Fuga de Lenórienn Parte 01 – A Quinta Estação

Fuga de Lenorienn Parte 01 é a primeira parte do segundo capítulo do romance “fan made” A Quinta Estação, por Oghan e publicado no site do Movimento RPG. Para acompanhar a série completa, entre neste link. Caso você goste desta história compre as obras do autor clicando aqui clicando aqui! Caso você não tenha lido a primeira parte do conto, clique aqui!

Sinopse

O Exército do Reinado triunfou! Liderados por Sir Orion Drake, a coalisão de soldados, heróis e mercenários venceu onde era impossível vencer. Mas, nem só a Tormenta é uma ameaça para este mundo: A Aliança Negra, o Império de Tapista e muitos outros problemas precisam de heróis para enfrentá-los.

Nesta época de transformações, surge a Confraria dos Redentores, uma companhia mercenária especializada em proteger os mais fracos e impedir que o mal se espalhe.

Nesta nova parte da história, acompanhamos a luta de uma família élfica fugindo da ameaça da Aliança Negra.

Sobre o autor

Oghan é escritor de afrofuturismo e primeiro autor de steapunk do Brasil com seu romance O Baronato de Shoah, foi vencedor do Wattys 2018, e é autor de Os Oradores dos Sonhos, além de publicado na Revista Nigeriana Omenana Magazine e na MV Media nos Estados Unidos; também tem seu nome gravado no legado de Arton através de um conto em Crônicas de Tormenta volume 2 e seu sonho é escrever o primeiro romance focado na Grande Savana.


Fuga de Lenórienn Parte 01

Em outro lugar.

Em outro tempo.

— E, por último, eu acuso Tealandrane de causar pânico desnecessário em nossa comunidade — a voz de Marlevaur ecoou pelo salão da justiça, onde o julgamento era feito.

O elfo que conduzia o julgamento de um de seus melhores amigos vestia uma túnica negra com detalhes em dourado e vermelho que pouco combinava com a típica delicadeza de seu povo. A severidade no olhar beirava a fúria e conforme ele denunciava os crimes de Tealandrane, ficava mais óbvio que não havia crime, mas medo do acusado.

Taelandrane, ou simplesmente Tae, não conseguia culpar os irmãos. Lenórienn, seu reino, era atacado constantemente pela Aliança Negra, a coalizão de goblins, orcs, bugbears, hobgoblins e liderada por Thwor Ironfist, que segundo a lenda era o emissário de Ragnar, o deus da morte.

Isolados das nações por um arrogante tratado de paz, Lenórienn só descobriu que o continente havia caído nas mãos das criaturas quando já era tarde demais. Os elfos resistiam, desacreditando nas habilidades de seus inimigos e fazendo pouco caso das histórias. Batedores tinham sido enviados aos reinos humanos, mas nenhum retornara; os sacerdotes tinham invocado entidades para dar-lhes pistas do que fazer, mas as forças ancestrais não respondiam suas perguntas. Até mesmo grandes figuras tinham intervido na situação, como o sacerdote Razlen Greenleaf, mas nada convenceria os elfos que eles corriam um risco.
Até que o golpe final foi dado, a princesa Tanya foi sequestrada por Thwor Ironfist de dentro do palácio do regente Khilanas e ofertada à Aliança Negra. Isto havia derrubado o moral dos elfos e só os mais velhos continuavam com sua insistência em se manterem isolados.

Todos, exceto Taelandrane, que enviara cartas a seus amigos de outros reinos e pedira sua ajuda para sair da cidade. Sem respostas, organizara uma pequena rebelião dentro do palácio, que ficou conhecida como Inconfidência Élfica, mas não teve sucesso por que uma parte de seu grupo o entregou às autoridades por medo ou receio de desagradar a deusa.

— Thwor Ironfist vai atacar de novo e nós estamos despreparados… — Taelandrane fez um gesto abarcando o salão inteiro, assustando os guardas ao ponto de eles sacarem as espadas — Não digam que não estão com medos, nós podemos sentir nas ruas, nas árvores e até no ar o quanto esta nação treme perante o novo inimigo.

— Você blasfema contra nosso estilo de vida, Taelandrane, precisa colocar a cabeça no lugar — Qyne, um dos elfos do conselho, retrucou em voz baixa — Nossa cultura é muito mais forte do que sua fé abalada pode entender.

