar levemente alguns conceitos pode ajudar a criar um ar mais misterioso, exótico e envolvente na sua crônica.

E não esqueça de conferir os outros textos da Liga das Trevas, agora com material de Mago: A Ascensão também!

Bom jogo a todos!

Old Dragon 2 – Guia do Guerreiro

É comum que jogadores que migram de jogos mais contemporâneos para RPGs mais oldschool estranhem um pouco o fato das classes terem poucas habilidades. Jogos como Old Dragon 2 desafiam o próprio jogador, dificultando deliberadamente que as respostas para os problemas narrativos sejam encontrados na ficha de personagem. Hoje, vamos falar um pouco sobre o guerreiro de OD2 e como jogar com um.

Guerreiro Oldschool

O guerreiro de OD2 tem pouquíssimas habilidades. Se compararmos, por exemplo, com o guerreiro de D&D 5e. Mais especificamente, ele recebe as habilidades Aparar, Maestria em Arma (que melhora um pouco em níveis mais altos) e Ataque Extra. Em D&D 5, um guerreiro que chegar ao nível máximo vai acumular nada menos que 10 poderes diferentes, sem contar melhorias individuais, aumento no número de usos diários e poderes adicionais.

Existe um termo criado pelo designer de jogos canadense Clint Hocking chamado Dissonância Ludonarrativa. É a ideia de que a jogabilidade de determinado jogo pode estar desassociada da experiência de jogá-lo. Evitar isso é a ideia norteia o design de vários jogos oldschool, já que o objetivo é fazer o jogador se sentir na pele do personagem, e não apenas escolher poderes diferentes a cada turno.

Mas como, então, podemos enfrentar todos os perigos de um mundo fantástico, incluindo aí dragões, bruxos malignos e exércitos de criaturas selvagens?

Precisamos pensar como um guerreiro.

Primeira coisa é arranjar uma armadura, né bróder?

Estratégia: Posicionamento e Descrição

O que diferencia um guerreiro das demais classes é, naturalmente, sua capacidade de lutar. Ele tem mais pontos de vida que seus companheiros (d10) e também é mais eficiente atacando (BA) e causando dano (Maestria em Armas). Isso faz com que o guerreiro possa se arriscar mais que seus companheiros, o que imputa a ele a obrigação de proteger os demais membros do grupo.

Posicionamento é o ponto chave para o guerreiro oldschool. Tomar a frente do grupo é essencial para garantir a sobrevivência de todos (a menos que você seja um arqueiro, mas chegaremos lá). Então, é essencial andar com alguns escudos e usar sua habilidade de Aparar quando necessário. Porém, evitar tomar riscos desnecessários é igualmente imprescindível. Então, saber utilizar o ambiente para melhorar suas opções de defesa e ataque também é muito importante.

Ou seja: não saia correndo em carga em um campo aberto, exposto para os arqueiros e magos inimigos. Procure cobertura, obstáculos e busque utilizá-los para direcionar os inimigos em relação ao resto do grupo. Uma estratégia bem feita muitas vezes leva a uma vitória tranquila.

Estratégia não serve só para batalhas de grandes exércitos, certo Lagertha?

É imprescindível que o jogador descreva com detalhes seus ataques e ações. OD2, como a maioria dos jogos oldschool, não possui uma lista de manobras de combate. Então, o mestre pode conceder bônus e penalidades de acordo com a descrição da cena. Empurrar o adversário contra obstáculos, flanquear, utilizar seu peso contra adversários menores, controlar a distância… tudo isso pode servir para criar situações vantajosas para o guerreiro ou para o grupo.

Guerreiros que sigam o caminho do arco e flecha ou das armas de arremesso não podem contar com seu Aparar, mas ainda conseguem utilizar seus pontos de vida para arriscarem-se um pouco mais para chegar a certos pontos do ambiente que sejam vantajosos taticamente, quando não se metem na linha de frente feito o Legolas.

Especializações

O guerreiro de OD2 conta com duas possíveis especializações (por enquanto): Bárbaro e Paladino. Evoluir utilizando uma especialização é mais demorado, uma vez que você usa a tabela de especialista para isso, mas garante novas habilidades.

Bárbaro: Bárbaros são mais resistentes que os guerreiros padrão, o que serve para compensar um pouco sua restrição quanto ao uso de armaduras. Dependendo do nível que decidirem trocar para a especialização, não podem mais evoluir na sua Maestria em Armas, limitando um pouco o dano que causam em combate direto. Contudo, substituem isso com melhores habilidades de escalar e se camuflar, fazendo deles guerreiros ainda mais táticos.

Um bárbaro pode ser um excelente batedor para o grupo, caminhando à frente e emboscando inimigos. Um grupo que saiba utilizar bem esse potencial, pode acabar com certos conflitos muito rapidamente, às vezes até antes que os adversários possam agir! Inclusive, é um caminho que combina muito bem com a arquearia.

Paladino: Paladinos também não podem mais evoluir na sua Maestria em Armas, mas tornam-se extremamente eficazes na tarefa de proteger o grupo. Sua Cura Pelas Mãos vai servir, eventualmente, para diminuir a sobrecarga do clérigo do grupo (embora não seja suficiente para substituí-lo totalmente), e sua Aura de Proteção certamente será muito valiosa na hora de enfrentar o mal.

Paladinos são campeões do bem e da ordem. Então, é natural que o Paladino vá na frente do grupo e anuncie suas intenções perante os inimigos. Mas não é o tipo de coisa que é inteligente fazer precipitadamente. Este recurso interpretativo serve para dar a seus aliados a chance de se posicionar melhor. Use isso para criar táticas eficientes!

“Quero ser um paladino no futuro, mas por enquanto só tenho a capa.”
“Sabe que não precisa mais esperar o nível 5 pra pegar a especialização, né cara?”