— Enquanto discutíamos sobre as árvores que plantaríamos nas fronteiras a Aliança Negra sequestrava a princesa — Taelandrane fechou os punhos de raiva e a magia escapou por seus olhos em uma onda vermelha e azul incandescente. O mago era conhecido por seu aspecto selvagem e impulsio, boa parte dos presentes sabia que ele estava ali por uma questão de boa vontade e poderia vencer os guardas sem esforço algum. Isto e sua postura resoluta em fazer valer sua opinião eram o pouco que lhe garantiam a confiança e respeito de seus pares.

— Chega! — Marlevaur ergueu a voz, irritado — Nós ouvimos seus planos e buscamos pistas na floresta, só encontramos alguns humanos e suas histórias absurdas de máquinas de guerra capazes de explodir castelos.

Um riso geral escapou dos elfos, mas havia um leve toque de apreensão nele.

— Só a ideia de que um bando de goblinóides seria capaz de nos derrotar já deveria ser considerada crime obsceno. — Qyne, o sacerdote-mestre, emendou — Você profana o nome da deusa com sua desconfiança, Taelandrane.

— Onde ela está, senão envolta com seus súditos apreciando a si mesa, ao invés de protegendo os batedores que estão sumindo na floresta? — Taelandrane dispersou a magia ao seu redor e percebeu que havia ido longe demais.

— Este julgamento acabou — Qyne se levantou do trono de juiz — Ezrataelandrane, o júri declara a ação procedente e considera o réu culpado de menosprezar a cultura élfica milenar e ignorar a honra de seus antepassados, humilhando e ridicularizando nossa fé e nação.

— O que? — Tae quase engasgou.

— Sendo assim, considerado por unanimidade um instrumento voluntário do inimigo estrangeiro. — Qyne bateu o martelo — Caso encerrado.

Fuga de Lenorienn Parte 01

Autor: Oghan N’Thanda.
Revisor: Isabel Comarella.
Adaptação do Post: Douglas Quadros.
Ilustrador da Capa: Theo S. Martins.

 

O Presente das Fadas Parte 03 – A Quinta Estação

O Presente das Fadas Parte 03 é última das três partes do primeiro capítulo do romance “fan made” A Quinta Estação, por Oghan e publicado no site do Movimento RPG. Para acompanhar a série completa, entre neste link. Caso você goste desta história compre as obras do autor clicando aqui clicando aqui! Caso você não tenha lido a primeira parte do conto, clique aqui!

Sinopse

O Exército do Reinado triunfou! Liderados por Sir Orion Drake, a coalisão de soldados, heróis e mercenários venceu onde era impossível vencer. Mas, nem só a Tormenta é uma ameaça para este mundo: A Aliança Negra, o Império de Tapista e muitos outros problemas precisam de heróis para enfrentá-los.

Nesta época de transformações, surge a Confraria dos Redentores, uma companhia mercenária especializada em proteger os mais fracos e impedir que o mal se espalhe.

Mas, o que acontece quando o mal parte de dentro da própria Confraria?

Sobre o autor

Oghan é escritor de afrofuturismo e primeiro autor de steapunk do Brasil com seu romance O Baronato de Shoah, foi vencedor do Wattys 2018, e é autor de Os Oradores dos Sonhos, além de publicado na Revista Nigeriana Omenana Magazine e na MV Media nos Estados Unidos; também tem seu nome gravado no legado de Arton através de um conto em Crônicas de Tormenta volume 2 e seu sonho é escrever o primeiro romance focado na Grande Savana.


O Presente das Fadas Parte 03

Girou nos calcanhares, irritada com aquela responsabilidade toda. Quando o bebê crescia em sua árvore, dentro da seiva e de seu útero, ela não precisava parar seus afazeres para cuidar dele. Podia nadar, brincar e se embelezar à vontade. Faltava-lhe entender o porquê de tantas fêmeas por aí gostarem de ser mães e largarem a própria vida para cuidar daqueles ranhentos.