Por Fim

Jogar RPGs OSR requer uma mentalidade ligeiramente diferente de jogos mais contemporâneos. Porém, é uma experiência enriquecedora que pode, inclusive, mudar sua percepção até de jogos mais modernos! Continuaremos trazendo aqui guias para as classes básicas nas próximas colunas.

O financiamento coletivo de Old Dragon 2 deve ir ao ar logo. A página do projeto, inclusive, já está no ar, para quem quiser apoiar logo no começo.

E não esqueça de ver nossa resenha sobre o OD2 Fastplay.

Bom jogo a todos!

Antediluvianos – Dicas de Vampiro: A Máscara

Os seres mais poderosos do universo de Vampiro: A Máscara. Criaturas lendárias que foram responsáveis pela criação de cada clã e que das sombras controlam as disputas de poder da sociedade vampírica. Hoje, vamos falar um pouco mais sobre os Antediluvianos.

Mitologia I: O Dilúvio

A origem dos vampiros de Vampiro: a Máscara é bem baseada na mitologia judaico-cristã, e utilizar esse tipo de coisa sempre implica em pensar no quanto você precisa que ela seja verdade para sua história. O criador de todos os vampiros, por exemplo, é Caim, filho de Adão e Eva. Inclusive, o nome Antediluviano faz referência ao Dilúvio bíblico. Os antediluvianos, no caso, são os vampiros que foram abraçados antes do grande dilúvio.

Por outro lado, é legal lembrar que o Dilúvio descrito no Gênese não é o único na história da humanidade. Várias culturas ao redor do mundo criaram mitos parecidos, e muitas explicações giram em volta do desenvolvimento da agricultura. Por outro lado, se você gosta dessa abordagem mais “científica”, digamos assim, você vai ter que tratar toda essa história de Caim e dos antediluvianos como isso mesmo: mitologia.

Falar do Dilúvio é uma boa desculpa pra botar aqui essa gravura maravilhosa do Gustave Doré.

O que nos leva a um problema…

Semana dos Pesadelos

Antediluvianos existem no cânone oficial de Vampiro. A Semana dos Pesadelos, evento onde o Zapathasura, antediluviano Ravnos despertou em frenesi e tocou o terror na Ásia Meridional, aconteceu de fato e faz parte do cânone.

Isso destruiu um dos aspectos que eu mais gostava na mitologia de Vampiro: A Máscara. Justamente essa ambiguidade das histórias contadas. Mas já que essas criaturas mitológicas existem, vamos lidar com isso, certo?

Mitologia II: Vampiros como deuses

Vamos considerar que os progenitores dos clãs são apenas vampiros, muito, muito antigos. Membros da 1ª, 2ª ou 3ª geração que, na prática, são como deuses. Aliás, muitos deles são, de fato, deuses de civilizações da antiguidade, como Arikel, progenitora dos Toreador, que foi adorada como deusa e recebeu nomes como Ishtar, Astarte, Afrodite, entre outros. Ou Set, que empresta seu nome de divindade egípcia ao clã.

Em termos de regras, um antediluviano pode fazer qualquer coisa. Um suplemento lançado em 2004, Gehenna, fazia questão de explicar isso, através de uma habilidade chamada Plot Device. Eles também podem armazenar sangue indefinidamente e gastá-lo livremente. Isso só reforça essa ideia de que os antediluvianos são como deuses.

Mas como isso começa? Bom, a história oficial nos conta que Caim abraçou três outras pessoas: Enoque, o Sábio; Irade, o Forte e Zila, a Bela (repararam a representação da divisão de atributos do Storyteller: mental, físico e social?).

A partir daí, a história de quem abraçou quem fica um pouco confusa. Eu já tentei traçar uma árvore genealógica comparando as disciplinas que mais se repetem e comparando isso com as informações oficiais dos livros de vampiro, mas nunca fecha. Inclusive, os três vampiros cujo progenitor é desconhecido deram origem a clãs que possuem Animalismo como disciplina. Fica o mistério.

Auspícios é muito comum entre os clãs descendentes de Enoque, enquanto Zila gerou vários antediluvianos especialistas em Ofuscação. Contudo, Animalismo é comum entre os três clãs de senhor desconhecido. O próprio metaplot de Vampiro nos dá pistas para duvidar da veracidade dele.

O que eu faço com isso tudo?

Bem… não existe resposta certa. Se dividirmos em dois extremos, em um lado teremos a hipótese de que toda a mitologia é verdadeira: Caim existiu e gerou todos os vampiros. Do outro, nada disso é verdade e vampiros possuem uma origem completamente diferente do que os mitos cainitas contam. Porém, há um espectro muito amplo entre os dois extremos para ser explorado.

Particularmente, gosto da ideia de que nem todos os antediluvianos surgiram no Oriente Médio e nos arredores do Mediterrâneo. Já narrei uma crônica em que havia um vampiro desconhecido de segunda geração na América do Sul. Esse tipo de coisa é bacana para pegar os jogadores desprevenidos.

De qualquer forma, incluir um antediluviano na crônica é algo que deve ser muito bem planejado, pois a partir do momento que há uma criatura com o poder de um deus andando pelas ruas, a crônica passa a ser sobre isso automaticamente.

Por outro lado, há várias maneiras indiretas de colocar antediluvianos na sua crônica seguem exemplos:

Cultistas: Um culto aparece na cidade. A seita acredita que o despertar de um antediluviano específico está próximo, e faz de tudo para “preparar o terreno” para a sua chegada.

Artefatos: Malkav deu a Saulot seu olho. Um grupo de estudiosos acredita ter informações sobre o paradeiro do Olho de Malkav/Saulot, e planeja encontrá-lo

Lendas: Novos pergaminhos com informações sobre a Gehenna foram descobertos no Oriente Médio. Eles contém informações sobre uma linhagem de antediluvianos completamente distinta dos cainitas, e essas informações podem  mudar totalmente o panorama das religiões cainitas.