O vento estava mais forte do outro lado do lago, Lylia sabia o que isso significava: sílfides, os espíritos do vento. Criaturas mágicas que viviam nas brisas e nos céus. Claro que por serem dominadoras de um elemento tão caótico e livre, as sílfides eram um pouco mais malucas que suas contrapartes.

Encontrou com Shaela, a sílfide, após uma caminhada de quase meia hora. Ela estava nua, exceto por uma espécie de túnica transparente que não escondia nenhum detalhe de seu corpo magro. Seus cabelos eram curtos e revoltos, combinando com os olhos cinzentos cor de princípio de tempestade.

Shaela fora a única das seis Rainhas Elementais que se relacionara com um Dragão-Rei. Lylia mentira para Meriele quando dissera que se lembrava do que havia acontecido por causa deste relacionamento. Era mais do que óbvio que as duas raças não se misturavam por algum medo divino das crias, mas isso não vinha ao caso.

Lylia começou a falar, mas Shaela avançou e tapou sua boca com a mão. Lylia sentia faíscas de relâmpago atingindo seus lábios e umidade ao seu redor. Queria abraça-la, mas Shaela jamais se permitiria ser tocada por criaturas da terra.

— O nome dele era Hydora… e minha punição é jamais tocar o chão de novo… — Shaela criou uma miniatura de dragão com os raios entre seus dedos, então a apagou com um sopro. — Vim dar um presente para o seu filho, mas um presente igual aos ventos.

— Caótico, inconstante, louco e frio? — Lylia se incomodou com as palavras da amiga. Era o mesmo que esperar um discurso coerente da chuva de inverno ou uma anedota de uma fogueira.

— Ele receberá as graças de um dos deuses — Shaela voou para longe, seu elemento desapareceu entre nuvens. — Ou não. Mas talvez receba mesmo, só para entender o quanto eles são cruéis e bondosos.
Lylia observava se sentindo um pouco idiota enquanto Shaela desaparecia entre as copas das árvores. Deveria ter esperado por aquilo, mas nunca se cansava de se surpreender com as sílfides. Fez uma anotação mental “esperar o pior dos ventos, sempre”.

Havia uma fogueira em uma clareira. Em meio às chamas uma salamandra aproveitava o calor e se espreguiçava. Ao ver Lylia, a salamandra se ajeitou com algum respeito e apontou o dedo para o bebê.

— Seu filho terá gripe — tanto a salamandra quanto Lyla entreolharam-se, constrangidas com aquele presente estúpido. — Não, quero dizer… Seu filho será ateu!

— Como que alguém é ateu em um mundo onde os deuses descem para tomar chá na sua casa? — Lylia protestou. — Quero um presente melhor, vamos logo com isso!

— Vocês fadas são muito confusas. — A salamandra se colocou de pé na fogueira, agitou a cauda. — Que tal uma arma?

— Arma é interessante, mas eu queria algo menos clichê. — Lylia coçou atrás da orelha — Ele já ganhou nome, amores e a graça de um dos deuses.

— Ele vai ser um herói de verdade! — a salamandra cuspiu uma pequena bola de fogo — Ele terá surtos de heroísmo quando precisar ajudar alguém que precise muito dele!

— Que coisa mais besta, qualquer herói pode fazer isso — Lylia bocejou. — Um personagem principal de histórias não pode ser só isso.

A salamandra bufou, entediada com a falta de visão da dríade.

— Certo, então ele vai ser um aventureiro nato. Tá bom pra você? — o tom da salamandra dava a entender que a conversa tinha terminado.

— Que arma você queria dar? — Lylia percebeu que a salamandra estava pouco disposta a colaborar.

— Duas espadas! — a salamandra abriu os braços e atacou o ar — Duas magníficas espadas que eu achei por ai, uma de gelo, outra de fogo…

— Pode parar aí, eu conheço essas armas de algum lugar… —Lylia coçou o queixo – Sua trapaceira, estas armas já estiveram em outra história!

— Tá bom, tá bom! — a salamandra caminhou até um galho caído e o segurou com as duas mãos — Seu filho terá a habilidade de criar uma espada a partir da natureza nativa que o rodeia…

— Tá bom, aceito — Lylia partiu com o filho, tentando se lembrar, exatamente, o que “nativa” significava. Ela esperava que não fosse aquela coisa que ficava por cima do leite quando fervia.