Nem tudo o que está no Livro de Nod é verdade, mas ele tem a seu favor essa versão de luxo lindíssima lançada pela Renegade. Se você quiser fazer um pergaminho novo e desconhecido, considere desenhar suas próprias iluminuras.

Por fim

Como já discutimos neste podcast, o cânone de qualquer jogo deve ser um ponto de partida para o narrador e os jogadores exercitarem sua criatividade, não amarras imutáveis. Experimente histórias alternativas e origens diferentes para os vampiros de sua crônica. Forneça informações desencontradas – nem todos os mitos estão corretos, afinal. E se os jogadores conseguirem encontrar o paradeiro de um antediluviano e quiserem destruí-lo, ofereça maneiras narrativas interessantes para que isso possa ser feito, mas sempre com um desafio a altura. RPG serve para criarmos histórias em conjunto, não para ficarmos presos à narrativa dos livros.

E, se algum de vocês fizer algo assim, me conte como foi!

Não se esqueça de conferir nossos textos sobre Changeling: o Sonhar.

Bom jogo a todos!

Old Dragon 2 – Fastplay

Falta pouco para começar o financiamento coletivo de Old Dragon 2. Se você acompanha a Twitch do Movimento RPG, já sabe que eu curto muito esse sistema. Tivemos a honra de jogar uma pequena campanha já com as regras da nova edição, praticamente um playtest ao vivo!

E como um pequeno mimo da Buró, botamos antecipadamente a mão no fastplay da nova edição do nosso RPG oldschool favorito. E para quem está curioso, vamos ver o que mudou.

Jogo rápido!

O fastplay tem apenas 30 páginas e traz quatro raças (humano, anão, elfo e halfling) e quatro classes (guerreiro, clérigo, mago e ladrão). Também traz regras para chegar até o 3º nível, um pequeno bestiário e lista de magias.

À primeira vista, percebemos a mudança no cálculo dos modificadores de atributo. Atributos entre 9 e 12 ficam com +0 de modificador, muito parecido com o AD&D clássico. Isso quer dizer que o modificador mais alto possível de início é um +3, se você tiver a sorte de rolar um 18 nos seus atributos.

Um pequeno detalhe que meu lado designer/diagramador gostou muito, também, foi o pequeno elemento gráfico padrão para mostrar como identificar um teste bem sucedido. Em Old Dragon, como em vários outros jogos oldschool, às vezes você precisa rolar números altos, às vezes você precisa rolar números baixos. Com o diagrama, fica fácil visualizar.

Assim fica bem fácil saber quando você precisa rolar um número baixo ou um número alto.

Raças

A principal diferença aqui é a ausência de bônus raciais nos atributos. Os atributos são menos importantes em Old Dragon 2 do que eram na edição anterior. Ao invés disso, algumas raças ganham ajustes nas jogadas de proteção.

Um detalhe que me chamou a atenção é o texto “todas as habilidades de raça são adquiridas no 1º nível durante a criação do personagem.” Isso parece sugerir que haverão raças (ou  sub-raças) com habilidades raciais adquiridas em outros níveis, ao longo da progressão do personagem. Se isso se concretizar, será uma adição muito interessante, já que em vários jogos de fantasia a raça acaba ficando meio que esquecida no decorrer da campanha, pelo menos mecanicamente.

Classes

As habilidades de classe ficaram mais simples, e a nova diagramação facilita muito encontrar as regras para alguma habilidade de classe no texto (acredito que a versão final do jogo vai continuar com as indicações dos níveis de cada habilidade).

Algumas regras como os Talentos de Ladrão e o Afastar Mortos Vivos foram simplificadas. Ao invés das porcentagem para os talentos, por exemplo, você joga 1d6 e compara com seu nível na habilidade. Afastar mortos vivos é jogado contra a Moral do monstro, e coisas dessa natureza. Isso é muito positivo, pois mostra que mesmo sendo Old Dragon um jogo muito simples, ainda havia alguma gordurinha para cortar.

Queria ter botado esse guerreiro bonitão na capa do post, mas não consegui achar um enquadramento legal. Então, aqui está ele. 

Regras

O resto das regras teve poucas mudanças. Você continua rolando 1d20 + bônus de ataque para atacar, rolando 1d20 e torcendo por um número baixo em testes de atributo, e coisas assim. As fichas de monstros estão mais simples e não trazem mais os atributos básicos. Não que faça muita falta, na verdade. O Livro dos Monstros da primeira edição de D&D era assim, e não importa muito como são os cálculos para chegar nos números. Talvez assim, mestres sintam-se mais à vontade para improvisar fichas de monstros rapidamente.

Essa ficha me lembrou bastante as fichas da primeira edição de D&D, mas com uma diagramação mil vezes melhor.

Por fim

O financiamento coletivo de Old Dragon 2 deve ir ao ar logo. A página do projeto, inclusive, já está no ar, para quem quiser apoiar logo no começo. Em breve o fastplay estará disponível para o público, e pode tranquilamente render boas aventuras com um gostinho das novas regras.

E não se esqueça de checar também nosso material de Space Dragon.

Bom jogo a todos!

Tales from the Loop – Resenha

Tales from the Loop é um RPG da editora Free League lançado aqui no Brasil pela parceria entre a Galápagos e a Sagen Editora. É uma criação do designer Nils Hintze baseado no livro ilustrado do artista sueco Simon Stålenhag e que conta também com uma série do Amazon Prime. Mas vamos por partes.