Faltava o último presente, podia ser um clichê, mas podia ser algo único. Pedir presentes a uma bruxa resultaria no que era necessário para Khanta se tornar o maior herói que Arton já vira. Lylia mal podia se conter, acelerando o passo e mal falando com o filho. Talvez a bruxa lhe desse um grande inimigo, talvez uma missão impossível de realizar, mas, mesmo que ele quase morresse, era obrigatório vencer no final.

— Por que o bem sempre vence no final, viu? — Lylia parou na entrada da cabana da bruxa, uma estrutura que ficava no meio do pântano e bloqueada por duas gigantescas árvores mortas. Sentindo um calafrio, abriu a porta com cuidado para não incomodar a irmã mais velha. O menor deslize e seu presente poderia ser uma verruga na ponta do nariz.

— Se o bem não venceu, é por que a história não acabou — ela completou o raciocínio.

Por dentro a cabana da bruxa era como as outras, ornamentada com animais empalhados, esqueletos de pássaros e esquilos; por cima da porta de entrada havia um enorme crânio de alce e a lareira sempre queimava os restos de lenha da noite anterior. Cortinas finas cobriam as janelas circulares, o aroma de ervas e incensos se espalhava pelo cômodo único e a cadeira de balanço sempre balançava, mesmo que ninguém estivesse sobre ela.

— Seu filho será corajoso — Lylia ouviu a voz da bruxa, mas não sabia de onde ela vinha. A semelhança com as histórias dos bardos era tão empolgante que ela se deixou levar pela situação.

— Seu filho será bonito — a voz continuou. Lylia parou ao lado do caldeirão e viu um homem negro e forte, empunhando duas espadas feitas de galhos de árvores.

— Isso é tudo? Obrigada — Lylia voltou-se para a porta, recuou assustada ao se ver de frente com a Rainha Trevas.

Caliadore era velha por que as histórias exigiam que assim o fosse. Ela tinha a mesma idade das outras Rainhas Elementais de Caed Dhu e podia rejuvenescer quando quisesse. Ela não era má, apenas cumpria o papel que lhe fora imposto pelo arquétipo das Trevas, assim como Tenebra, a deusa da noite.

Lylia tinha a impressão que Caliadore gostava de ser uma anciã recurvada e com um olho de vidro, apesar de, em certas ocasiões, apresentar-se como uma mulher jovem e curvilínea.

— Mais alguma coisa? — a petulância de Lylia era incontrolável, principalmente confrontando a irmã mais velha frente-a-frente. As energias das duas eram opostas, quase inimigas, ainda que se completassem.

A bruxa ergueu o rosto, olhou para Khanta, depois para Lylia e falou.

— E seu filho não será o personagem principal desta história.

O Presente das Fadas Parte 03

Autor: Oghan N’Thanda.
Revisor: Isabel Comarella.
Adaptação do Post: Douglas Quadros.
Ilustrador da Capa: Theo S. Martins.

 

O Presente das Fadas Parte 02 – A Quinta Estação

O Presente das Fadas Parte 02 é uma das três partes do primeiro capítulo do romance “fan made” A Quinta Estação, por Oghan e publicado no site do Movimento RPG. Para acompanhar a série completa, entre neste link. Caso você goste desta história compre as obras do autor clicando aqui clicando aqui! Caso você não tenha lido a primeira parte do conto, clique aqui!

Sinopse

O Exército do Reinado triunfou! Liderados por Sir Orion Drake, a coalisão de soldados, heróis e mercenários venceu onde era impossível vencer. Mas, nem só a Tormenta é uma ameaça para este mundo: A Aliança Negra, o Império de Tapista e muitos outros problemas precisam de heróis para enfrentá-los.

Nesta época de transformações, surge a Confraria dos Redentores, uma companhia mercenária especializada em proteger os mais fracos e impedir que o mal se espalhe.

Mas, o que acontece quando o mal parte de dentro da própria Confraria?

Sobre o autor

Oghan é escritor de afrofuturismo e primeiro autor de steapunk do Brasil com seu romance O Baronato de Shoah, foi vencedor do Wattys 2018, e é autor de Os Oradores dos Sonhos, além de publicado na Revista Nigeriana Omenana Magazine e na MV Media nos Estados Unidos; também tem seu nome gravado no legado de Arton através de um conto em Crônicas de Tormenta volume 2 e seu sonho é escrever o primeiro romance focado na Grande Savana.


O Presente das Fadas Parte 02

Parou na beirada de um lago, onde sentiu a vida pulsar e os líquidos de seu corpo correrem com mais velocidade. O coração palpitou com a ansiedade e ela gritou pela irmã das águas.

— Eu sei que você está aí, Meriele! — as ninfas eram como as dríades, com a diferença que suas almas ficavam presas a lagos ou rios, ao invés de árvores. — Pare de fingir que foi passear!

— Não quero comprar nada! — carrancudo como só um lago poderia ser, Meriele — Muito menos doações para duendes abandonados!

— Saia daí ou eu vou ferver você, sua ninfa preconceituosa! — Lylia passou os dedos pelo lago, esticou o bebê para frente e o deixou cair. Ao invés de afundar e se afogar ele rodopiou na água e respirou como se ela fosse seu ambiente natural.

Meriele emergiu ao lado do infante, erguendo-o em uma coluna de seu elemento, o bebê esticou os bracinhos quando ela fez menção de pegá-lo. Abraçaram-se, a ninfa passou a mão em seus cabelos, gostara dele, apesar do excesso de superfície em seus modos.

Ao invés da alegria de Tyro ou da inocência de Lylia, Meriele transbordava sensualidade, as curvas de seu corpo atraíam humanos desde o princípio dos tempos, ela fora adorada por muitos povos e quase se casara com o Grande Oceano. Cortejada por marinheiros, estivadores e matronas nas beiras dos rios, acostumara-se a ser amada.

— Mas não é que vocês, das terras verdes e duras, até que fizeram um bebê bonitinho? — Os cabelos de Meriele eram de um tom azul-escuro que lembrava uma tempestade em alto-mar, os olhos eram profundos como rios antigos, a boca lembrava chuvisco, era doce, pacata, delicada.

Certa vez, por inveja ou ciúmes, Tyro chamara Meriele de “aquela gorda”, Lylia nunca entendera como isso poderia ser um insulto, o corpo de Meriele a fazia pensar em noites de amor e abundância. Os seis irmãos elementais levaram o caso ao tribunal da Floresta Negra, e a discussão foi encerrada com um único e frio “Calem a boca” proferido por Trevas, a mais velha.

— Eu tive de desfazer a sua alcova — parecia um lamento, Meriele beijou o sobrinho na testa — Achei que você não voltaria mais depois de sua última história.

— Foi culpa minha, eu devia ter avisado que retornaria, mas não tinha certeza que as outras iriam me querer aqui… Não é todo mundo que aceita muito bem o romance entre dríade e… — Lylia interrompeu a si mesma — Mas eu devo confessar que esperava um pouco mais de paciência da sua parte. Só fiquei duas luas fora!
— Seu amante era mais era um rei — Meriele deu de ombros — E você conseguiu ver através do Rio do Tempo o que ele faria no futuro.

— Quem sabe não criamos um espacinho para o bebê? — A verdade era que Lylia estava enjoada da alcova e queria construir outra, mas tinha preguiça de gastar tempo e energia reformando o que Meriele lhe fizera. — Humanos demoram muito para crescer?

— Um bocado, mas não tanto quanto elfos e eu não faço ideia do quanto essa coisinha vai viver — Meriele mantinha a criança em cima de uma onda que ela mesma criara, abaixando e levantando a maré para diverti-la.

— Dá azar não batizar os recém-nascidos, dizem que os trolls surgem à noite para roubá-los — Meriele sabia que era mentira, os trolls eram muito piores do que se imaginava — trolls são devoradores de carne humana e colocam os bebês deles no lugar do seu.

— Como você sabia que o pai dele era um rei? — Lylia, desconfiada, tentou pegar o filho de volta, mas Meriele o erguera alto demais.

— Até mesmo o pântano mais imundo possui água, e onde houver água, estarei — Meriele recitou — Você veio em busca de um presente para ele?

— Sim, é o que vim buscar — um pouco angustiada, Lylia pensou em usar sua mágica para resgatar o filho, mesmo tendo certeza de que a irmã jamais o machucaria.