Os anos 80 que nunca foram

O subtítulo do jogo aponta para a boa e velha nostalgia dos anos 80 que tem dominado a mídia nos últimos anos (e tem em Stranger Things o que parece ser seu representante máximo). Porém, você não vai encontrar aqui o néon cor-de-rosa que domina a estética relacionada a esse tipo de conteúdo. Ao invés disso, as ilustrações do livro (lindíssimas, falaremos delas) evocam um tom mais comedido, com muito do marrom e dos ângulos quadrados que realmente dominaram os 80 (para quem viveu e lembra daquela época).

Segundo a linha do tempo do cenário, houve um desenvolvimento tecnológico divergente do nosso mundo real, com a descoberta da magnetrina durante a guerra fria. Isso permitiu a criação de robôs autoequilibrados, veículos flutuantes e outras coisas que não vemos no nosso mundo. Somado a isso, claro, há a presença do Loop, uma espécie de acelerador de partículas responsável por gerar toda sorte de problemas para os personagens jogadores resolverem.

O livro conta com dois cenários básicos: um deles nas ilhas Mälaren, na Suécia, e outro em Boulder City, Nevada, Estados Unidos. Contudo, não é difícil reimaginar o Loop em qualquer cidade no interior do nosso Brazilzão.

Nos 80 também não tinha Waze. Todos estavam sujeitos a encontrar uma máquina estranha no meio do nada.

Sistema

Tales usa a Year Zero Engine e é bem simples: você rola vários d6, de acordo com seus atributos, perícias e equipamento e conta os sucessos. Caso não consiga os acertos necessários, você pode optar por forçar a rolagem em troca de uma condição, uma consequência ruim para seu personagem.

Os personagens de Tales são crianças entre 10 e 15 anos (com uma quantidade de pontos ligeiramente diferente dependendo da idade escolhida). Entre os arquétipos disponíveis temos Caipira, CDF, Esportista, Esquisitão/esquisitona, Encrenqueiro(a), Nerd de computação, Popular e Roqueiro(a). A distribuição de pontos é rápida, mas uma parte importante da criação das crianças é trazer para elas traços de personalidade marcantes. Coisas como Ítem Icônico, Música Favorita (dos anos 80, por favor), Problema e Orgulho ajudam a tornar seu personagem realmente único, e também têm implicações mecânicas relevantes.

Também é interessante o fato de que os personagens não morrem em Tales. O livro deixa bem claro que não é esse tipo de jogo proposto. Os personagens sofrem condições que podem se acumular até tirar a criança da ação (representado pela condição Abalado), mas nunca através da morte. Você cura todas as condições se passar uma cena com sua Âncora, um adulto de confiança do seu personagem.

“Saca só esse bagulho que eu achei aqui, Carlinho.”
“Porra, Jão, minha mãe vai me matar, cara!”

Visual

Acho legal dedicar uma parte da resenha para falar sobre isso: o livro é maravilhoso! Mesmo! Cada ilustração do Simon Stålenhag prende a atenção de forma que você gasta mais tempo admirando o trabalho artístico do que lendo propriamente. A diagramação traz um estilo que lembra uma instalação secreta da época da Guerra Fria. Além disso, o livro é impresso em papel pólen, muito agradável à leitura e que favorece o clima nostálgico do material.

“Caralho, onde foi que guardei minhas fitas cassete do ABBA?”

Por fim

Tales from the Loop é, certamente, um jogo diferenciado, com uma proposta única e de qualidade gráfica incrível. Se você está disposto a experimentar algo fora do eixo fantasia-terror-cyberpunk, vai encontrar uma proposta singular em Tales. Se você leu até aqui e ficou interessado, pode encontrá-lo à venda clicando no banner abaixo.

Confira também outras resenhas no Movimento RPG.

Bom jogo a todos!

Anciões – Jogando com Vampiros Antigos no V5

Uma das mudanças mais radicais do V5 (pelo menos do ponto de vista de alguns jogadores antigos) foi o limite imposto ao poder dos anciões. Nas versões antigas, vampiros antigos podiam chegar até o nível 10 das disciplinas, entre outras coisas. Vamos oferecer aqui algumas regras opcionais para quem quer trazer pro V5 um pouco do poder que os anciões tinham nas edições antigas, assim como fizemos com o Sabá.

Com quantos Neófitos se faz um Matusalém?

Antes de sair enfiando novos níveis nas disciplinas, vamos ver o que temos até aqui. Podemos criar personagens até a 10ª Geração, nascidos entre o final do século XVIII e a década de 1940. Ganhamos mais pontos de Vantagens e Defeitos, bem como 35 pontos de experiência. As tabelas de Geração e Potência de Sangue ajudam a determinar o poder inicial do personagem.

Esse texto foi inspirado numa matéria da Dragão Brasil da época da revista impressa, a DB 40. Esta imagem era a capa da matéria, e é algo que ficou na minha mente até hoje.

Com base nisso, vamos usar as regras do Mar do Tempo (pg. 137) para criar uma nova categoria um pouco diferente.

Ancião: Abraçada entre 1280 e 1780

  • 9ª, 8ª, 7ª ou 6ª Geração: Potência do Sangue Igual à inicial para geração + bônus de idade.
  • Cada jogador adiciona 2 pontos de Vantagens
  • Cada jogador adiciona 2 pontos de Defeitos
  • Cada jogador subtrai 1 de Humanidade
  • Cada jogador gasta uma quantidade de pontos de experiência igual ao bônus de idade..

Idade

A maior parte do poder do ancião vem com o conhecimento e experiências acumulados durante seus anos de atividade. Para cada 100 anos de atividade, um ancião recebe um bônus inicial de 35 pontos de experiência. Para cada 200 anos de atividade, recebe também um ponto adicional na sua Potência de Sangue e subtrai um ponto de sua Humanidade.

Perceba que atividade e existência são duas coisas separadas. Um vampiro que passe muitos anos em torpor não recebe esses benefícios.