— Ele irá amar, mais do que os humanos são capazes de conseguir, menos do que os deuses são capazes de entender. — Meriele desceu a onda onde Khanta estava sentado. — Seu amor será tempestuoso, conflitante e intenso, mas será verdadeiro.

— O amor é uma arma – Lylia segurou no braço da irmã, deixando que sereias levassem o filho para o meio do lago. As duas começaram a andar por cima da água para chegar ao outro lado da floresta, embaixo da superfície elas podiam ver baleias, golfinhos, tubarões e um kraken.

— O amor pode ser uma arma, ou um escudo, tudo depende de como você o carrega — Meriele retrucou, parou nos limites do lago, menos de cinco metros adiante a floresta recomeçava. — Você sabe a origem do sangue do pai dele?

— Sckharshantallas, o dragão vermelho — Lylia sussurrou no ouvido de Meriele, que fingiu surpresa.

— Mentirosa — a ninfa das águas sorriu — Rainhas Elementais não se misturam com Dragões-Reis.

A frase teve um peso muito maior na conversa do que elas esperavam. Houve um silêncio incômodo e pesado entre elas, uma parede de segredos colocada entre duas entidades ancestrais e tão velhas quanto os próprios dragões.

— Foi só uma brincadeira, eu jamais me deitaria com Sckhar! — Lylia quebrou o silêncio com mais uma frase cheia de significados que a irmã não conseguia desvendar.

— Acho bom, Lylia — Meriele retrucou — Até mesmo a Rainha da Luz deve ter algum bom-senso de vez em quando.

— O pai do meu filho é um caçador da Grande Savana. — Lylia recolheu o bebê. — Ele procurava um presente para sua tribo.

— Eu gostei dos seus presentes, Meriele – Lylia não queria que o filho sofresse, mas o amor era uma constante na vida dos mortais. Sua prole transitaria entre os dois mundos e superaria o presente-maldição. — Que o amor seja uma arma e um escudo.

Lylia estava do outro lado do lago, olhou para trás e viu Tyro e Meriele conversando. Queria se juntar a eles e ir brincar na mata também, mas tinha responsabilidades a cumprir, precisava presentear o filho para que ele crescesse e se tornasse um herói.

O Presente das Fadas Parte 02

Autor: Oghan N’Thanda.
Revisor: Isabel Comarella.
Adaptação do Post: Douglas Quadros.
Ilustrador da Capa: Theo S. Martins.

 

O Presente das Fadas Parte 01 – A Quinta Estação

O Presente das Fadas Parte 01 é uma das três partes do primeiro capítulo do romance “fan made” A Quinta Estação, por Oghan e publicado no site do Movimento RPG. Para acompanhar a série completa, entre neste link. Caso você goste desta história compre as obras do autor clicando aqui clicando aqui!

Sinopse

O Exército do Reinado triunfou! Liderados por Sir Orion Drake, a coalisão de soldados, heróis e mercenários venceu onde era impossível vencer. Mas, nem só a Tormenta é uma ameaça para este mundo: A Aliança Negra, o Império de Tapista e muitos outros problemas precisam de heróis para enfrentá-los.

Nesta época de transformações, surge a Confraria dos Redentores, uma companhia mercenária especializada em proteger os mais fracos e impedir que o mal se espalhe.

Mas, o que acontece quando o mal parte de dentro da própria Confraria?

Sobre o autor

Oghan é escritor de afrofuturismo e primeiro autor de steapunk do Brasil com seu romance O Baronato de Shoah, foi vencedor do Wattys 2018, e é autor de Os Oradores dos Sonhos, além de publicado na Revista Nigeriana Omenana Magazine e na MV Media nos Estados Unidos; também tem seu nome gravado no legado de Arton através de um conto em Crônicas de Tormenta volume 2 e seu sonho é escrever o primeiro romance focado na Grande Savana.


O Presente das Fadas Parte 01

Quase todos os reinos de Arton possuem uma floresta com o mesmo nome, Caed Dhu, Floresta Negra. Uma recorrência folclórica necessária para que os mortais tivessem um lugar onde situar suas histórias e qualquer bardo conhecia para situar suas histórias, apesar de nenhum deles poder afirmar sua localização.