Além disso, para cada 100 anos de atividade, o personagem passa por um Acontecimento. Um acontecimento é um pequeno resumo de algo importante que aconteceu na história do personagem em determinado período.

Para cada acontecimento, o personagem recebe um ponto de Vantagem e um ponto de Defeito, representando as conquistas alcançadas durante o período em questão, bem como eventuais inimigos feitos durante o caminho. Também pode adicionar um ponto em qualquer Habilidade e mais uma Especialização.

“Parabéns pra você. Nessa data querida…”
“Ah, que saco, todo século isso…”

Disciplinas

Confesse, você começou a ler este texto pensando nisso, não é?

Vampiros que atingem patamares de poder muito altos desenvolvem poderes únicos para suas disciplinas. Quando um vampiro atinge Potência de Sangue 6 ou mais, ele desenvolve usos especiais para o poder de seu sangue chamados de Poderes Avançados. A partir deste ponto, o personagem ganha um novo Poder Avançado cada vez que sua Potência de Sangue aumenta. Novos poderes também podem ser comprados por 30 pontos de experiência.

Perceba que Poderes Avançados podem combinar mais de uma disciplina. São realmente usos únicos para as disciplinas desenvolvidas por cada vampiro. Para criar seus poderes únicos, você pode utilizar os seguintes métodos:

Método 1: Alterar poderes já existentes

O primeiro método é partir de poderes já existentes e ampliá-los, alterando parâmetros como Duração, Alcance e Número de Alvos seguindo a tabela abaixo. O Narrador pode permitir que, para poderes de níveis mais baixos, mais de um parâmetro possa ser alterado dessa maneira,a razão de uma Ampliação para cada ponto de diferença (uma ampliação para poderes de nível 5, dois para poderes de nível 4, assim por diante).

Duração: Um turno -> Uma cena -> Uma noite -> Uma semana -> Um mês -> Um ano

Alcance: Um metro -> Dois metros -> Cinco metros -> Dez metros -> Trinta metros. Para poderes com alcances diferentes, como Um com a Terra, dobre o alcance para cada ampliação.

Número de Alvos: Um alvo -> Dois alvos -> Seis alvos -> Vinte alvos -> Todos os alvos em uma área.

Naturalmente, o narrador pode permitir que outros parâmetros sejam alterados também.

Exemplo: Rick, um Brujah ancião, decide criar uma versão ampliada do poder de Potência Força Direto da Fonte. Por ser um poder de nível 4, o narrador permite que Rick utilize duas ampliações. Rick decide que seu novo poder vai afetar não um, mas dois alvos e que ao invés de uma noite, eles estarão sob efeito desse poder durante uma semana. Rick decide chamar seu novo poder de Fúria do Sangue.

Alternativamente, Rick poderia pedir para ampliar outro parâmetro da disciplina, como o nível de Potência concedido pelo poder de depois (metade do nível da disciplina arredondado para baixo) para três.

Método 2: Adaptar poderes de edições antigas

Este é o método mais simples. Apenas pegue uma regra antiga e atualize alguns parâmetros para a nova edição, sempre levando em consideração que:

1: Os testes em V5 para a ativação de disciplinas são sempre feitos com Atributo + Disciplina (ao invés de Atributo + Habilidade).

2: Não existe mais a resistência passiva (usar uma característica como dificuldade de um teste, por exemplo).

Exemplo: Rick quer adaptar o poder de Presença nível 6 Paralyzing Glance. O teste para ativar a disciplina passa a ser Manipulação + Presença contra Autocontrole + Presença. Um sucesso deixa o alvo paralisado por um número de turnos igual seu nível em Presença, enquanto um sucesso crítico deixa o alvo paralisado até o fim da cena.

Método 3: Criar novos poderes

Bom, por que não? Pense no que você quer fazer e trabalhe nisso com seu narrador. Tente analisar quais são os parâmetros dos outros poderes e use-os como base para desenvolver suas próprias ideias.

Exemplo: Rick acredita que seu domínio em Celeridade é suficiente para permiti-lo quebrar algumas regras do espaço-tempo, permitindo olhar alguns instantes no passado e no futuro. O jogador e o narrador conversam e decidem pelo seguinte: Com um teste de Raciocínio + Rapidez, Rick pode ver um número de turnos no passado igual seu nível de Rapidez, ou distinguir os rumos mais prováveis para os acontecimentos do presente, ganhando automaticamente a iniciativa um número de turnos igual seu nível de Rapidez.

Agora… deixar os jogadores criarem seus próprios poderes de disciplinas ou não, é por sua conta e risco.

Por fim

Essas são apenas algumas regras opcionais simples que colocam um pouco do poder dos anciões nas mãos dos jogadores. Porém, jogar com anciões vai além disso. Estender seus domínios durante séculos, acumular influência na sociedade, bem como inimigos poderosos, é um combustível incrível para histórias. Espero que gostem dessas regras e usem-as em suas crônicas.

E não esqueça de conferir nosso post sobre o Monty Python’s Cocurricular Mediaeval Reenactment Programme.

Bom jogo a todos!

Monty Python’s Cocurricular Mediaeval Reenactment Programme

“Sou Arthur, filho de Uther Pendragon, do castelo de Camelot. Rei dos Bretões, vencedor dos Saxões e soberano de toda a Inglaterra. Nós cavalgamos a terra em toda sua extensão em busca de bravos cavaleiros para se juntarem a mim na corte de Camelot.”

“Vocês não cavalgaram! Isso não são cavalos, vocês só estão batendo cocos!”

Ninguém espera a Inquisição Espanhola!

Afinal, o que está acontecendo? Bom, Monty Python, em parceria com a Crowbar Creative e a Exalted Funeral, acaba de anunciar o Monty Python’s Cocurricular Mediaeval Reenactment Programme (algo como Programa Co-curricular de Reconstituição Medieval do Monty Python), que eles insistem em dizer que NÃO é um RPG.

O jogo será financiado através de um financiamento coletivo que deve começar em outubro. Há também um hotsite com algumas informações sobre o projeto.

Se você joga RPG há algum tempo, certamente já esbarrou em algum meme com cenas de algum filme dos Pythons.

Mos o que, raios, é Monty Python, afinal?

Monty Python é um grupo de comediantes britânicos que começou sua carreira ainda nos anos 60. Sua obra mais conhecida é, provavelmente, o filme Monty Python em Busca do Cálice Sagrado, um marco na comédia audiovisual no mundo inteiro e expoente do pós-modernismo na cultura pop (mas estou divagando aqui). Curiosamente, também foram os criadores do termo spam.

No catálogo dos Pythons também contam coisas como A Vida de Brian, O Sentido da Vida e a série de TV da BBC, Monty Python’s Flying Circus. que foi ao ar entre 1969 e 1974. Há outros além desses, bem como vários esquetes soltos nos YouTubes da vida (se vale alguma coisa, meus favoritos são O Futebol dos Filósofos e A Última Ceia de Michelângelo).

Se você souber onde olhar, há várias referências a Monty Python espalhadas pela cultura pop, como a famosa Granada Santa do Worms.

E o jogo?

O jogo é uma parceria entre a Crowbar Creative e a Exalted Funeral. A Crowbar Creative é responsável por coisas como Rackham Vale, um cenário para Old School Essentials inspirado no trabalho de Arthur Rackham (também lançado pela Exalted Funeral), Dr. Grordbort (um suplemento para D&D 5E inspirado no trabalho de Greg Broadmore) A Exalted Funeral é a editora responsável pela publicação de uma porrada de coisas, incluindo aí o próprio Old School Essentials, um retroclone de D&D/AD&D que pode ser baixado de graça no site deles (que traz de volta as regras de ataque baseadas em Thac0, pros saudosistas).

O hotsite tem algumas informações sobre o que esperar em termos de sistema de regras mas, como qualquer coisa do Monty Python, é difícil levar a sério tudo o que eles falam. Eles prometem um sistema “original e com regras simples”, guia para criação de aventuras, criação de personagens, bestiário, séquitos, NPCs, tabela para criação de “várias coisas”, aventuras prontas e um “mini-game baseado em gamão que envolve catapultas e animais da fazenda chamado Fetchez la Vache.”

O anúncio promete também vários níveis de apoio e brindes para apoiadores de primeiro dia, incluindo dados customizados, escudo de mestre (“Head of Light Entertainment screen”) e um conjunto de Fetchez la Vache com uma catapulta para dados.

Aquela velha piada do “a noite cai e causa 6d6 de dano em todo mundo” pode ser literal em um jogo baseado em Monty Python.

Por fim

Bom, eu gosto muito de Monty Python e também de RPG, então estou na torcida para que saia coisa boa daí. RPGs de comédia não são nenhuma novidade. Toon, Paranoia, Defensores de Tóquio (o original), Kobolds Ate My Baby, Malditos Goblins e Terra de Og são alguns exemplos disso. Espero realmente que o Monty Python’s Cocurricular Mediaeval Reenactment Programme traga novidade e frescor para nossas campanhas de RPG.

Aliás, esqueçam isso. Monty Python’s Cocurricular Mediaeval Reenactment Programme NÃO é um RPG! De forma alguma! Se você joga RPG, inclusive, deveria parar de ler imediatamente e passar longe de qualquer coisa relacionada a este livro.

Se você é um jogador de RPG, melhor ver qualquer outra coisa desse site, como a resenha de The Dark Eye. Certamente jogadores de RPG vão se interessar por isso.

Space Dragon – Guia de Criação de Mundos

Uma das coisas mais legais de campanhas de ficção científica vintage é a possibilidade de explorar planetas estranhos com lógica duvidosa. Uma das coisas mais legais dos RPGs oldschool são as tabelas de coisas aleatórias. Space Dragon conseguiu unir essas duas coisas de um jeito bem legal. Vamos falar um pouco sobre isso.

Flutuando em uma lata de estanho

As regras para criação de planetas começam na página 193. São várias tabelas que podem dar uma grande variedade de resultados. Vamos passar por cada uma delas enquanto criamos um planeta de exemplo.

T11-5: Superfícies

A primeira tabela descreve aspectos bem gerais, incluindo descrições da fauna, flora e temperatura padrão, porém, fauna e flora também podem ser jogadas separadamente depois. Vamos usar as duas: a desta tabela será uma visão geral do planeta, enquanto a próxima será a região específica onde a tripulação irá pousar.

Rolamos 4 no nosso d10. Isso nos dá um planeta com superfície vulcânica, com répteis habitando o lugar, líquens como opção de alimentação padrão para estas criaturas e temperatura altíssima.

Outro método para criar mundos alienígenas legais é tentar descrever qualquer ilustração do Roger Dean.

T11-6: Atmosfera

A atmosfera pode ser ou não respirável e gerar efeitos colaterais prejudiciais para uma população despreparada, principalmente se eles foram obrigados a fazer um pouso forçado. É importante lembrar que, mesmo se rolarmos aqui uma atmosfera imprópria,  precisamos encontrar uma justificativa para a presença das criaturas que já estão no nosso planeta, como bolsões de ar respirável, cavernas habitáveis ou algo assim.

Com resultado 1 em 1d10, tivemos a sorte (ou melhor: os jogadores tiveram) de ter uma atmosfera padrão, com ar respirável. Também não precisamos nos desdobrar para conseguir explicar resultados muito bizarros ou discrepantes, que sempre pode ser complicado se estivermos fazendo isso no meio da sessão.