A fauna e a flora da Floresta Negra eram únicas: bruxas más, fadas boas, crianças perdidas, lenhadores solitários, caçadores amargurados, animais falantes e tudo o mais que sobrevivesse à magia, como árvores vivas, salamandras, cavalos sem cabeça, sereias, ninfas, insetos apaixonados por sapateado e árvores sábias. A floresta era o arquétipo do conto de fadas repetido à exaustão, mas nunca cansativo. Era bem comum que certos papéis se invertessem, como o caçador sorridente e as crianças más que empurravam bruxas boas para os fornos, mas isto só acontecia pelas mãos dos artistas mais brilhantes, o que era raro em Arton, uma vez que a grande maioria deles estava mais preocupada em contar as lendas de heróis galantes e da Tormenta.

Ou garantir o jantar na corte, que sempre fora conservadora com suas histórias locais.

As árvores eram sempre frondosas e cobriam o sol, deixando nesgas de luz passarem aqui e ali. Regatos aliviavam a jornada das donzelas e dos caçadores quando a situação pedia; uma cachoeira cristalina sempre escondia uma caverna mágica; a cabana da bruxa ficava embaixo de árvores mortas e na única região pantanosa, mesmo que o terreno ao redor fosse uma tundra ou deserto.

Uma das Caed Dhu, no entanto, era a verdadeira. Localizada na Pondsmânia (ou era em Petrynia?), o reino das fadas (ou o reino das histórias fantásticas?), possuía formato triangular e era cercada por três rios: Kinzig, Neckar e Murg.

— Já ouvi um bardo dizer que roedores letrados tentam há anos erguer sua própria academia arcana por estas bandas — Lylia, a moça de cabelos verdes e pele escura cruzava a floresta com um embrulho nos braços. — Que absurdo! Estes roedores deveriam ir aprender magia em escolas que já existem, ao invés de ficar aqui arranjando briga com aquele tal gato, Maurício!

Lylia conhecia cada história de Caed Dhu por que fazia parte delas. A dríade, nascida ali, crescera próxima a árvore onde sua alma residia, apesar do corpo que perambulava com a aparência de uma elfa. Na infância Lylia passava os dias vagando pela floresta e a protegendo, mas ao se tornar uma adulta passou a sentir atração por viajantes e ajuda-los em suas jornadas, para que ela mesma se tornasse imortal em suas lendas.

— Você sabia que se eu quisesse, piscaria os olhos e apareceria no meio de Caed Dhu, pediria os presentes para minhas irmãs e viveria em paz pelo resto da minha vida? — Lylia acariciava o rosto do filho — Mas uma dríade, de vez em quando, tem que viver grandes aventuras, que tragam mais histórias para sua floresta, não é mesmo?

O bebê fez um barulho engraçado e sorriu. Lylia deu um beijo estalado em sua testa e prosseguiu a jornada apreciando a pele dele, um preto vistoso e brilhante que lembrava as escamas de um dragão.

— Você ainda vai conhecer a Grande Savana onde seu pai nasceu — Lylia duminuiu o passo ao chegar ao cento da floresta, onde havia um círculo de pedras maiores do que casas humanas. — Deixa eu te contar uma coisa, fedido — Lylia cutucou a barriga do bebê com a ponta do dedo — Este círculo só existe na floresta original, ele é um presente de Allihanna, a deusa da natureza, para a mamãe e as titias.

— Aposto que você vai receber os melhores presentes do mundo todo, tem como não gostar de uma porcariazinha como você? — ela esfregou o nariz no do bebê, uma faísca de energia mágica correu entre os dois e tremulou como a chama de uma vela — Espero que alguém te dê uma história só sua! Imagina? O meu bebê defendendo o reino de dragões e trolls?

Sem prestar muita atenção às reações da criança, Lylia continuou o falatório.

— Suas lendas viriam para Caed Dhu e se espalhariam pelo mundo. Seria você o filho do Paladino de Arton? O herdeiro de Lisandra, a druida? Ou o exterminador da Tormenta? — lendas incontáveis povoavam o mundo, Arton era uma terra de heróis e cada um deles parecia atrair uma galeria de vilões impossível de derrotar. As forças do bem e do mal eram claras, palpáveis e perceptíveis no dia-a-dia. — De repente você é a lenda da Dríade e do Cavaleiro, ou da Donzela e do Peregrino? Uma que ainda não contaram é a história do Viajante e da Feiticeira! Não importa, uma vez que você tenha idade, vai viver grandes aventuras como o herói principal da sua vida!