T11-7: Fauna

A tabela T11-5 nos deu uma visão geral do nosso planeta, mas aqui vamos conseguir algo mais específico para a região onde a nave dos jogadores pousou. Isso pode ajudar a trazer diversidade para o planeta, principalmente se você caprichar na descrição.

Dessa vez, os dados nos trolam, e com resultado 1 em 1d6, temos um maravilhoso grupo de mamíferos terrestres! Em um planeta vulcânico extremamente quente! Bom… no nosso planeta, camelos e jerboas são exemplos de mamíferos que conseguem tolerar boas quantidades de calor. Então, teremos aqui um grupo de ratinhos parecidos com jerboas que são implacavelmente caçados pelos lagartos grandões que dominam o lugar.

T11-8: Flora

A flora padrão do planeta são líquens, mas, como definido anteriormente, vamos usar essa tabela para tentar conseguir alguma diversidade para nosso planeta, com biomas diferenciados para a região onde o grupo de personagens se encontra. Novamente, capriche na descrição.

E, claro, os dados nos trolam novamente com um 6. Flora predominante inexistente. Já definimos que os lagartões caçam os ratinhos, mas os ratinhos comem o quê? Vamos usar nossa criatividade e poder de mestre para botar mais um passo nessa cadeia alimentar: Há vários insetos que se alimentam dos líquens que crescem na superfície rochosa do nosso planeta vulcânico. Esses insetos vão servir de alimento para nossos ratinhos e ajudar a dar uma diversidade para esse ecossistema bizarro.

Até agora, nosso planeta é praticamente um cenário de tokusatsu.

T11-9: Sociedade

A cereja do bolo: aqui definimos os habitantes inteligentes que nossos aventureiros espaciais vão encontrar. A tabela não nos dá raças ou espécies humanoides, apenas a forma básica de organização social. Podemos escolher uma raça alienígena que combina com as características do planeta que criamos até agora.

Naturalmente, homens-lagarto combinam bem com o cenário. Então, os repto-sapiens da página 220 serão nossa raça básica. Claro que poderíamos usar qualquer outra ou até inventar uma. Com 1 em 1d8, descobrimos que eles se organizam em uma monarquia. Teremos um grande rei-lagarto no centro da sociedade. Essa é a parte mais legal de inventar, e possivelmente é onde os PJs mais vão gastar seu tempo.

Nosso planeta terá uma monarquia religiosa, onde um sacerdote serve de porta voz para um lagarto gigante que serve como rei. O lagarto gigante possui mente e vontade próprias, mas se comunica apenas com o sacerdote.

Os outros homens e mulheres-lagarto trabalham cultivando líquen e criando répteis e outros animais que servem como a base do sustento da sociedade. Eles conseguem minerar e forjar metal, mas a base de sua tecnologia é a rocha vulcânica, que aprenderam a moldar em grandes estruturas.

Nome e Descrição

O livro sugere um nome pseudocientífico baseado na nossa rolagem: HL-41161. Por outro lado, os homens-lagarto que habitam o lugar certamente possuem língua própria e nomes mais naturais para as coisas que estão ao seu redor. Esse ponto se resume a aparar as arestas usando seu poder de mestre e preencher os detalhes que faltam. Você também pode usar o que foi sorteado até aqui para criar uma tabela de encontros aleatórios. Algumas sugestões que estão no livro básico: aranha gigante, crocossauro (com alguma mudança de descrição para adaptar ao ambiente rochoso), dragão venusiano, formigácida, gigantossauro, homem-lagarto (para grupos de bandidos errantes), lagarto do deserto e monstro de lava.

Vocês finalmente chegam ao planeta HL-41161, também conhecido como Planeta Arktar por seus habitantes. Segundo o computador de bordo, o rei Arktar é um lagarto-gigante centenário que só se comunica com seu sacerdote, Okdar. Mesmo assim, a população confia nos religiosos e segue sua vida em paz. O ambiente vulcânico é hostil, por isso a maioria dos repto-sapiens vive em cavernas, onde constroem incríveis cidades usando rocha vulcânica, que aprenderam a trabalhar enquanto ainda está quente, criando uma arquitetura única. Eles sobem à superfície apenas para trabalhar em suas fazendas durante a noite, quando o clima é mais ameno. Eles criam grandes lagartos para tração animal, bem como mamíferos menores e insetos para servir de comida. 

Fun fact: eu uso o rolador de dados do Google enquanto escrevo esses tutoriais.
Fiz a mesma coisa no Guia de Criação de Personagens.

Por fim

Criar mundos únicos para Space Dragon parece desafiador a princípio, mas é mais simples e divertido do que parece. Algumas referências científicas sem dúvida podem ajudar, mas não precisa ser uma grande preocupação, já que a maior referência são aqueles ficções científicas meio galhofentas dos anos 50 e 60. Se você leu até aqui e ainda não sabe do que estamos falando, veja a página oficial ou nossa resenha.

Bom jogo a todos!

Carniçais – Dicas de Vampiro: A Máscara

Os mortais que servem aos vampiros são muitas vezes deixados de lado por jogadores e narradores. Porém, são seres com um potencial imenso para sua crônica. Vamos falar um pouco mais sobre eles hoje.

O que são Carniçais

Carniçais são mortais que, ao consumir sangue vampírico, desenvolvem poderes menores. Alguns chegam a possuir um ou outro poder das disciplinas cainitas, mas todos têm em comum uma resistência sobrenatural (ainda que menor que a dos vampiros) e a interrupção do envelhecimento.

Os poderes dos carniçais só funcionam enquanto ele tiver algum resquício de sangue vampírico em seu organismo. Por isso, a grande maioria dos carniçais está diretamente ligada a um vampiro específico, geralmente conhecido como domitor. Isso quer dizer que quase todo carniçal será submisso ao laço de sangue com alguém (existem exceções, falaremos delas).

Existem inúmeros tipos de carniçais, talvez mais até do que de vampiros (que costumam gravitar em torno dos estereótipos de clã). Vamos dividi-los em três grandes tipos básicos.

Tenho certeza que vários narradores que estão lendo já fizeram crônicas inteiras em que todos os carniçais eram seguranças ou motoristas. Não se preocupe, vamos dar um jeito nisso!

Candidatos ao abraço

Às vezes os membros gostam de “testar” candidatos ao abraço por um tempo antes de, de fato, criar um novo vampiro. Isso tende a ser mais comum em cidades onde a restrição ao abraço é enfatizada, mas também pode variar de clã para clã e de indivíduo para indivíduo.

Esse tipo de carniçal tende a absorver muito do estereótipo do clã, e às vezes até frequentar a sociedade vampírica ao lado de seu domitor. Não é raro ver casos onde um membro sente algo por um mortal, seja paixão, afinidade ou mera curiosidade, e acaba trazendo-o para seu séquito de carniçais, aliados e servos.

Exemplos clássicos desse tipo de aproximação são: o carniçal artista que um toreador mecenas usa para impressionar seus pares. Um jovem empresário e político que está na lista do suborno de uma importante ventrue, mas que mostra-se cada vez mais ousado e confiável. Um lutador de boxe clandestino que trabalha para seu contratante Brujah. O enfermeiro do sanatório que secretamente trabalha para a médica malkaviana. A moradora de rua que conta tudo para o xerife nosferatu. A médica que desvia material de laboratório (e até algumas coisas menos ortodoxas) para a Tzimisce poder fazer seus experimentos tranquilamente. E a lista segue.

Servos

Nem todos os carniçais são recrutados por afinidade. Alguns são apenas peças no tabuleiro de uma disputa muito maior. São o chão de fábrica que faz, na prática, a sociedade cainita funcionar.

Esse tipo de carniçal se distancia bastante dos estereótipos de clã, e também não gozam dos “privilégios” do tipo anterior. Em geral, não possuem uma relação de intimidade com seus domitores, e a confiança só vai até os limites do laço de sangue que os mantém unidos.

Geralmente toda a equipe de apoio de um membro entra nessa categoria: seguranças, motoristas, funcionários e até políticos, policiais, jornalistas, criminosos, bonecos-de-sangue e outras coisas assim. Porém, perceba que os carniçais dessa categoria cruzam as fronteiras do que seria esperado de determinado clã. Um toreador pode muito bem manter como carniçais uma mafiosa brutamontes para protegê-lo, um militar linha-dura com cargo na câmara de vereadores local e um ativista que mantém uma ONG próximo ao domínio da primigênie nosferatu, se isso for importante para os planos dele.

O fato é que criar esse tipo de carniçal dá margem para personagens e NPCs muito diferentes do esperado. Um mortal influente em qualquer esfera da sociedade pode acabar enredado na disputa entre clãs completamente antagônicos. É a chance de criar um mortal bacana e cheio de personalidade, e depois dar a ele aquele “temperinho” sobrenatural.

“Ou móveis. Meu amigo Tzimisce disse que carniçais dão ótimos móveis.”

Independentes

Este é o tipo mais raro de carniçal, e também o que mais luta para manter sua existência como tal. Este carniçal provavelmente começou em uma das duas categorias anteriores, mas encontrou sua liberdade de alguma forma. Ou negociando com seu domitor, ou traindo-o, ou qualquer outra possibilidade.

Carniçais independentes são considerados perigosos pela sociedade cainita, principalmente pela Camarilla (embora alguns Anarch respeitem tais seres). São mortais com conhecimento sobre sociedade cainita com a possibilidade de agirem durante o dia livremente. Praticamente quebras de máscara ambulantes.

Aliás, vale dizer que, pela fria letra da lei, TODO carniçal é uma quebra de máscara, uma vez que eles ainda são mortais. Porém, a verdade é que isso é simplesmente ignorado pela sociedade vampírica em favor da comodidade de construir alianças dentro da sociedade humana.

Carniçais independentes ainda precisam continuar consumindo sangue vampírico, então precisam se relacionar com a sociedade vampírica de uma forma ou outra. Existe o clássico tropo do carniçal independente que caça vampiros, usado na nossa crônica Temos Medo e Estamos Sozinhos. Mas claro que há outras possibilidades. Carniçais que atuam como mercenários, vendendo seus serviços a qualquer vampiro que possa pagar com um pouco de dinheiro e sangue, podem render personagens especialistas muito interessantes, verdadeiros soldados de elite para povoar sua crônica. Em uma crônica que se passa na antiguidade, por exemplo, já criei uma sacerdotisa independente que servia a comunidade cainita local, selecionando e treinando mortais para se tornarem carniçais de outros vampiros.

Carniçais independentes também não estão subordinados à Camarilla, ao Sabá ou aos Anarch, permitindo-os transitar livremente entre todas as camadas da sociedade vampírica (limitados apenas pela sua própria moral). Percebe por que esse tipo de carniçal é considerado perigoso?

“Vai demorar muito ainda? Tenho um outro freela às dez…”

Por fim

É fácil, ao jogar Vampiro, focar demais na sociedade cainita e esquecer como os mortais são afetados pelos jogos de poder que acontecem nas sombras. Por outro lado, há uma camada inteira de potenciais personagens extremamente ricos e complexos transitando logo abaixo dos olhos e presas imortais que costumam ser os protagonistas da noite. Pensar neles um pouco mais pode enriquecer muito sua crônica.

E não se esqueça de curtir nosso novo podcast, o Quimera de Aventuras.

Bom jogo a todos!

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