— Quem sabe você não se torna o novo imperador? — Lylia parou para descansar na frente do regato.
O som de uma flauta substituiu o barulho da floresta. A melodia era doce, rápida e alegre, como se todos os deuses das artes e da natureza se unissem para compor a canção mais doce, rápida e alegre da existência. Em um impulso, Lylia colocou o bebê em cima de um tronco e foi bater palmas.

O sátiro emergiu dos arbustos, primeiro seus chifres curvilíneos, iguais aos de um bode, depois a cabeleira desgrenhada e espessa, suja de terra e folhas. Sua pele era marrom e cheirava a terra molhada na chuva de verão. Da cintura para baixo ele era peludo, também igual a um bode e suas patas fendidas marcavam a grama por onde passava, mas as marcas desapareciam segundos depois, já que o sátiro não gostava de ser perseguido.

— Tyro, que alegria! — Lylia o abraçou e os dois dançaram por um breve instante — Este é meu filho. Quero um presente para ele.

— Você teve um filho tronco? — Tyro estranhou — Deve ter sido uma noitada e tanto! Vamos chama-lo de Toquinho!

— Claro que não! — Lylia olhou para trás, o bebê caíra para trás do tronco e se agitava em uma tentativa desengonçada de se levantar — Meu filho é isso aqui!

— Preferia o tronco… – Tyro analisou o bebê que a irmã erguia pelas roupas, coçou o cavanhaque, segurou o bebê só por um pé, balançou e mediu, como se fosse uma boneca de pano. Teve uma ideia que julgou brilhante.

— Chifres! Todo mundo precisa de chifres!

— Não vou colocar chifres no meu filho! — Lylia bateu o pé no chão com petulância. — Dê um presente bom para o meu filho!

— Ele me parece fracote, tem certeza que vai sobreviver sem chifres? — Tyro, as sobrancelhas erguidas em surpresa, virou a criança do lado certo e acariciou sua barriga. — Patas fendidas?

— Patas o que? Fedidas? — Lylia soltou um gritinho esganiçado. — Não ouse!

— Tá bom, tá bom… deixa eu pensar….uma cauda? — Tyro gostava de caudas, deixavam os seres mais sensuais, qualquer que fosse seu gênero. — Pela sua expressão azeda, também não.

O sátiro respirou fundo, coçou a sobrancelha, pensando na única coisa que poderia dar à criança que mais ninguém daria. O presente deveria embelezar, servir para alguma coisa e marcar o pequenino para que fosse reconhecido por outros seres mágicos.

— Um nome! — Tyro sorriu — Um nome de herói que tenha grande significado e motive as pessoas ao seu redor!

— Certo, um nome seria muito bom! — Lylia bateu palmas — Que nome você dará ao meu filho? Tem que ser um nome único, especial, de herói salvador de Arton! Menos Sandro, que já usaram em alguma lenda por ai, tenho certeza. Também não quero Orion, nem Vallen, ou Cristian, tem que ser um nome totalmente original!
— Um nome muito original, devo dizer — Tyro rodopiou tocando a flauta. — Khanta Wamnyama que significa “A estrela que será lembrada”!

Lylio ficou séria. Ruminou o nome por um longo período, a cada segundo de compreensão o sorriso se iluminando e crescendo como a lua.

— Perfeito! Khanta Wamnyama é um nome super fácil de dizer, até o humano mais Katabrok da cabeça vai decorar! — ela beijou o rosto do sátiro e saiu pela floresta, cantarolando o nome do filho.

— Você esqueceu isso aqui — Tyro pigarreou erguendo o bebê que ainda estava em suas mãos.

Lyla voltou, arrancou-o dos braços do sátiro, revirou os olhos e seguiu viagem.

O Presente das Fadas Parte 01

Autor: Oghan N’Thanda.
Revisor: Isabel Comarella.
Adaptação do Post: Douglas Quadros.
Ilustrador da Capa: Theo S. Martins.

 

Sair da versão mobile